A Lei da Mobilidade Urbana

A recém promulgada lei da Política Nacional de Mobilidade Urbana, aponta novas caminhos para equacionar o drama urbano da (i)mobilidade. As diretrizes da nova lei preveem integração entre “a política de desenvolvimento urbano e respectivas políticas setoriais de habitação, saneamento básico, planejamento e gestão do uso do solo” (art. 6, ítem I). O texto segue em linha gerais estabelecendo prioridade para o transporte público, dos meios de transporte “não-motorizados” e dando incentivos a melhorias em prol da sustentabilidade.

Dentre as principais medidas da nova lei, fica assegurada a participação da sociedade civil no planejamento, fiscalização e avaliação da mobilidade urbana (art. 15) e o código de defesa do consumidor passa a valer para os usuários do transporte público (art. 14). Mas o mais importante é os municípios com mais de 20 mil habitantes terão prazo de 3 anos para elaborarem um Plano de Mobilidade, antes ele só era obrigatório para os 38 municipíos brasileiros com mais de 500 mil habitantens.

Segundo análise do IPEA, (Nova lei moderniza regulação da mobilidade urbana) a primeira constatação é que a nova lei oficializa o que já estava definido na “Política Nacional da Mobilidade Urbana Sustentável“, formulada pelo Ministério das Cidades em 2004. Ou seja, o que já estava redigido pelo Ministério passa a ter força de lei federal, mas na prática o caminho ainda é longo para que as medidas previstas sejam colocadas em prática.

Além do texto um tanto quanto amplo demais, o principal deslize do novo plano é insistir na definição de modos de transporte ativos como “não motorizados“. A questão é mais do que sintática, pedestres cadeirantes, ciclistas, skatistas, patinadores são definidos em função do meio de transporte principal nas cidades, os motorizados e isso ainda não mudou com a nova lei. O texto “Transporte Não Motorizado“, alonga-se sobre a questão.

Para quem quiser saber mais sobre a importância de Planos de Mobilidade, a Autoridade Européia de Transporte Metropolitano tem um documento valioso em inglês: “Mobility Plans: the way forward for a sustainable urban mobility“.

Para que a legislação tenha valor, agora é preciso que haja pressão local nos milhares de municípios que passam a ser obrigados a ter um plano de mobilidade. Antes apenas as cidades com mais de 500 mil habitantes eram obrigadas a elaborar um plano e ainda hoje nem todas as 38 cidades que se encaixam nesse perfil Brasil afora foram capazes de elaborar seus planos de mobilidade.

A importância da acessibilidade

Para os pedestres, uma calçada mal conservada é sinômino de desconforto e muitas vezes acidentes. Um estudo de 2005 feito no Hospital das Clínicas de São Paulo atestou que a circulação de pedestres é na verdade um enorme problema de saúde pública. São milhares de casos todos os anos que oneram os custos dos hospitais que também geram um enorme prejuízo econômico para a sociedade.

Já para um cadeirante, calçadas sem condições de circulação representam um custo ainda maior, a perda de acesso à cidade. De maneira consistente ou com improvisos, garantir o direito de ir e vir à pessoas com mobilidade reduzida ganha a devida atenção em nossas cidades. É a luta em prol do que se convencionou chamar de acessibilidade, ou “desenho universal“.

Ao reforçar a lógica de pensar primeiro no mais frágil, o planejamento urbano garante acesso à todos. Sejam ciclistas nas ruas ou os cadeirantes nas calçadas. Parabéns aos irmãos Ramon e Thomaz Ballverdu que junto com Marcelo Silva, produziram o vídeo que ilustra esse post. Moradores de Pelotas, nenhum dos três é cadeirante, mas sabem da importância de uma cidade inclusiva.

Com informações de:
Parkour Roulant: atletismo sobre rodas – Pelotas, Capital Cultural
Cerca de 100 000 pedestres caem e se machucam nas calçadas todos os anos – VejaSP

Bicicletas, segurança e mobilidade

Quando se discute o uso da bicicleta, a segurança é sempre identificada como questão vital.

Para incentivar e apoiar o uso da bicicleta, é preciso que a segurança e o engajamento público andem de mãos dadas.

Usar os benefícios para a saúde como argumento e gatilho para uso da bicicleta não é bom o suficiente. Ninguém pode esperar que pessoas comecem a pedalar se um nível mínimo de segurança não for alcançado. Basicamente isso significa providenciar espaço para andar de bicicleta nas áreas urbanas – o que pode ser feito de muitas maneiras diferentes.

