Conservação à pedal

Foto: Divulgação/SECONSERVA

Uma novidade ciclística já está cruzando as ruas e ciclovias do Rio de Janeiro. Desde o começo de março, para agilizar o trabalho de manutenção do calçamento de pedras portuguesas em praças e na orla, a Secretaria Municipal de Conservação e Serviços Públicos (SECONSERVA) colocou à disposição dos calceteiros um triciclo de carga.

Os calceteiros são aqueles profissionais que tem a missão de zelar e manter a qualidade do piso de pedras portuguesas, um patrimônio carioca, mas que requer um grande esforço para ficar sempre em perfeitas condições de circulação.

Nas próximas semanas os calceteiros, e agora, triciclistas, poderão ser vistos trabalhando na orla do Leblon, na Lagoa Rodrigo de Freitas, na altura do Posto 6 em Copacabana e nas praças General Osório, em Ipanema e Santos Dumont, na Gávea.

Além dos aspectos óbvios de economia de custos e sustentabilidade ambiental, a realização do serviço de manutenção de calçadas através do uso de triciclos é acima de tudo a opção mais inteligente. Afinal está sempre no último quilômetro o maior custo de deslocamento de produtos. Ao levar consigo os equipamentos e materiais necessários para o trabalho, os calceteiros tem facilidade nos deslocamentos, sem depender de um veículo de carga grande.

Com informações da assessoria de imprensa da SECONSERVA.

Mudar as cidades através do Design

Um convite à arquitetos, urbanistas, planejadores urbanos, engenheiros de tráfego, ciclistas, pedestres, patinadores e skatistas. Em sua nova palestra o consultor de mobilidade Urbana Mikael Colville-Andersen irá apresentar o conceito da “Cultura da Bicicleta através do Design“.

Imaginar as cidades do século XXI é deixar para trás a engenharia de tráfego, nascida no começo do século XX e que não foi capaz até hoje de equacionar uma solução para a mobilidade urbana. Mikael propõe deixar de lado a engenharia e substitui-la pelo design. No lugar da fluidez, os usos das ruas, ao invés de maior velocidade nas vias, mais qualidade de vida no espaço urbano.

O evento será realizado nessa quinta-feira às 18h30 no Centro de Arquitetura e Urbanismo (CAU) da Secretaria Municipal de Urbanismo.

MIKAEL COLVILLE-ANDERSEN – BICYCLE CULTURE BY DESIGN
15 DE MARÇO DE 2012 – 18h30
RUA SÃO CLEMENTE,117
BOTAFOGO, RIO DE JANEIRO

Abaixo o release oficial do evento:

A Cultura da Bicicleta através do Design – No seu trabalho com a Copenhagenize Consulting, Mikael Colville-Andersen descobriu que “Mobilidade Urbana” não é uma linguagem tão universal quanto pode parecer. Existem diversos agentes envolvidos no trabalho de criar cidades mais habitáveis, e no resgate da bicicleta como meio de transporte.

Nesta palestra, Mikael oferece uma abordagem linguistica universal, usando o Design como o denominador comum de tudo, desde o ativismo até a engenharia de trânsito. Será que o processo, de projetar infraestrutura para bicicletas, não deveria ser tão simples quanto projetar uma torradeira ou uma escovas de dentes? Utilizar princípios básicos do Design no planejamento e engenharia fazem com que seja mais fácil entender a infraestrutura e a cultura da bicicleta, além de prover uma rota mais direta para a sua implementação.

Mikael destaca a história do planejamento urbano e da engenharia de transito, e aponta para o momento onde tudo começou à dar errado. Quando, depois de 7000 anos de cidades com ruas dedicadas às pessoas, tudo foi virado de ponta cabeça, e os carros dominaram as ruas, às custas da habitabilidade das cidades. Ele fala sobre como o bio mimetismo pode ser útil no processo de re-engenharia
das nossas cidades, e como a bicicleta é a mais eficaz ferramenta de que dispomos para atingir o objetivo de cidades habitáveis.

A primeira impressão de Mikael Colville-Andersen sobre o Rio de Janeiro foi certamente impactante. O desenho das montanhas e uma cidade que tem um aeroporto conectado diretamente à uma ciclovia.

