Caminhos da Massa Crítica

Foto Gustavo Henrique

A Massa Crítica Paulistana ganhou vulto. É hoje um momento único de encontro de ciclistas. Sempre as centenas, saem pelas ruas e transformam por algumas horas o trânsito de São Paulo. Pedalam em silêncio ou clamam em uníssono por menos carros e mais bicicletas. Sem líderes comportam a diversidade e acima de tudo a anarquia. E na definição de anarquia mora a controvérsia.

Inegavelmente trata-se de um movimento que luta por mudanças e é contra o status quo. A ausência de uma liderança central é ao mesmo tempo o maior trunfo e um problema. Afinal manter a ordem na anarquia implica responsabilidades individuais para não descambar para a total desordem sem lei. A permissividade implica na maioria das vezes em contestação pela alegria, mas pode gerar confusões.

Cada participante tem objetivos diversos, mas ao mesmo tempo todos juntos formam uma utopia. Um momento em movimento em que as pessoas fluem pelas amplas avenidas, em forma de nuvem o grupo fica denso e depois se espalha para mais a frente adensar-se novamente. O desafio da Bicicletada agora é um pouco o desafio de todos os milhares de ciclistas da cidade. Ser respeitado como mais um componente do trânsito na metrópole. Respeito que não será feito pela afronta violenta, mas pela colaboração.

A massa crítica é o momento em que cada ciclista presente inverte a ordem que enfrenta diariamente nas ruas. A bicicletas em grande número passam a ser o elemento mais forte nas ruas. Mas a realidade no dia a dia não é essa e impedir que aflorem “delírios de poder” nos participantes é a única maneira de não matar o movimento.

A Bicicletada precisa ser vista pelo que é. Uma contestação em relação as dificuldades de transitar em São Paulo, seja qual for o meio de transporte escolhido. E essa contestação é boa para todos, é boa para a cidade. O desafio está em mostrar nas ruas, de maneira anárquica que cada ciclista em grupo ou individualmente é um aliado no trânsito da cidade e na construção de uma cidade mais humana.

Um Caminho Verde para São Paulo

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São Paulo tem cada dia mais aberto caminho para a circulação por bicicletas. Mas não se trata apenas de uma política de construção de pistas segregadas em prol da segurança, é também um trabalho que envolve a promoção de uma nova cultura de mobilidade.

Um número expressivo de paulistanos utiliza a magrela como seu meio de transporte principal, todos os dias. Já estão nas ruas, ainda que em condições passíveis de serem melhoradas. Qualquer medida de incentivo ao aumento do deslocamentos em bicicleta irá ser em função do aumento do número de viagens em bicicleta e não da “mágica da fabricação de ciclistas”.

Ainda que inconclusa, a ciclovia do Caminho Verde na Radial Leste já é um símbolo concreto da inserção do planejamento cicloviário na lógica dos transportes em São Paulo. Um novo elemento já faz parte do sistema viário da cidade, ele não pode e não irá permancer isolado.

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Uma faixa compartilhada entre ciclistas e pedestres como o Caminho Verde na Radial Leste é também a requalificação de um espaço antes abandonado. A paisagem que antes tinha apenas um muro e muito concreto agora já tem flores, árvores recém-plantadas e um piso vermelho que parece brilhar com a água da chuva.

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O Centauro Moderno

Texto do Secretário do Verde e do Meio Ambiente do Município de São Paulo – Eduardo Jorge

Um cidadão reclama em artigo do JT do entusiasmo da SVMA com a causa da bicicleta em São Paulo.

É verdade, desde 2005 a SVMA tem se dedicado a mudar a relação da cidade com os ciclistas.

De parte do poder público, das empresas aqui sediadas e dos próprios motoristas de veículos motorizados em 2005 estávamos partindo praticamente do zero. Porém o que se ignorava e o que nós descobrimos é que 300.000 pessoas já usam mesmo assim a bicicleta como meio de transporte principal em São Paulo e vizinhanças. São na maioria trabalhadores e estudantes moradores de áreas periféricas e em menor número ciclista por opção de consciência que sabem que estão ajudando a cidade. Ajudando a diminuir a poluição, o aquecimento global, beneficiando a saúde pública e o trânsito da capital paulista.

O que já fizemos de 2005 para cá? O Prefeito criou um grupo executivo intersecretarial – Pró Ciclista – que está estudando todos os possíveis locais de apóio com infra-estrutura pública ou em parceria.

