Fluxos e seus sentidos

Reza a lenda que durante as reformas na Avenida Central no Rio de Janeiro (atual Rio Branco), foi feita uma tentativa de ordenar o fluxo de pedestres. De um lado deveriam caminhar todos em direção a praça Mauá, do outro o rumo deveria ser a Cinelândia. Uma rápida visita ao centro do Rio hoje irá deixar claro que felizmente a idéia não vingou.

Ordenar o fluxo pertence a lógica da circulação de veículos motorizados. Na falta de trilhos, o ideal é mantê-los sempre no mesmo sentido para evitar colisões e maximizar a segurança e fluidez. Em outras palavras, mão e contra-mão é um conceito que se aplica aos deslocamentos de máquinas, não de pessoas.

O mesmo Código de Trânsito Brasileiro (CTB) que trata a bicicleta com veículo garante que uma via pode ser sinalizada para que a bicicleta vá no contrafluxo do trânsito motorizado.

Artigo 58:

Parágrafo único. A autoridade de trânsito com circunscrição sobre a via poderá autorizar a circulação de bicicletas no sentido contrário ao fluxo dos veículos automotores, desde que dotado o trecho com ciclofaixa

Afinal, quem se move pela própria energia insere-se em uma lógica de deslocamento distinta das máquinas. Exatamente por conta dessa constatação, ao redor do mundo políticas de promoção aos deslocamentos em bicicleta tem garantido aos ciclistas maneiras seguras de seguir livremente. Como no vídeo abaixo:

Buscar reprimir os ciclistas “fora da lei” que pedalam na contramão é de certa forma o que buscou-se fazer na Rio Branco no começo do século XX. Ao facilitar os deslocamentos humanos (a pé ou de bicicleta), o planejamento urbano garante que a cidade seja das pessoas e que as máquinas sigam apenas sendo os facilitadores de deslocamentos, coadjuvantes da vida urbana.

O exemplo aplicado nas ruas da Europa mostra que o caminho natural para vias dentro dos bairros é o que já está previsto no CTB. Permitir o fluxo livre para as bicicletas e uma única mão de direção para os motorizados. Como o em Munique.
Bicicleta contramão Alemanha

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20 thoughts on “Fluxos e seus sentidos

  1. Acho esse artigo enganoso. Em nenhum lugar da Europa em que presenciei, recentemente, grande uso de bicicletas (inclusive Munique e Amsterdam) o fluxo é “livre”. As mãos são muito bem definidas (embora não necessariamente coincidam com as dos carros), e os outros ciclistas ficam irritados (com razão) se você não as segue. Em Amsterdam, pelo menos, você pode inclusive ser parado e multado pela polícia.

    Não tem nada a ver com “deslocamento humano” (que, aliás, é um termo ridiculamente preconceituoso). É um problema de fluxo e velocidade. Coloque veículos (que, sim, bicicletas são) andando sem qualquer regulamentação, em quantidade o bastante, e você automaticamente gera um inferno. Essa idéia de que todo ciclista é respeitoso, correto e simpático é completamente sem sentido.

    Também sou ciclista urbano, e tenho cada vez mais desgosto do movimento cicloativista de São Paulo. Esse endeusamento do ciclista (e conseqüente demonização do motorista) só atrapalha a sua causa.

  2. Há um argumento que eu ouvi por acaso esses dias atrás,
    que derruba qualquer incentivo a andar de bicicleta, pelo menos
    no locais quentes, o suor. Ninguém quer ir de bike para o trabalho/faculdade e chegar lá fedendo sela de cavalo…

    Obs: A unica exceção à regra, são locais que possuem banheiros(limpos) com ducha.

  3. Só pra fazer um contraponto ao meu comentário negativo acima: Alcain, eu costumo trazer uma toalha de rosto e uma troca de camiseta (e, às vezes, baby wipes), e funciona direitinho, depois de pedalar. Alguns dias são piores que os outros, claro, e obviamente piora se venho pedalando rápido (pra fazer exercício mesmo), mas quando venho de carro também chego suado…

  4. Tudo bem que homens não são máquinas ! Mas muitas vezes andar sempre pelo lado direito ajuda muito…
    Por outro lado eu particularmente gosto de andar de bike na Contra-Mão ! Acho que desta maneira vejo e sou visto de melhor forma pelos motoristas! Mas em minha cidade isso é um verdadeiro crime !
    O importante mesmo é que eu vá e volte de onde e prá onde quiser com Segurança !
    Valeu pelo post ! Abraçssssssssssssssssssss !!!!!