Um boletim publicado pelo projeto Civitas Mobilis avalia a situação de segurança em quatro cidades europeias (Ljubljana, Odense, Toulouse e Veneza) e faz uma síntese das discussões havidas num workshop sobre o assunto, que traduzimos a seguir, com adaptações:

Lições aprendidas

Para reforçar a cultura de mobilidade sustentável e implantar condições mais seguras para o uso da bicicleta em áreas urbanas, as soluções propostas precisam abranger diferentes áreas de ação:

• Infraestrutura
• Regulamentos
• Consistência e equidade
• Cominação (fazer cumprir as leis)
• Educação
• Sensibilização e compreensão mútua

Especialistas apontaram que as questões de segurança devem ser focadas em:

• segurança nos cruzamentos
• segurança da bicicleta contra acidentes e crimes
• promoção da cultura de uso seguro da bicicleta
• cooperação entre ONGs e Prefeituras

De acordo com a estatística de acidentes, a segurança em cruzamentos foi identificada como o ponto mais crítico quando se anda de bicicleta. Para maior segurança, várias soluções técnicas têm sido identificadas (sinalização, vias e áreas exclusivas para bicicletas), mas cada um tem vantagens e desvantagens.

A principal solução é adotar a área de espera (“ciclocaixa”) para ciclistas entre a faixa de pedestres e os veículos motorizados. Na Dinamarca, por exemplo, uma maior segurança para os ciclistas que vão virar à esquerda no cruzamento foi obtida com faixas exclusivas paralelas à travessia de pedestres. Com faixas exclusivas em interseções adota-se uma infraestrutura que permite que o ciclista seja visto pelos condutores de automóveis e caminhões.

Em Liubliana, o maior problema de segurança são os roubos que acontecem constantemente. Uma das possíveis soluções para este problema é a introdução de chips de identificação das bicicletas. Fazer seguro é possível somente quando são usados travas e cadeados com qualidade certificada. Neste caso, a questão financeira não é o preço do chip, mas o tempo empregado pela polícia ao procurar a bicicleta roubada.

A promoção da cultura para uso seguro da bicicleta pode ser feita de várias formas, utilizando diferentes ferramentas e com foco em públicos diferentes.

Apenas projetos educativos são demorados, uma vez que levam, como no caso de Odense, de 20 a 30 anos para alcançar a mudança comportamental. A educação deve ser completada: 1) pela cominação, ou seja, forçar o cumprimento das leis, medida geralmente considerada antipática e desestimulante, mas obviamente indispensável quando mudanças rápidas são necessárias; e 2) por medidas de engenharia, fornecendo infraestrutura segura como base.

Em Odense, há 30 anos começou a política de resolver os problemas do uso da bicicleta na cidade, com ações para tornar a mobilidade por bicicleta melhor e mais segura (nova e melhor infraestrutura cicloviária) e os políticos foram envolvidos, dando apoio à bicicleta. Foi estabelecida uma boa comunicação entre a administração da cidade e os ciclistas. Em 1998 a Dinamarca adotou um novo projeto de mobilidade por bicicleta, tendo as questões de saúde como uma das principais forças motrizes. Contudo, a experiência em Odense e Louvain mostra que, em termos de educação, o mote é trabalhar com crianças.

Nas cidades pesquisadas, foram estabelecidas cooperações de vários níveis e dimensões entre ONGs e administrações públicas nas últimas décadas. Em Veneza, por exemplo, o coordenador de mobilidade por bicicleta costumava trabalhar para ONGs e tem uma abordagem mais crítica do que outros funcionários públicos, pois conhece diretamente os problemas enfrentados por quem anda de bicicleta. Em Liubliana foi instituída uma abordagem mais participativa – há 10 anos, por meio de manifestações e com propostas de eliminar pontos críticos e de haver ciclovias limpas e contínuas, ONGs começaram a informar a administração da cidade sobre os problemas críticos que os ciclistas enfrentam na cidade. Em Toulouse, várias organizações oferecem serviços de aluguel de bicicletas, desde voluntários a empresas privadas. Em Munique, juntamente com as autoridades, ONGs realizaram campanhas inovadoras na cidade, como dias sem carro, fechamento de áreas da cidade ao tráfego motorizado e atividades educativas.

Para conhecer, com mais detalhes, as medidas adotadas nas cidades citadas, leia o Boletim Mobilis nº 4 (PDF, em inglês).

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Mostrando preocupação sobre este tema, no dia 22 de julho, a Prefeitura do Rio promoveu o Painel Brasileiro de Segura Viária, como parte dos preparativos do Dia Mundial Sem Carro – 22 de setembro. Saiba mais aqui.

