Ciclistas em geral desenvolvem uma certa admiração pelo horizonte, especialmente no verão. É com a visão longe que se pode admirar as nuvens carregadas que antecipam no ciclista o aguaceiro que há de vir. Antecipam o banho de chuva que está por vir.
Existem soluções possíveis para chuvas iminentes, a fuga sendo claro a menos interessante. Existe a proteção, feita através de capas e roupas impermeáveis. No entanto a melhor dela é se lançar nas ruas equipado apenas com um paralamas (para resguardar a retaguarda), ou nem ao menos isso.
A opção pelo risco é a dos maiores sabores. O primeiro deles é o do cheiro da chuva. Aquela que acabou de passar ou chega primeiro através do perfume da água que começou ao longe a molhar tudo, sem ainda encharcar.
Depois do cheiro vem os pingos. E cada chuva tem sua identidade moldada pelo intervalo, distância e peso das gotas. Existem as que quase se desmancham no ar enquanto refrescam o caminho. Incapazes de aderir ao algodão das roupas, resumem-se a grudar na pele onde misturam-se com o suor do ciclista que acelera a pedalada em busca do seu refúgio seco.
Tem também a chuva dos pingos fortes e densos entre si. Formam uma parede um pouco desconfortável de atravessar, mas que em pouco tempo, com o corpo molhado, transforma-se em ducha que expurga todas as dores e ansiedades. Perfeita para ser percorrida com total devoção as forças naturais. Afinal primeiro é preciso debater-se contra a natureza, até o ponto de aceitar o inevitável e tornar-se parte indivisível do ambiente ao redor, completamente encharcado.
Por fim, existe aquela outra chuva que ameaça com força o horizonte. Repleta de densas nuvens cinzentas, raios e trovões, chega a assustar. Mas que nas ruas, levada por ventos estratosféricos, encontra o ciclista apenas pela janela de casa, refúgio seco de onde se admira, mas não se é capaz de aproveitar a chuva.