  5. Acho incrível essa racionalidade de querer adaptar as pessoas às coisas. Não deveria ser o contrário?

  6. aqui no rio o inferno causado por uma gde quantidade de bicicletas já começou.
    os ciclistas não se conformam que não devem andar na calçada. entendo que haja pouco espaço em muitos trechos p seguir com a bicicleta… pontos de ônibus por exemplo. nesses casos o ciclista vem pedalando sem reservas entre a multidão que espera o coletivo e ameaça a integridade fisica de quem deveria estar seguro e livre de veiculos circulando nas calçada.
    mesmo nas ciclovias (eu ando de patins com frequencia nessas vias) a ultrapassagem temerária q sempre foi condenada entre os motorizados é reproduzida fielmente no âmbito dos ‘camelos’ – como gostam de chamar as bikes aqui.
    o sentido das bicicletas tem fundamento pois, quando se anda contra os carros os acidentes são beeem mais graves e o risco de que eles aconteçam tb aumenta. além de criar conflito entre ciclistas em direções opostas em um espaço cada vez mais disputado e, infelizmente, desordenado.

  7. aqui no rio o inferno causado por uma gde quantidade de bicicletas já começou.
    os ciclistas não se conformam que não devem andar na calçada. entendo que haja pouco espaço em muitos trechos p seguir com a bicicleta… pontos de ônibus por exemplo. nesses casos o ciclista vem pedalando sem reservas entre a multidão que espera o coletivo e ameaça a integridade fisica de quem deveria estar seguro e livre de veiculos circulando nas calçada.
    mesmo nas ciclovias (eu ando de patins com frequencia nessas vias) a ultrapassagem temerária q sempre foi condenada entre os motorizados é reproduzida fielmente no âmbito dos ‘camelos’ – como gostam de chamar as bikes aqui.
    o sentido das bicicletas tem fundamento pois, quando se anda contra os carros os acidentes são beeem mais graves e o risco de que eles aconteçam tb aumenta. além de criar conflito entre ciclistas em direções opostas em um espaço cada vez mais disputado e, infelizmente, desordenado.

  8. Eu dou o maior apoio para o movimento, mas lembrem-se que os pedestres também precisam ser respeitados. Eu sou uma pedestre assumida, não uso carro nem bicicleta e, às vezes, sinto-me excluída no planejamento urbano. As calçadas estão cada dia mais estreitas, há poucas faixas para pedestres e as vias sem semáforo para a travessia nos obrigam a ficar bons minutos aguardando uma oportunidade para seguir o trajeto. O pedestre orienta-se pela “mão” dos carros e o ciclista precisa ficar de olho nisso. Palavra de quem já foi atropelada por um ciclista. Minha amiga de baia também já passou pela mesma experiência.
    Acredito que com respeito e gentileza, tudo pode funcionar 😉

  9. Observo o uso da contramão há um bom tempo e constatei que há pessoas que pedalam na contramão porque acham mais seguro, mas quem conhece a dinâmica das ruas vai constatar que é bem mais comum os que usam a contramão pra cortar caminho.

    Nas ruas de baixo movimento de carros e pedestres sou a favor, mas nas avenidas de grande movimento acho temerário. Numa delas, ia a pé e fui atingido por um ciclista na contramão que me machucou e ainda reclamou como se a culpa fosse minha!
    Acho que vale o bom senso. Não vejo segurança em driblar carros e caminhões que passam a 60 km/h, colados em calçadas estreitas lotadas de pedestres que atravessam em qualquer brecha. Mas é perfeitamente possível usar ruas mais calmas em mão dupla de bicicletas com total segurança para motoristas e pedestres também, e praticidade para os ciclistas.

  10. RBP, me desculpe mas enganosa ou desatenta é a sua percepção e seu comentário, em munique 50% das ruas de mão única hoje são de mão dupla para as bicicletas, temos muitas fotos e folders pra te mostrar se quiser.

    É tudo feito com muito bom senso, nada de contra fluxo em vias de alta velocidade vejam o diagrama:
    http://blog.ta.org.br/2009/12/11/fatores-objetivos-construcao-ciclovias/

    Hoje Londres esta preparando suas ruas residenciais para tal ( http://emag.mobilitymagazine.co.za/index.aspx?issue=issue02&page=09 ) e Paris também, Bruxelas já tem 70% de suas ruas residenciais assim.

    Algumas fotos de Munique:
    http://www.fotolog.com.br/zelobo/9766604 (presente neste post)
    http://www.fotolog.com.br/zelobo/9761743
    Bruxelas:
    http://www.fotolog.com.br/zelobo/9761743
    Um video sobre as faixas no contrafluxo em Washington:
    http://www.streetfilms.org/the-capitols-colossal-contraflow-cycle-track/

    Agora o mais interessante é ver ciclistas se sujeitando e achando correto seguir medidas tomadas exclusivamente para automotores.

