O dilema das ciclovias

As cidades chegaram ao seu limite e agora todos buscamos soluções. Precisamos fazer escolhas decisivas e mudar de rumo com certa urgência e isto causa ansiedade. Causa também confusão. A mais comum é achar que ciclovias vão resolver o problema do trânsito e das cidades, fazendo com que mais pessoas adotem a bicicleta como meio de transporte. Ciclovias são apenas parte da solução.

Por que há pouco uso de bicicletas nas grandes cidades brasileiras? Identificamos três causas:

  1. insegurança no trânsito;
  2. falta de infra-estrutura;
  3. por resistência pessoal.

As ciclovias solucionam a falta de segurança e de infra-estrutura, mas apenas em parte. Para melhorar a segurança, por exemplo, é preciso também educação, fiscalização e punição.

Da mesma forma, pouco adianta construir vias exclusivas para bicicletas se não há bicicletários adequados e seguros para estacioná-las no local de destino.

Ciclovias pensadas fora de um planejamento cicloviário são apenas vias de lazer ou esporte e vão contribuir minimamente para melhorar o trânsito engarrafado das metrópoles. Pior que isto, se mal planejadas, mal construídas ou mal conservadas – vício comum em nosso país – podem até aumentar o número de acidentes envolvendo bicicletas.

Incrementar o uso da bicicleta pode reduzir o uso excessivo de automóveis, com isto minimizar o efeito estufa e diminuir problemas urbanos como sedentarismo, estresse, engarrafamentos e sobretudo uso das verbas públicas para beneficiar apenas uma classe, os donos de carros. Mas para fazer crescer o uso da bicicleta é preciso atuar em frentes distintas.

Além de pressionar os governos para aumentarem a infra-estrutura cicloviária, temos que fortalecer ainda mais as campanhas educativas e de conscientização. Com elas, podemos reduzir a violência, abrandar a discriminação social contra os biciclistas e enfraquecer o preconceito contra a bicicleta até reduzi-lo a zero. Com ações diretas, como a Bicicletada, o Dia 22 de Setembro e as Vagas Vivas podemos atuar diretamente junto às pessoas que são até simpáticas à bicicleta, mas na prática, oprimidas pela automovelcracia, demonstram resistência ao uso da bicicleta como veículo de transporte no dia-a-dia para ir e voltar ao trabalho, escola, compras.

Todas estas idéias estão estruturadas no diagrama “Uso da Bicicleta: árvore do problema“, disponível na página da Transporte Ativo.

O conceito de árvore do problema é uma metodologia simplificada de planejamento estratégico situacional que identifica um problema e relaciona suas causas e efeitos em um fluxograma, de forma a mapear os pontos críticos onde se deve atuar para solucionar o problema com o menor esforço e o melhor resultado possível.

O documento está aberto à discussão, críticas e melhorias. Pode ser usado e copiado, citando-se a fonte.

  • Mais

> The Bikeway Controversy – John Forrester
> What about striped bike lanes?
> Cycle Facility of the Month

10 thoughts on “O dilema das ciclovias

  1. Prezado Denir,

    Importantíssimo este pequeno artigo que comenta que de nada adianta
    implantar ciclovias se não há segurança e existe resistência ao uso
    das magrelas simultaneamente.
    No entanto, devemos ter um pouco de cuidado na divulgação deste tipo
    de artigo para técnicos e engenheiros nas prefeituras. Isto porque em
    nenhum país do mundo estas três ações ocorreram concomitantemente.
    Digo isto porque (não querendo puxar a brasa para o meu lado de
    projetista) somente com o incremento da infra-estrutura cicloviária,
    os movimentos pró-bicicleta nos países europeus conseguiram com que o
    Estado implementasse campanhas ciclísticas e ampliassem a oferta de
    bicicletários.
    Ou seja, a ciclovia deve vir primeiro, sempre. Mesmo que no início
    seja somente para lazer.
    Veja que no Rio, agora, somente agora, algumas empresas e órgãos
    estão atentos para a necessidade de oferecerem bicicletários seguros.
    E algumas reportagens timidamente passaram a educar a população das
    vantagens do uso das bicis.
    Outro exemplo foram as prefeituras holandesas. Nos anos 70 e 80,
    estas deram início (num processo que levou pelo menos 20 anos) a
    implantação de mais de 15 mil km de ciclorotas (ciclovias,
    ciclofaixas, vias compartilhadas com traffic calming, etc). Alguns
    anos após o início das primeiras redes, vieram as campanhas pró-
    bicicleta do Governo e, posteriormente, o incentivo aos bicicletários
    e a integração com o sistema de transporte coletivo (ônibus e trem).
    Agora, por exemplo, em Amsterdam (se não me engano) a Prefeitura está
    implantando um mega-bicicletário na estação central da cidade para
    milhares de bicicletas. Isto quase 30 anos após o início da
    construção do sistema cicloviário.
    Este tipo de artigo cai como uma luva para a desculpa dos engenherios
    e técnicos das Prefeituras Brasileiras dizerem:

