Cicloviagem Rio-Petrópolis

Um relato longo e um tanto pessoal sobre a primeira experiência de usar a bicicleta como meio de transporte fora da cidade, para ser mais preciso, entre cidades. Confira o roteiro aproximado.

rio petropolis

Um churrasco em Petrópolis foi a desculpa para a primeira cicloviagem. Foi também um grande esforço. O plano inicial era pedalar até a rodoviária, subir com a bicicleta no bagageiro e descer pedalando no dia seguinte. Na noite anterior, os planos mudaram. Estava decidido a ir pedalando. Só consegui dormir às 2 horas da manhã, um misto de ansiedade e preparativos finais. Acordei às 7 horas, às 8 horas estava de pé, às 8:47 cruzei pelo primeiro relógio de rua.

Os primeiros quilômetros são estranhos. Conhecia todo o trajeto, fui pelas ruas até o Campo de Santana e de lá, tomei um rumo que era novo pra mim. Passei pela rodoviária, depois segui pela Avenida Brasil. O asfalto até que não estava ruim. A negociação com os ônibus e vans não foi das piores.

Estava um tempo estranho e via a serra à frente com nuvens negras por cima. Tinha trocado 500g de amendoim pela minha capa de chuva para manter o peso. Segui por toda a Brasil, até a BR-040, as conexões entre as vias e a estrada são sempre a pior parte. Veículos em alta velocidade. As regras na estrada são bem diferentes e tomei as devidas precauções em relação a minha segurança viária nesses trechos. Só conhecia o caminho de carro e através do bikely.com. Sabia que nas interseções principais não tinha como errar. Assim foi.

Na entrada para a rodovia Rio-Teresópolis foi engraçado reparar como pedalar na estrada é estar no lugar “errado”. A placa apontava a pista central como o destino a seguir. Quase fiz a burrada, mas depois pensei, que nada, estou de bicicleta, vou aqui pela pista lateral mesmo. Sábia decisão da minha parte.

Segui tranqüilo e depois de alguns quilômetros fiquei um pouco ansioso por não ter certeza se já tinha perdido a entrada para Magé, onde me aguardava A “Estrada Real” e seus 17 quilômetros de subida. Parei num posto de gasolina na beira da estrada. A segunda vez que encostei os pés no chão desde o Rio.

Fiquei surpreso com a indicação, era para entrar à direita e seguir reto até Parada Angélica, ou algum outro bairro de Magé que conhecia de nome por já ter feito a mesma viagem de trem metropolitano. Não teve erro, virei a direita e depois de 2 quarteirões vi a linha férrea. Não tinha certeza que estava na direção certa, mas supus que sim e depois que passei por baixo da estrada vi que estava no rumo. Bastava manter os trilhos à vista. Nessa brincadeira me perdi uma vez, mas logo me achei, pedi mais algumas orientações e segui. Achei a linha do trem e numa bifurcação pedi novas orientações.

Naturalmente saber para onde você está indo ajuda e principalmente como o pessoal da terra chama o lugar para onde você está indo. No posto de gasolina tinha perguntado pela RJ-107 e o atendente não fazia idéia de onde era, mas quando disse que meu rumo era “Raiz da Serra” ele entendeu e deu a orientação que eu precisava.

Um grande parênteses em relação a viagem, foi a certeza de ter acertado em não ir pela BR-040. Chegar em Imbariê (o primeiro bairro de Magé que eu tinha de cruzar) e ver aquela vida bucólica da região metropolitana, várias bicicleta na rua, um trânsito tranqüilo em um sábado de manhã. Estacionamentos espontâneos de bicicleta em frente a estações de trem e um monte de magrelas onde quer que houvesse fluxo de pessoas.

Segui sem parar (com exceção das informações) até a base da serra. Ali começaria efetivamente o desafio. Tinha saído de casa às 8:45 e eram quase meio dia. Reabasteci a mochila de hidratação com duas garrafas de meio litro d´água e tomei um guaraná natural. As comidas que tinha trazido junto comigo no corpo já haviam acabado. Tirei mais do alforje e parti.