  11. Complementando, não se trata de andar na contra mão, infringindo as regras do CTB, mas de andar “no sentido contrário ao fluxo dos veículos automotores”, como sabiamente es’ta explícito no paragrafo único do artigo 58 do CTB. Nestas situações, as vias são sempre bem sinalizadas e de velocidade reduzida, no caso braisleiro devem ainda ter o “trecho dotado de ciclofaixa”, o que torna a situação previsível e mais segura.
    E se autorizado pela autoridade com jurisdição sobre a via, não existe infração 😉

  12. RBP pode ter errado em uma informação, mas a crítica ao umbiguismo de muitos cicloativistas procede. A mania de acharem que são os únicos que enxergaram a verdade sobre a vida e que estão moralmente franqueados a ditar regras já afastou a simpatia de muita gente. O tal movimento tende a virar um clube, em vez de impregnar a população.
    Um cara que morou em Copenhagen disse: “aqui não tem cultura ciclista, porque toda a população pedala. Não há distinção social nenhuma baseada em usar ou não bicicleta.” Essa deve ser a meta verdadeira dos cicloativistas, em vez da autoafirmação política, que tem desviado demais o foco de alguns.
    Quanto a pedalar propositalmente no contrafluxo em vias movimentadas, sempre achei uma bobagem, até que uma amiga me explicou: “Se eu não fizer isso, os caras que passam de carro ficam gritando grosserias e até tentando passar a mão na bunda. Simplesmente não dá.” E não tive resposta contra esse argumento.
    Filosoficamente, a ideia de as bicicletas não levarem em conta a mão dos veículos a motor por “não serem máquinas como eles” é bonita, poética, simpática, grandiloquente, romântica. Na prática, é pedir para ter problemas de ordem bem física e concreta. No mínimo, porque os motorizados simplesmente não podem negociar espaço com bicicletas no contrafluxo, especialmente em lugares de visibilidade complicada, como qualquer cruzamento de ruas. A minha amiga está renunciando à sua segurança física, questão básica de sobrevivência, em troca de ter menos idiotas assediando-a sexualmente, que é um problema de ordem cultural.
    Como está implícito nos exemplos, as ruas europeias de mão única para carros e livres para bikes são ruas locais de pouco tráfego, não avenidas de grande movimento. Para implantar isso aqui, com o baixo nível atual da cultura de uso do espaço público, precisaria valer uma regra única e geral. As regras só existem, para começar, porque não dá para confiar irrestritamente no bom senso das pessoas. Especialmente num ambiente social onde quase todo mundo vive empenhado em tirar vantagem indevida do próximo.
    Também quero harmonia, paz e civilidade, mas esses valores não são os que pautaram a nossa estrutura urbana. Para os que construíram o que está aí, a lógica é a seguinte: “Gentileza gera gente lesa”.
    Discorda? Aja diretamente. Pregação mútua entre os que concordam entre si não basta.

  13. Mario, não sei onde você mora, mas felizmente no Rio há muito mais ciclistas que usam a bike porque é melhor do que por causa de uma ‘cultura ciclista’ feita por ativistas (ciclo ou não).

    Vejo essa informação nas contagens fotográficas: http://blog.ta.org.br/index.php?s=contagem

    Assim basicamente você tem aqui o que ocorre na tão elogiada Copenhagen. A verdade é construída com fatos e informações não com elocubrações em torno do que vem de nossas férteis mentes.
    Enquanto discutimos, na rua do lado do meu trabalho passam 50 ciclistas por hora que nem sabem que existe essa ONG ou aquele grupo querendo melhorar o uso da magrela.
    Seu texto poderia ser mais curto, afinal eles são os verdadeiros agentes da paz, harmonia e civilidade. Todos os que usam a bicicleta estão agindo em prol do tal mundo melhor, mesmo que não saibam disso. 🙂

  14. Mario, em nenhum momento se falou em contra fluxo em vias de grande movimento, veja o grafico citado: http://blog.ta.org.br/2009/12/11/fatores-objetivos-construcao-ciclovias/
    São em ruas preparadas para isso com situação segura, como mostra o grafico, que o contrafluxo é valido e seguro. As cidades que estão, cada vez mais, implantando este tipo de solução não o fariam se o resultado não fosse positivo. E em nenhum momento se falou que o ciclista é onipresente e todo poderoso, pelo contrário, busca-se maior harmonia entre os atores do tráfego. Mas a resistência ainda é grande.

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