Bicicleta, veículo de transformação urbana

O grande diferencial da bicicleta como meio de transporte urbano reside justamente no fato da bicicleta ser um veículo. Na lógica do planejamento urbano consolidado ao longo do século XX a prioridade aos poucos foi sendo reconstruída para comportar a circulação de veículos motorizados.

Reverter uma lógica presa à circulação veicular motorizada é um trabalho árduo e que requer diversas frentes. Talvez a melhor delas seja a bicicleta e a razão é bastante simples. Veículo movido pela força humana, uma bicicleta é uma versão mais eficiente de um pedestre. Apesar de mais veloz e com menor gasto energético, continua dentro da lógica humana, dada a fragilidade do conjunto ciclista+máquina.

A subversão da lógica urbana através da bicicleta nem sempre é entendida por aquele sujeito chamado de “Senso Comum”. Quando uma massa de ciclistas toma uma grande avenida, erroneamente julga-se que o trânsito foi impedido. Na realidade o que ocorre é um movimento cidadão de retomada do espaço de circulação viário que normalmente tem uso único. Em lugar do trânsito motorizado cotidiano, circula uma massa uniforme de pessoas em bicicletas, essa ocupação convencionou-se chamar de Massa Crítica, ou Bicicletada.

A Massa Crítica de São Francisco foi criada em 1992 e é filha da mesma ideologia dos movimentos anteriores de contestação do status quo. E aí reside a limitação de movimentos dessa natureza, costumam esvaziar-se com o tempo e em geral tem tendência autocentrada, nem sempre capazes de influenciar as mudanças sociais a que se propõem. O texto “Massa Crítica ou Falha Crítica” escrito por Mikael Colville-Andersen, e traduzido por nós, aprofunda o tema.

Inserida pela sutileza de ocupar pouco espaço e ser mais veloz que qualquer veículo motorizado nas cidades, a bicicleta também se insere pela força daqueles que de maneira anárquica celebram a rua como espaço público para comemoração, protesto e circulação, tudo ao mesmo tempo.

Grandes avenidas tomadas por bicicletas à perder de vista são sempre um espetáculo para os olhos e a alma. Revigora e possibilita sonhar com cidades melhores, e as pessoas que compõem essa massa sem líderes certamente querem transformar a utopia em realidade. Há no entanto um problema a ser equacionado para que os “cicloativistas” tornem-se efetivamente agentes da transformação urbana.

O valor de todo “movimento cicloativista” é principalmente de unir pessoas, fortalecer os vínculos humanos de uma minoria engajada em favor da bicicleta. Esse valor será ainda maior quanto menos reativa for a postura dos que defedem a bicicleta. Não basta protestar quando ciclistas são mortos no trânsito, tirar a roupa e sair pedalando chama a atenção da mídia, mas não muda a paisagem urbana. Cada “cicloativista” tem que ter uma postura de defensor do uso da bicicleta ser especialista em mobilidade urbana. Ter um discurso que seja apreendido e levado a sério por planejadores urbanos, técnicos nas prefeituras, jornalistas e a sociedade como um todo.

A inserção da bicicleta nas cidades é o primeiro ato, as pedaladas seguintes são as mais complexas, requerem menos festa e um esforço constante, articulação política e pressão na medida certa. Ao invés de reclamar com os jornais por matérias erradas e pela lentidão do poder público, é preciso pautar a imprensa e aliar-se ao poder público, sem ser cooptado. A rebeldia adolescente do “cicloativismo” tem o potencial de amadurecer e, com isto, mudar o espaço urbano. E tudo sem perder a alegria do vento no rosto e o sorriso aberto que faz lembrar as primeiras pedaladas na infância.

Mapa Cicloviário Unificado do Rio de Janeiro

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Uma habilidade fundamental do ser urbano é ter um mapa mental minimanente completo de sua cidade. Mais do que conhecer nomes de ruas e avenidas, saber navegar por elas mantendo um rumo. Cada cidadão tem seus marcos de orientação, seus trajetos e vivencia a cidade dentro da sua própria dinâmica.

Ciclistas tendem a vivenciar a cidade de maneira distinta, e como ainda são um grupo minoritário nas ruas brasileiras, tem uma tendência colaborativa natural. É um caminho lógico portanto que existam mapas da cidade feito por ciclistas e para ciclistas.