O bar em que parei (e já conhecia da vez que tinha feito a viagem de trem) é onde fica o pessoal que opera as kombis na região. Assim que encostei a bici e entrei um deles se aproximou e ficou observando o veículo. Vi que era numa boa, mas naturalmente fiquei um pouco preocupado.

Iria passar algumas boas horas vulnerável subindo a serra. Na saída dois deles vieram falar comigo, numa boa. Naturalmente a primeira coisa foi o comentário de um com o outro sobre os freios à disco, com pastilhas e tudo. Ele ainda brincou com o amigo que a minha bicicleta valia mais que o carro dele. Desconversei, dei atenção aos caras por mais pouco tempo, me despedi e segui meu rumo.

Ao meio dia começou a aventura de verdade. Uma estrada de paralelepípedo, mão dupla e em subida, só subida. A inclinação não era forte por ser um traçado desenhado para trens, ainda assim foi complicado. Quase duas horas para subir. Parei uma vez no começo para tirar água do joelho e uma outra sem nem saltar da bicicleta. Doíam-me os glúteos, o joelho e a planta do meu pé esquerdo. Levantar 1 centímetro o selim ajudou a dor no joelho. Resolvi não ficar muito tempo parado, minhas pernas latejavam. Pensei em empurrar um pouco para variar o movimento da musculatura, mas acabei desistindo da idéia.

A estrada tinha numeração ao contrário. Vi duas vezes o número, na altura do 4000 e depois no 3000. Sabia que o fim estava próximo, não o meu, mas o da subida. O próximo conjunto de casas certamente seria o último da serra. Não deu outra. Vi logo numa delas a numeração, 650. Comemorei, fiquei em êxtase. Faltava muito pouco. Cheguei em Petrópolis. Ainda tinha de cruzar a cidade e chegar ao Bingen. A orientação que recebi na rua era fazer o caminho pela BR ao invés de cruzar por dentro. Assim fiz. Mal sabia o quão longe estava da estrada. Várias subidas e descidas, ainda nos malditos paralelepípedo. Finalmente cheguei na estrada, asfalto, grande alegria.

Alegria que nada, mais subida pela frente. É a famosa regra de, em bicicleta, preferir os caminhos que se fazia de trem. Estradas para carros tem sempre subidas e descidas demais. Assim foi. Penei na subida, com a água acabando, a comida também, mas sabia que faltava pouco e uma longa descida me aguardava.

Cheguei num posto da policia rodoviária, cruzei o túnel e desci feliz, até começar uma outra subida chata. Ao menos sabia que faltava muito pouco. Na descida seguinte, estava o retorno que deveria pegar. Felicidade pura, não deu pra ir muito rápido e ainda tinha mais uma subidinha até voltar para dentro da cidade.

A glória se aproximava. Cheguei na casa do churrasco e, recebido por aplausos, fiquei bem contente. Suado, com uma leve dor nas costas, mas sem estar cansado, ter vencido a subida a já algum tempo ajudou. Devia ter levado a cópia com os movimentos para alongamentos, mas que esqueci em casa.

Olhei para o relógio enquanto comprimentava a todos. O relógio marcava 14h47min. Exatas seis horas.

Tomei um belíssimo banho e estava “semi-novo”. Depois de duas horas subindo a base da minha coluna reclamou. Pior saber que uma reclinada não teria serventia alguma nesse caso, já que penaria ainda mais pra subir.

No dia seguinte acordei numa boa, ansioso pela descida. Saí pouco depois das 10 horas. Bem tarde, o sol castigou, mas descer a serra foi um enorme prazer. Pena que durou pouco. Não usei os freios, ultrapassei dois caminhões, tudo na maior tranqüilidade, sem arriscar e sem qualquer imprevisto. Pedalando sempre. Só deu pra chorar (lacrimejar com o vento na verdade) uma vez. Ri bastante quando percebi e segui pedalando.