Como resultado a SVMA já licitou via Metro uma ciclovia de 12 km ao longo da Radial Leste que já foi inaugurada parcialmente e deve ser concluída este ano. Também em outros locais na Zona Norte e Zona Sul a SVMA vem implantando ciclovias em conjunto com Subprefeituras. Outros 100 km estão em diferentes estágios de concretização (projeto, licitação, etc).

Já instalamos quase 2.000 paraciclos na cidade e estamos apoiando o Governo Estadual, via Metro e CPTM, na implantação de bicicletários e aluguel de bicicletas (o primeiro deste tipo na América do Sul).

A Secretaria de Esportes criou a escola de ciclismo para criança da rede pública de ensino.

Com a Secretaria de Transporte estamos iniciando um esforço de educação para cultura de paz no trânsito primeiro com os motoristas de ônibus e depois para o conjunto dos motoristas.

Este é o investimento mais importante. Mudar a cultura imperante de que os veículos motorizados são donos da cidade. Aliás, as maiores vítimas não são os ciclistas. São os pedestres, principalmente idosos e crianças. É só estudar as estatísticas de São Paulo e de todo Brasil.

Mesmo em cidades com boa estrutura de ciclovias e ciclofaixas elas cobrem uma parcela relativamente pequena das vias públicas. Na maior parte destas cidades as vias são compartilhadas por bicicletas e veículos motorizados. Pacífica e educadamente.

Na Grécia mitológica os centauros eram famosos por seu comportamento selvagem e turbulento. No Século XXI temos centauros modernos com cabeça, tronco, braços e quatro rodas. Realmente é um trabalho para Hércules trazer este tipo de ser vivo para uma convivência civilizada com os demais habitantes da cidade.

Passos a Frente para os Pedestres

Pedestres são a parte mais frágil do trânsito e no Brasil são as maiores vítimas. Equacionar o problema das fatalidades em nossas ruas e estradas requer um abordagem múltipla. Não basta investir somente em infraestrutura, ou ter leis que coibam abusos. É preciso cercar todas as “frentes”. Educar pedestres e condutores, punir os infratores e investir em melhorias que garantam a circulação em segurança para os pedestres.

“Vamos trabalhar pela afirmação (ou reafirmação) da existência do pedestre, a mais antiga qualificação humana do mundo. Da existência e dos direitos que lhe são próprios, tão simples, tão naturais, e que se condensam num só: o direito de andar, de ir e vir, previsto em todas as constituições… o mais humilde e o mais desprezado de todos os direitos do homem. Com licença: queremos passar.”

Carlos Drummond de Andrade

Essa frase está na página de abertura do site da Associação Brasileira de Pedestres (ABRASPE). De lá também vem a versão comentada do “Manual do Pedestre em São Paulo“.

O manual presta um grande serviço ao condensar dúvidas e maneiras de agir. Muito do que lá está escrito pode e deve ser traduzido para qualquer cidade brasileira. Afinal temos um único Código de Trânsito.

A construção de cidades mais democráticas se fará também medindo o tamanho de nossas calçadas, afinal, quando mais largas as calçadas, maior a democracia.

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Doze Horas de Outra Mobilidade

Avenida Paulista, cartão postal paulistano. O trânsito motorizado em janeiro tem um horário de pico claro no começo da noite. O resto do ano não é assim tão fluido para quem depende de motores. Mas as bicicletas tem horários e usos diversos. Para dar visibilidade aos ciclistas, a Transporte Ativo convocou os amigos e suas máquinas fotográficas para uma contagem.

Quem são as pessoas que em uma segunda-feira em janeiro cruzam a Paulista? Trabalhadores, entregadores, esportistas, a maioria homens e pedalando por onde a bicicleta deve circular, na via. Os dados não tem valor estatístico, mas comprovam que em um único ponto da mais famosa avenida paulistana um número expressivo de bicicletas está presente.

Não se trata portanto de promover políticas para a “fabricação de ciclistas” na cidade de São Paulo, mas a região metropolitana precisa conhecer quem já pedala para que mais pessoas se sintam encorajadas a adotar a bicicleta em benefício de todos.

Foram mais de mil fotos, a maioria absoluta de bicicletas. Mas também foram clicados cadeirantes, skatistas, patinadores, carroceiros e até uma deficiente visual.

Em breve um relatório completo nos moldes do que foi feito no Rio de Janeiro na Contagem do Cantagalo. Enquanto isso vale conferir algumas das fotos:

André Pasqualini
Márcio Campos
Mathias
João Lacerda
Polly Rosa