O Rio de Janeiro ainda não tem uma versão completa de rotas recomendáveis, nem tão pouco um mapa unificado que inclua todas as ciclovias e pontos de interesse do ciclista. Para corrigir essa deficiência, a Transporte Ativo buscou unificar os mapas colaborativos disponíveis na internet ao mapeamento da infraestrutura cicloviária carioca disponível em nosso site.

Em conversa com os desenvolvedores destes mapas, o Arlindo Pereira, Marcos Cavalcanti, Rodrigo Abreu e Zani, chegamos a conclusão que unir todas as informações em um só mapa seria maravilhoso.

Era hora de começar a criar um mapa unificado de consulta pública, bastaria apenas organizar os dados, criar um grupo de trabalho com os que já iniciaram seus mapas e aos poucos incluir novos colaboradores. Estabelecemos padrões, nomenclatura, simbolos e informações

O resultado ainda é um processo em produção e os cariocas estão convidados a participar. Basta se inscrever no grupo de discussão sobre o tema, para saber como proceder, e colocar a mão na massa. A idéia é juntar em um único mapa as melhores vias de circulação além de pontos de apoio e estacionamentos.

Para repensar a linguagem

O uso corrente de diversos termos no que se refere à mobilidade urbana são baseados no vocabulário da engenharia de tráfego dos 1950, 1960. Repesensar os significados das palavras é um caminho fundamental para mudar o entendimento sobre a forma e função da cidade. De maneira brilhante a cidade norte-americana de West Palm Beach na Flórida produziu um documento dirigido aos técnicos da área de trânsito para que pudessem substituir palavras tendeciosas relativas à investimentos e políticas públicas de trânsito.

A diretiva é bastante clara, já na definição do que é tráfego:

A palavra tráfego é corriqueiramente usada como sinônimo de tráfego de veículos motorizados. Existem no entanto diversos tipos de tráfego nas cidades: tráfego de pedestres, tráfego de bicicletas, tráfego de trens. Para garantir a objetividade, se você quer dizer tráfego de veículos motorizados, então diga tráfego de veículos motorizados. Caso esteja se referindo a todo tipo de tráfego, então diga tráfego.

Outro termo empregado de forma errada e que tem definição mais precisa é em relação ao uso da palavra acidente:

Acidentes são eventos danosos em que algo acontece por um azar inesperado ou por acaso. Acidentes implicam na ausência de culpados. É amplamente sabido que a grande maioria dos acidentes (de trânsito motorizado) são previniveis e além de ser possível apontar culpados. O uso da palavra acidente também reduz o grau de responsabilidade e da gravidade associada à situação e invoca um certo grau de simpatia à pessoa responsável. A linguagem objetiva inclui os termos colisão e batida.

Por conta dessa visão, que após o atropelamento dos ciclistas de Porto Alegre em fevereiro de 2011 durante a bicicletada, o termo #naofoiacidente foi um dos mais comentados no twitter. A situação se repetiu na última sexta-feira, 02 de março, quando mais uma ciclista foi morta por um ônibus na avenida Paulista e também em outras cidades brasileiras. O tema foi gancho para um debate ao vivo com Zé Lobo, presidente da Transporte Ativo, e o jornalista ambiental André Trigueiro, assista.

O manual de West Palm Beach ainda trata de diversos outros termos, alguns mais, outros menos simples de serem traduzidos para a realidade brasileira. Em português por exemplo a maior distorção do planejamento viário tupiniquim é o uso do termo “não-motorizado” para tratar de pedestres, ciclistas e outros meios de transporte ativos. Assunto já tratado em um outro post (Transporte não-motorizado).

Exemplos a serem resignificados existem em abundância. Quando uma via fica restrita à circulação de veículos motorizados a comunicação oficial é de que a via foi “fechada”, quando o correto seria dizer justamente o contrário, que a via foi aberta exclusivamente para o tráfego de pessoas.

Repensar o discurso e o uso das palavras é um primeiro passo fundamental para ordenar prioridades e atualizar o planejamento urbano. Afinal, nada mais antiquado do que usar gírias de meados do século XX em pleno século XXI e de certa forma é isso que temos aceitado fazer no que se refere à mobilidade urbana.

A publicação original do manual da prefeitura de West Palm Beach está disponível em pdf. Mais informações no blog Human Transit. O blog “Vá de Bike”, também traz sua visão sobre porque “acidente” não descreve os atropelamentos de ciclistas.