por mais pessoas em mais bicicletas mais vezes | Mobilidade Urbana e por Bicicletas | Qualidade de Vida | Educação Cicloviária | Transporte Sustentável
Uma iniciativa em Copenhague é inspiradora e mostra o comprometimento da administração pública em oferecer mais conforto para os ciclistas. É algo simples que não chama a atenção mas que responde a um anseio natural dos ciclistas. Na região para apoiar os pés está escrito: “Olá ciclista! Descanse seu pé aqui… e obrigado por pedalar na cidade.”
Esse tipo de corrimão pode é constantemente improvisado de maneira natural por qualquer ciclista em um semáforo fechado. Ao instalar um tipo oficial, com direito a apoio para os pés, uma vez mais a cidade de Copenhague mostra que seus administradores dedicam-se a observar e entender a natureza humana, essas frágeis criaturas.
Não podemos todos nos mudar para a Dinamarca, mas certamente todas as cidades do mundo deveriam ser um pouco como Copenhague, o mundo certamente seria um lugar melhor para se viver.
Cidades, com seus defeitos e inviabilidades são o habitat da maior parte dos seres humanos. Estão aqui há alguns milhares de anos e devem sobreviver a outros tantos, mas precisam melhorar em diversos aspectos até lá.
Podemos considerar a priorização das máquinas em relação a vida como um curto lapso de consciência. Algumas décadas durante o século XX em que chegamos a cogitar que o progresso e livre fluidez de máquinas foi mais importante do que os seres humanos.
A humanização do espaço urbano tem sido buscada por pioneiros há alguns anos, mas deixou de ser preocupação de uma minoria de visionários e cada vez mais ganha corpo como senso comum. Uma idéia que ganha corpo é a “moderação de tráfego”, ou “acalmia” como dizem os portugueses.
A moderação do tráfego tem por objetivo inserir a circulação dos veículos dentro um processo de desenvolvimento sustentável da cidade: preservar o ambiente urbano e a qualidade de vida, e, ao mesmo tempo, garantir a mobilidade das pessoas e dos bens assim como a acessibilidade aos vários locais e atividades. A melhoria das condições de segurança do tráfego é o primeiro critério neste processo.
Um benefício indireto de um número maior de ruas mais tranquilas pode parecer pequeno e pouco relevante, mas tem implicações enormes para as frágeis criaturas que habitam as cidades. Um estudo norte americano (Livable Streets) apontou que em situações análogas, pessoas que moram em ruas tranquilas tem em média três amigos a mais e o dobro de conhecidos do que alguém que mora em uma rua de tráfego motorizado intenso.
É fácil imaginar porque alguém que mora em uma rua tranquila tem mais amigos. A vontade de sair mais a rua, os efeitos positivos de dormir melhor, e um contato mais próximo com o ambiente e as pessoas a sua volta.
Uma cidade em que um número maior de pessoas tem mais amigos é mais democrática e tem um tecido social mais coeso. Torna-se portanto mais segura e agradável de se viver. E tudo começa com medidas de moderação de tráfego que são capazes de colocar de volta as pessoas como prioridade absoluta das cidades.
Mesmo quando a neve cai, Copenhague continua sendo ciclável. Nada de especial nas bicicletas e nem mesmo seus ciclistas são mais poderosos do que os nossos. Apenas para garantir que um número relevante de pessoas continue pedalando, a prefeitura tem tratores especiais que limpam as ciclovias.
As alternativas fazem com que pedalar, mesmo no frio, sejam vantajosas. Afinal a bicicleta possibilita pontualidade, como sempre, e é prática como em qualquer lugar o ano todo. No entanto os transportes públicos ficam mais cheios por conta do frio e torna-se uma questão de análise racional de opções.
Para fazer um paralelo com o Brasil, ao invés de neve em janeiro, temos chuvas (em algumas regiões) e o calor. Pode parecer surpreendente, mas os incentivos e atitudes individuais dos ciclistas tem de ser similares tanto na neve quanto em tempo chuvoso ou no calor.