    “Viu, olha só! Implantar ciclovias não basta. Tem que fazer as três
    coisas ao mesmo tempo. E como apenas construímos ciclovias, não temos
    controle sobre as campanhas e os empresários não têm interesse em
    implantar bicicletários. Portanto, é melhor não construir as
    ciclovias sob o risco de colocarmos os ciclistas em apuros.”

    E, para que se consiga implantar estas três ações simultaneamente
    (sistema cicloviário, bicicletários e incentivo ao pedalar) é preciso
    ter um Estado muito forte. Porém, na minha opinião não pessimista
    porém realista, os órgãos públicos brasileiros encontram-se longe
    disso.

    Acho que nossas ações devem trabalhar todas estas questões, mas
    considero fundamental que o foco principal deva ser primeiramente a
    implantação de sistemas cicloviários seguros em todas as cidades
    brasileiras.
    Por isto a ONG que participo é pró-Ciclovias. Consideramos que este é
    o primeiro passo para que possamos focar posteriormente as ações
    cicloativistas na educação cicloviária e nos bicicletários seguros.

    Portanto, reescrevo o título desta mensagem.
    Ao invés de:
    Cicloproblemas – só ciclovia não resolve

    Para:
    Ciclosoluções – só ciclovia não resolve, mas é o primeiro passo,
    fundamental para a ciclocidadania

    Saudações Cicloviárias
    Fabrício
    http://www.abciclovias.com.br

  2. Cicloamigos, concluindo pondero algumas questões:
    1) Infelizmente temos somente políticas de mobilidade a curto prazo pró-automobilistas, pois são as que dão mais resultados imediatos. Vide inauguração de alças, viadutos e vias expressas que empurram o problema da mobilidade com a barriga por 4 ou 5 anos (concidência com um mandado?);
    2) Temos uma geração de automobilistas (não de motoristas) guiados pelo “Vai Airton! Airton! Airton Senna do Brasillll!!!”, catequizados por uma propaganda da indústria automobilística que evoca a potência, velocidade, desempenho em curvas, cavalos-de-pau e derrapagens, conforme comerciais;
    3) Esta geração no nosso país, a curto e médio prazo, ou aproximadamente em menos de uma geração (mínimo de 20 anos) dificilmente será convertida de uma hora para outra. Isto até pode ser possível, mas não acredito com os nossos legisladores, leis e judiciário. 4) Também vejo de certa forma negativa a construção de ciclovias, pois a segregação provoca muito mais discriminação e tende a criar nos motoristas um desejo de propriedade exclusiva sobre as ruas (onde a rua é só para o carro e a ciclovia só para o ciclista).

    Mas as questões técnicas são as seguintes:
    1) Uma Rede Cicloviária pode conter tráfego compartilhado (com traffic calming ou woonerf na solução ideal), ciclofaixa (mão única em vias coletoras e mão dupla em locais), passeio compartilhado, passeio separado, ciclovia na calçada, ciclovia efetiva ou vias verdes. É praticamente impossível construir uma rede cicloviária composta exclusivamente por ciclovias (digo quase impossível porque em alguns casos raros pode-se projetar uma cidade assim, mas praticamente não faz sentido)
    2) Numa rede cicloviária as ciclovias são necessárias apenas nas Vias Arteriais (vel. máx. 60km/h) e Vias Expressas (vel. máx. 80km/h). Nestes tipos de via não é possível o compartilhamento com segurança, pois de nada adianta a via ser projetada como expressa se os motorizados tiverem que trafegar a 30km/h ou 40km/h. É desperdício de dinheiro público. No caso de não haver outra rota curta possível para interligar dois pontos importantes no tecido urbano e a via expressa for o caminho mais curto, a ciclovia adapta-se apenas neste caso.

    3) O cidadão brasileiro tem medo de pedalar. E com razão: fomos explusos das ruas. Somente nós corajosos é que pedalamos (eu pedalo quase todo dia 9km ida e volta para o escritório por uma via arterial, velocidade média 60km/h, sem acostamento, pista bidirecional com 10m largura com tráfego de ônibus troncais e caminhões). Na minha opinião, por mais que o Poder Público das médias e grandes cidades brasileiras lance campanhas pró-bicicleta sem construir nada de estrutura, será um tiro no escuro. Com a nossa cultura automobilista, a cultura política imediatista isto na prática é impossível.
    É preciso, portanto, que um pequeno trecho de ciclovia seja uma espécie de pontapé inicial para a mobilidade cicloviária (uma espécie de garoto-propaganda pró-bicicleta), acompanhada de campanhas maciças de conscientização dos motoristas. Daí, conseqüentemente, passam-se a montar as rotas cicloviárias, que serão os trechos compartilhados devidamente sinalizados, passeios compartilhados e ciclofaixas que interligarão este pequeno trecho cicloviário formando uma grande rede cicloviária.