Manual de contagem, em espanhol

Manual de contagem trilingue

O Manual de Contagem Fotográfica de Bicicletas foi publicado em junho, pela Transporte Ativo, para divulgar e disseminar o método prático e eficiente, inventado pela TA, para medir o fluxo de bicicletas.

A qualidade do manual foi reconhecida de imediato pelo ITDP-Brasil, que patrocinou a tradução para o inglês e o espanhol.

O manual em inglês foi lançado em agosto.

Agora, estamos publicando o manual em espanhol, Conteo Fotográfico de Bicicletas, com tradução de Carlos Felipe Pardo, Assessor do ITDP-Colômbia e membro do Sustran LAC.

A TA atuando trilíngue!

Agradecemos o empenho e o reconhecimento de Jonas Hagen, do ITDP-Brasil

  • os dois próximos posts serão publicados em inglês e espanhol, para divulgação no exterior e captura dos textos pelos mecanismos de busca da internet, nas respectivas línguas estrangeiras.

Crianças em Movimento

http://www.ta.org.br/blog/crianas_em_movimento.jpg

As crianças são muitas vezes mais vulneráveis aos efeitos negativos de um ambiente degradado do que os adultos, especialmente em áreas urbanas. No entanto, elas não são apenas pequenas vítimas inocentes. As crianças têm um potencial ainda inexplorado para incentivar e influenciar outras pessoas a adotarem comportamentos mais sustentáveis. Nós, adultos, devemos assumir nossa responsabilidade para envolvê-las no planejamento e na tomada de decisões com maior seriedade, para que elas tenham uma chance de influenciar o presente e moldar o futuro.

O manual “Kids on the move” foi lançado pela Comissão Europeia, Diretório Geral do Meio Ambiente, em 2002, após ser anunciado pela Sra. Margot Wallström na conferência Velocity daquele ano. Está sendo publicado hoje, em português, com o título “Crianças em movimento”.

Assim como o manual “Cidades do futuro, cidades para bicicletas”, que reconheceu o valor das bicicletas para as cidades, “Crianças em movimento” mostra a importância de reconhecer as necessidades específicas das crianças no trânsito. O manual destaca as iniciativas desenvolvidas, na Europa, por escolas, empresas de transporte público ou autoridades locais que tenham objetivo de promover o bem-estar dos nossos filhos.

“Crianças em movimento” contém numerosas sugestões práticas, endereços internet e documentação de referência sobre como abordar a questão da mobilidade da criança no trânsito do ponto de vista de um pai, uma escola, uma empresa de transporte, uma autoridade local e do ponto de vista da própria criança. O manual também inclui uma breve descrição de quinze iniciativas que foram tomadas a nível local, nacional ou internacional (assembleias de crianças e jovens, rotas seguras para as escolas, pédibus e grupos de bicicleta, campanha em favor dos transportes públicos, bicicletas para jovens mulheres, eventos como o italiano Bimbimbici, dias sem carro, etc).

A publicação foi apresentada oficialmente durante um seminário organizado pela Federação Europeia de Ciclistas (ECF) na Green Week, em Bruxelas. O manual foi criado para ser distribuído tanto através dos canais habituais de informação da União Europeia e através de redes ou associações de autoridades locais, escolas, pais, jovens, etc, e pode ser uma ajuda útil com ideias para aqueles que querem participar do Dia 22 de Setembro – Na Cidade sem meu Carro.

A Associação Transporte Ativo obteve autorização expressa, a tradução foi feita por Patrícia Casela, e agora o manual está disponível gratuitamente em língua portuguesa.

Compartilhamos aquelas mesmas preocupações sobre o futuro, a saúde e o lugar das crianças no trânsito. Com a tradução do manual Kids on the move almejamos dar outro enfoque para a “Semana do Trânsito” nas escolas e as discussões sobre o assunto, em vez de moldar “pequenos motoristas” e forjar uma dependência ao carro, muitas vezes desnecessária e quase sempre prejudicial.

Temos certeza que podemos aprender com o exemplo europeu. Autoridades e escolas precisam conscientizar-se de que crianças e adolescentes possuem necessidades próprias no trânsito. Ruas vivas e espaços vivos nas cidades influenciam diretamente o desenvolvimento corporal, mental e de cidadania das crianças. Mostrar a elas, e aos jovens em formação, o caminho dos transportes ativos é o primeiro passo da independência. Construir cidades onde seja permitido crianças nas ruas é abrir as portas para que elas encontrem seu lugar no espaço urbano, desde bem cedo. Isto só trará benefícios. Uma cidade mais segura, mais saudável e mais agradável para crianças é uma cidade boa para todo mundo.

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