O desconforto climático de pedalar com grandes casacos é similar ao que tem de enfrentar um ciclista tropical e a atitude a ser tomada é a mesma, manter um ritmo constante e mais lento do que quando o clima está ameno. Já para quando a neve ou a chuva caem, o certo é reduzir a velocidade e tomar mais cuidado nas curvas, afinal a aderência dos pneus da bicicleta diminui. Em caso de calor o ciclista também deve optar por rotas mais arborizadas, afinal sombras são sempre mais agradáveis do que asfalto e concreto por todos os lados.
Para incentivar os ciclistas a seguirem pedalando mesmo com condições climáticas aparentemente adversas, medidas simples:
– Bicicletários seguros e cobertos para garantir que a bicicleta não vai ficar exposta as intempéries além do estritamente necessário, isto é, quando em movimento;
– Vestiários para quando o suor for além do aceitável. Afinal o costume indígena do banho diário chegou até os dias de hoje entre os brasileiros. E o calor tropical é também um grande incentivo a esse hábito;
– Por fim, ruas mais arborizadas e medidas de promoção a um micro-clima mais saudável nas cidades. Afinal árvores ajudam a resfriar a temperatura e ao mesmo tempo aliviam das chuvas mais fortes.
Caminhar é a maneira mais antiga de ir de um ponto a outro, mas é sempre bom relembrar. Conhecer o próprio bairro a pé, ou refazer um trajeto rotineiro andando é certamente uma atividade lúdica e até mesmo científica. É oportunidade para descobrir a moda das ruas e a arte dos muros, a melhor maneira de conhecer o comércio e ver in loco quem frequenta os botecos.
As grandes cidades vão muito além da capacidade humana de absorver conhecimento. Tanto acontece ao mesmo tempo e muda com frequência tão grande que nem mesmo a criatura que criou a cidade é capaz de compreende-la e conhece-la. Caminhar pelas ruas é por isso a melhor maneira de, sem sucesso, entender a urbe. Flanar é arte antiga, mas as vezes ir pelos próprios pés procurando algo que não se acha é ser objetivo e sonhador com um pé depois do outro.
O trajeto nunca é o mesmo quando caminhamos, em cada lado da rua, uma calçada. Em cada calçada pontos de interesse distintos, prédios, perspectivas e sempre encontros fortuitos com o inesperado. Um amigo na esquina, moça bonita que passa, rapaz faceiro que segue seu rumo. Casal de idosos de mãos dadas.
Caminhar é o meio de transporte mais antigo e certamente nunca pode ser esquecido. Por mais que sejamos incapazes de entender a diversidade da urbe, melhor fazer parte dela movendo-se com os próprios pés. Para saber dos problemas, das vantagens e ao mesmo tempo sentir-se vivo e fazer parte de onde se vive.
Nossas cidades foram construídas em aço, concreto e asfalto, mas tudo tem seu custo e assim como água e óleo não se misturam, chuva e impermeabilização excessiva não se dão muito bem. O calor tropical representa grande desconforto para o microclima urbano nos dias mais quentes, no entanto o maior terror são as chuvas torrenciais. Apesar de não termos monções, chuva acima do esperado são normais no Brasil.
Do caos sempre pode brotar o questionamento. Do excesso de asfalto, podem surgir plantas, árvores e espaços públicos de qualidade. Nossas cidades são construções coletivas e portanto políticas. Muitas realidades nasceram utópicas e viraram status quo. As “cidades jardim” falharam na promessa de mais qualidade de vida em um misto de meio urbano e rural. Cidades que fazem sentido são densas e intensas, onde a mobilidade é racional e há proximidade.
Já é passada a hora de “des-asfaltar” nossas cidades, possibilitando que a natureza tenha mais espaço e a água possa seguir seu fluxo incontrolável. Humanos, frágeis habitantes dos zoológicos de pedra agradecem.
O vídeo mostra a iniciativa do projeto Depave.org de Portland nos EUA. No lugar de um estacionamento asfaltado sem graça, uma área para a natureza e o convívio das pessoas.