    Com isso, quebra-se aquele “gelo” que existe hoje no imaginário popular de que erroneamente a bicicleta é perigosa e que pedalar compartilhando o tráfego motorizado é coisa de maluco. A ciclovia somente passa a ser construída efetivamente quando da sua necessidade (vias expressas), onde não houver a possiblidade de compartilhamento com segurança e onde não houver outra possibilidade técnica (espaço e trajetos curtos alternativos) para isso.
    Por exemplo: num bairro contendo uma linha de desejo, com duas alternativas de projeto: um caminho em via arterial de 2,3km e outro paralelo em via local em 2,9km, é óbvio que prevalecerá a segunda alternativa, pois bastam apenas obras com ilhas de segurança nos cruzamentos e o restante do trecho na via local é compartilhado (apenas sinalização com placas e pintura no máximo). Essa, superficialmente, é a metodologia de montagem da rota cicloviária, que por sua vez agrupadas, constiruirão micro-redes, que por sua vez agrupadas, constituirá a rede cicloviária. A ciclovia vem a calhar em casos excepcionais.

    Mas no nosso país ainda acredito que a ciclovia (nem que apenas 1km inicial acompanhada de forte propaganda), seja o pontapé inicial para a mobilidade cicloviária compartilhada efetiva no nosso país.

    É isso. Um grande abraço

    Saudações cicloviárias
    Fabrício

  3. Olá meu nome é Sabrina Rau, sou estudante de Arquitetura e Urbanismo da universidade UFPel ( Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil). Estou començando uma pesquisa sobre os modelos se sistemas cicloviários, gostaria de contar com sua colaboração. Se tiver algum material disponível(fotos, textos e cartazes) por favor me envie por e-mail: sasarau@yahoo.com.br

    Obrigada
    Sabrina Rau

  4. Gente estou desenvolvendo um trabalho sobre ciclovias,preciso de fotos e bons conteúdos como esse para implementação do trabalho.

    desde já agradeço e tenham uma ótima semana

  5. oi estou reunindi dados para montar meu ttc sobre a necessidade da construcao de uma ciclovia no norte da ilha de Santa catariana , na cidade de Florianopolis. toda colaboração sera bem vinda.
    Certa de sua atenção.
    Obrigada

  6. Parabéns, Fabricio, pelo seu “comment”. É de pessoas ponderadas e inteligentes como vc que precisávamos lá no topo da cadeia do poder público. Infelizmente, como vc bem descreve é uma mudança de atitude que passa não só pela população em geral mas pela cabeça dos governantes e aí fica complicado de esperarmos resultados a curto prazo.

    Se vc disse que na Holanda passaram-se 15, 20 anos até colherem os frutos imagina aqui no Brasil, no atraso político em que nos encontramos, perdidos nas sessões de CPI e farras de locupletação de cargos em que estamos, só para citar o Congresso Nacional, que deveria ser o “espelho da nação” em termos de política. Não temos tempo, nem massa crítica para discutir assuntos de relevância para o povo, se nem mesmo conseguimos limpar a casa legislativa.

    Enquanto isto, vamos perseguir lutando no Terceiro Setor por ações mais individualizadas ou setorizadas para abrir um espaço aqui e ali. Eu vejo como vc: a ciclovia é sim o caminho inicial, claro que depois virão os bicicletários, o incentivo para pedalar como meio ativo de transporte. Mas não podemos deixar morrer a idéia de que tudo começa nela. Traz mais segurança para os que iniciam no movimento do pedal por estas nossas ruas inteiramente entregues ao frenesi dos carros potentes e motoristas inconsequentes. Aquele que pedala somente aos fins de semana, acaba “tomando o gostinho” e desenvolve a semente de usar a magrela também na sua extensão dos dias de semana.

    Vou passar a também divulgar o seu trabalho, através do site e no que mais eu puder colaborar por aqui do RJ.

    Abraço.

  7. Parabéns pela matéria/coluna. Você comunica-se maravilhosamente bem de forma escrita. Idéias claras e objetivas de forma simples. Bom nível dos comentários e do blog. Leio periodicamente seu Blog e realmente esta é um de seus melhores assuntos abordados. Atenciosamente

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