Rio Perde Provisoriamente o seu Rebolado

Semba

O sistema Samba de bicicletas de aluguel no Rio de Janeiro, teve seu primeiro revés desde a sua implementação. Em apenas 72 horas foram furtadas diversas bicicletas e danificadas estações. Por conta disso o sistema foi totalmente suspenso, para que seja feita uma restruturação que garanta a integridade das estações e bicicletas.

Em nota oficial, a empresa responsável deixou claro que o tempo fora do ar será acrescido aos planos em vigor, para que os usuários não sejam prejudicados.

Como tecnologia social, bicicletas de aluguel requerem a rápida interação entre o poder público, a iniciativa privada e a população. As estações estão lá para serem usadas e o processo de inserção do sistema na dinâmica urbana teve seu primeiro trauma. Alguns cidadãos se sentem excluídos por não participarem da cidade como um todo, não terem acesso aos serviços disponíveis aos “incluídos”. Uma das consequências dessa batalha silenciosa é a degradação de espaços e equipamentos urbanos. Por conta disso, as bicicletas permanentemente expostas, acabaram sendo vítimas da “cidade partida”.

O problema de segurança pública no Rio de Janeiro não será resolvido pelas bicicletas, nem tão pouco é causado por elas. No entanto, através da inclusão social que meios de transporte ativos promovem nas cidades podem ser construídos atalhos para uma cidade mais socialmente justa e inclusiva. Especificamente em relação ao sistem SAMBA, a empresa responsável e a administração municipal precisam estar cientes da importância de mobilizar os frequentadores dos espaços ao redor das estações, moradores ou não, de que aquele equipamento lhes pode ser útil e está acessível. Para isso, a integração com o Riocard (cartão pré-pago do sistema de ônibus) tem de ser feita o quanto antes. Além disso, a prefeitura precisa escolher locais mais felizes para as estações, por vezes isoladas em canteiros centrais e áreas de baixa circulação de pessoas, o que facilita a ação de criminosos e vândalos.

Copenhague e o Futuro do Planeta

O século XX foi o ápice da expansão industrial desenfreada de um mundo sem limites. Nossas cidades foram modificadas para se adequarem a circulação de um bem material privado que necessitava cada vez mais de espaço público. Os impactos negativos dos excessos são sentidos todos os dias em consequência do consumo desenfreado de energia e materiais. Os combustíveis fósseis que fazem girar a roda da economia mundial são os mesmos que sujam o ar das cidades e alteram o balanço climático global.

O mundo está reunido em Copenhague na Dinamarca para atingir um consenso sobre maneiras de reduzir as emissões de gases do efeito estufa causadas por atividades humanas: da flatulência de vacas no campo ao escapamento de veículos motorizados, passando pela energia de termoelétricas e o lixo que produzimos. As soluções são acima de tudo políticas e os meios já estão dados, basta a mobilização de agir em direção a novos rumos. Os mesmos definidos pelo relatório Brundtland e “Nosso Futuro Comum”.

Mas não basta a retórica de um “desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”. São necessárias ações que favoreçam atitudes sustentáveis por parte da população garantindo a todos o atendimento as suas necessidades básicas, sem que isso implique em impactos negativos ao meio ambiente que inviabilizem a existência humana.

Comunidades densas, onde o ser humano é prioridade, são certamente o caminho para o futuro e o que tem sido desenhado cada vez mais no século XXI. Afinal quando passarmos a pensar no ser humano e em suas necessidades principais, será mais fácil respeitar o ciclo de vida do planeta como um todo. As metas e acordos portanto terão de ser apenas os meios, e não fins em si mesmos para atingirmos um nível adequado de equílibrio entre a satisfação das necessidades humanas e as do Planeta.

Transporte Não Motorizado

Transporte Não Motorizado

O Código de Trânsito Brasileiro menciona “veículos não motorizados” e o termo é costumeiramente aceito por planejadores urbanos e até mesmo promotores de meios de transporte ativos. Mas a terminologia deixa clara a importância de um sobre o outro. Algo que é o “não” tem uma relação de dependência com aquilo que é por si só.

Nós, frágeis criaturas, somos antes de mais nada seres que caminham. Foi assim que ganhamos o mundo e nos diferenciamos das outras espécies do planeta. Consolidado o caminhar, seguimos nosso caminho pelos mares afora, utilizando a força dos músculos que remam ou dos ventos que sopram. Muito recentemente surgiram os motores e as locomotivas a vapor foram as primeiras a alcançarem grandes velocidades em terra.

Apesar de todas as evoluções os conversores mecânicos de energia em movimento serviram apenas para facilitar o transporte de grandes volumes de pessoas e carga a velocidades nunca antes imaginadas. Continuamos sendo criaturas desprovidas de motor. A humanidade no século XX se iludiu em acreditar-se superior as forças da natureza e buscou distancia da nossa fragilidade. Grandes e poderosas máquinas motorizadas dominaram o cenário urbano e ganharam um protagonismo que é ruim para todos.

Retomar a essência das cidades como espaço para as pessoas passará também por colocar o que é mais importante primeiro. E o mais importante são os pedestres, ciclistas, patinadores, skatistas; transportes ativos enfim. Sinônimos existem: transportes inteligentes, à propulsão humana, etc… Já os “veículos não motorizados” continuarão sendo apenas aqueles que tiveram motor e hoje não tem mais.

Águas e Asfalto

Água e Asfalto

Nossas cidades foram construídas em aço, concreto e asfalto, mas tudo tem seu custo e assim como água e óleo não se misturam, chuva e impermeabilização excessiva não se dão muito bem. O calor tropical representa grande desconforto para o microclima urbano nos dias mais quentes, no entanto o maior terror são as chuvas torrenciais. Apesar de não termos monções, chuva acima do esperado são normais no Brasil.

Do caos sempre pode brotar o questionamento. Do excesso de asfalto, podem surgir plantas, árvores e espaços públicos de qualidade. Nossas cidades são construções coletivas e portanto políticas. Muitas realidades nasceram utópicas e viraram status quo. As “cidades jardim” falharam na promessa de mais qualidade de vida em um misto de meio urbano e rural. Cidades que fazem sentido são densas e intensas, onde a mobilidade é racional e há proximidade.

Já é passada a hora de “des-asfaltar” nossas cidades, possibilitando que a natureza tenha mais espaço e a água possa seguir seu fluxo incontrolável. Humanos, frágeis habitantes dos zoológicos de pedra agradecem.

O vídeo mostra a iniciativa do projeto Depave.org de Portland nos EUA. No lugar de um estacionamento asfaltado sem graça, uma área para a natureza e o convívio das pessoas.

Alegoria dos Porcos

  • O texto a seguir não tem autor conhecido. Circula pela internet, dizem que o original, em espanhol, apareceu entre os alunos da Universidade de Piracicaba em 1981. Apenas as fotos foram acrescentadas. Certa vez, aconteceu um incêndio num bosque onde havia alguns porcos, que foram assados pelo fogo. Os homens, acostumados a comer carne crua, experimentaram e acharam deliciosa a carne assada. A partir daí, toda vez que queriam comer porco assado, incendiavam um bosque.Mas fazia tempo que as coisas não iam lá muito bem: às vezes os animais ficavam queimados demais ou parcialmente crus. O processo preocupava muito a todos, porque se o SISTEMA falhava, as perdas ocasionadas eram muito grandes – milhões eram os que se alimentavam de carne assada e também milhões os que se ocupavam com a tarefa de assá-los. Portanto, o SISTEMA simplesmente não podia falhar. Mas, curiosamente, quando mais crescia a escala do processo, tanto mais parecia falhar e tanto maiores eram as perdas causadas.

Em razão das inúmeras deficiências, aumentavam as queixas. Já era um clamor geral a necessidade de reformar profundamente o SISTEMA. Congressos, seminários, conferências passaram a ser realizados anualmente para buscar uma solução. Mas não acertavam o melhoramento do mecanismo. Assim, no ano seguinte repetiam-se os congressos, seminários, conferências.

As causas do fracasso do SISTEMA, segundo os especialistas, eram atribuídas à indisciplina dos porcos, que não permaneciam onde deveriam, ou à inconstante natureza do fogo, tão difícil de controlar, ou ainda às árvores ou à umidade da terra ou ao serviço de informações meteorológicas, que não acertava a quantidade das chuvas…

Na verdade, o sistema para assar porcos era muito complexo. Fora montada uma grande estrutura: maquinário diversificado; indivíduos dedicados exclusivamente a acender o fogo – incendiadores especializados (da Zona Norte, da Zona Oeste, noturnos e diurnos, incendiador de verão, de inverno, etc). Havia especialista também em ventos – os anemotécnicos. Havia um Diretor Geral de Assamento e Alimentação Assada, um Diretor de Técnicas Ígneas (com seu Conselho Geral de Assessores), um Administrador Geral de Reflorestamento, uma Comissão de Treinamento Profissional em Porcologia, um Instituto Superior de Cultura e Técnicas Alimentícias (ISCUTA) e o Bureau Orientador de Reforma Igneooperativas.

Havia sido projetada e encontrava-se em plena atividade a formação de bosques e selvas, de acordo com as mais recentes técnicas de implantação. Eram milhões de pessoas trabalhando na preparação dos bosques, que logo seriam incendiados. Havia especialistas estrangeiros estudando a importação das melhores árvores e sementes, fogo mais potente. Havia grandes instalações para manter os porcos antes do incêndio, além de mecanismos para deixá-los sair apenas no momento oportuno.

Foram formados professores especializados na construção dessas instalações. Pesquisadores trabalhavam para as universidades para formação dos professores especializados; fundações apoiavam os pesquisadores que trabalhavam para as universidades que preparavam os professores especializados na construção das instalações para porcos….

As soluções que os congressos sugeriam eram, por exemplo, aplicar triangularmente o fogo depois de atingida determinada velocidade do vento, soltar os porcos 15 minutos antes que o incêndio médio da floresta atingisse 47 graus, posicionar ventiladores-gigantes em direção oposta à do vento, de forma a direcionar o fogo, etc.

Um dia, um incendiador categoria AB/SODM-VCH (ou seja, um acendedor de bosques especializado em sudoeste diurno, matutino, com bacharelado em verão chuvoso), chamado João Bom-Senso, resolveu dizer que o problema era muito fácil de ser resolvido – bastava, primeiramente, matar o porco escolhido, limpando e cortando adequadamente o animal, colocando-o então sobre uma armação metálica sobre brasas, até que o efeito do calor – e não as chamas – assasse a carne.

Tendo sido informado sobre as idéias do funcionário, o Diretor Geral de Assamento mandou chamá-lo ao seu gabinete, e depois de ouvi-lo pacientemente, disse-lhe:

– Tudo o que o senhor disse está muito bem, mas não funciona na prática. O que o senhor faria, por exemplo, com os anemotécnicos, caso viéssemos a aplicar a sua teoria? Onde seria empregado todo o conhecimento dos acendedores de diversas especialidades?
– Não sei – disse João.
– E os especialistas em sementes? Em árvores importadas? E os desenhistas de instalações para porcos, com suas máquinas purificadores automáticas de ar? E os anemotécnicos que levaram anos especializando-se no exterior, e cuja formação custou tanto dinheiro ao país? Vou mandá-los limpar porquinhos? E os conferencistas e estudiosos, que ano após ano têm trabalhado no Programa de Reforma e Melhoramentos? Que faço com eles, se a sua solução resolver tudo? Heim?

– Não sei – repetiu João encabulado.
– O senhor não vê, que, se tudo fosse tão simples, nossos especialistas já teriam encontrado a solução há muito tempo atrás? O senhor com certeza compreende que eu não posso simplesmente convocar os anemotécnicos e dizer-lhes que tudo se resume a utilizar brasinhas, sem chamas! O que o senhor espera que eu faça com os quilômetros e quilômetros de bosques já preparados, cujas árvores não dão frutos e nem têm folhas para dar sombra? Vamos, diga-me.
– Não sei, não senhor.
– Viu? O senhor tem que trazer soluções para certos problemas específicos – por exemplo, como melhorar as anemotécnicas atualmente utilizadas, como obter mais rapidamente acendedores de Oeste (nossa maior carência), como construir instalações para porcos com mais de sete andares.

Temos que melhorar o sistema, e não transformá-lo radicalmente, o senhor, entende? Ao senhor, falta-lhe sensatez!
– Realmente, eu…. – suspirou João.
– Bem, agora que o senhor conhece as dimensões do problema, não saia dizendo por aí que pode resolver tudo. O problema é bem mais sério e complexo do que o senhor imagina.