Assim que terminou a serra, a dura realidade. Sabia que estava a muitas horas de casa. Os carros zuniam, mas no acostamento tudo numa boa. As bifurcações continuaram sendo um problema, nada que a paciência não resolvesse. A bicicleta sendo usada como meio de transporte pelo pessoal da região foi um estímulo. Já em Duque de Caxias meus amigos passaram de carro. Um contato efêmero. Antes um carro também tinha saudado, mas não conhecia. Segui até uma lanchonete conhecida onde comi um pão com lingüiça, tomei um suco de laranja e comprei meio litro d´água.

Nessa altura o sol já ardia, parei um pouco depois em um posto para passar o protetor solar. Deveria ter feito isso ao sair. Segui direto até a Avenida Brasil, sempre atento às entradas da estrada. O asfalto me pareceu um pouco pior desse lado da pista. Mas foi inesquecível. Superei o temor de enfrentar a Brasil e agora sei que é possível viajar de bicicleta e nem é coisa tão de maluco assim.

Cheguei no cruzamento da Rio Branco com Presidente Vargas antes das 13 horas. Estava bem no centro do Rio, sabia que faltava quase nada. Vim pelo Aterro do Flamengo. Sem saltar da bicicleta
tirei a mochila de hidratação, a camisa e o capacete e pedalei com três pistas da via expressa fechadas. Poucos ciclistas e pedestres aproveitavam aquele espaço. Um imenso prazer. Ainda parei para uma água de coco pertinho de casa.

Cheguei às 14 horas e pouco. Aproveitei e fiz os alongamentos todos. Felizmente não tive qualquer problema. Mas acho que ainda falta trabalhar mais as costas e com companhia teria feito algumas paradas. Mas foi um grande prazer seguir sempre. Mesmo sem ter pedalado forte (principalmente na subida). Senti falta de um pedal de encaixe e como uma mochila de hidratação é realmente uma boa coisa.

Assim foi, a minha primeira cicloviagem. Sem qualquer problema e de grandes conquistas.

7 thoughts on “Cicloviagem Rio-Petrópolis

  1. João,muito bom o teu relato!Só me espantei que essa seja a tua primeira viagem na estrada.
    Te convido para passar uns dias aqui no Rio Grande do Sul…Já que fazemos isso TODOS os finais de semana.Sempre em 15,20 ciclistas…Pedalar na estrada é muito bom…Escolhemos sempre um trajeto com uma média de 150/200 km.E passamos o dia na estrada.
    Arranje um tempinho e venha passar uns dias por aqui…prometo muita diversão nas estradas gaúchas.

    bj,ninki

  2. Quem diria que quem ia e voltava da faculdade de bicicleta, estaria indo e voltando de Petropolis!
    Parabéns pela sua conquista e que caminhos maiores sejam conquistados!
    beiijos e Feliz Ano Novo

  3. João!

    Não posso negar que senti orgulho ao participar, junto com os outros, da sua salva de palmas logo na chegada ao churrasco!

    Adorei o relato!

    Abraço,
    JP

  4. Pronto, mais um foi infectado com o vírus da estrada. Bem vindo ao grupo dos LPE + (loucos por estrada).
    Parabéns pelo relato e por vencer o receio e o desafio. Fico feliz de ter participado da pré-viagem contigo!
    Abração

  5. Parabéns pela conquista! Suas palavras servem como um grande incentivo para aqueles que ainda não tiveram o privilégio de realizar uma cicloviagem. Programando uma próxima, avise!
    Grande abraço,
    Feliz 2007

  6. Cara,

    Parabéns pela subida! Confesso que tenho um pouco de medo de pegar a estrada aqui no Rio, mas acho que o faria com companhia. Avise se interessar companhia na próxima!

    Grande [],
    Leonardo.

  7. muito corajoso ,fico pensando será que eu tambem faria isso ? amo muito ciclismo parabens Joao !

Leave a Reply to JP Cancel reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *