Uma ciclovia para abrir novas avenidas

São Paulo, 28/06/2015 - Inauguração da ciclovia da Av. Paulista. Foto: André Tambucci / Fotos Públicas

São Paulo, 28/06/2015 – Inauguração da ciclovia da Av. Paulista. Foto: André Tambucci / Fotos Públicas

A Avenida Paulista é a melhor ágora que sobrevive em São Paulo. Todo movimento político e toda discussão que diz respeito a polis tem de passar por lá ou tem no vão do MASP seu epicentro.

Torna-se óbvio que a praça do ciclista tenha sido disputada e ganha pelo movimento cicloativista para que a bicicleta ganhasse espaço na cidade. Mas a inauguração da mais paulista das ciclovias foi mais que vitória de um grupo ativista ou de aficcionados pelas pedaladas. Foi retomada do espaço público, foi mais uma porteira que se abriu em prol de uma cidade para pessoas.

Aos que estão empenhados em mais bicicletas na cidade há décadas, foi o coroamento de um sonho; os que pedalam há apenas alguns anos, foi o incentivo para que se mantenha a cadência; para quem acabou de descobrir os pedais foi deslumbramento.

Já para quem tem dúvidas sobre o que uma cidade para pessoas significa, foi um manual completo de introdução a uma cidade melhor.

São Paulo, 28/06/2015 - Inauguração da ciclovia da Av. Paulista. Foto: André Tambucci / Fotos Públicas

São Paulo, 28/06/2015 – Inauguração da ciclovia da Av. Paulista. Foto: André Tambucci / Fotos Públicas

O comércio não conseguiu atender a demanda, a alegria transbordou em lágrimas e sorrisos e o asfalto conheceu o silêncio, as conversas sem gritos e o ar limpo.

Política pública da melhor qualidade é a que parte da sociedade civil organizada, é encampada pelo poder público e transforma a realidade. Sempre foi essa a intenção da massa crítica de São Paulo, nascida em 29 de junho de 2002. A reação em cadeia que pessoas em bicicleta quiseram iniciar 13 anos atrás, depois de muitos catalisadores agora está agindo de maneira quase espontânea.

O cicloativismo ainda não chegou ao ponto de ser desnecessário, mas a cada pedalada é possível enxergar mais perto o fim do movimento que se tornará extinguirá quando for incorporado por toda a sociedade.

Pedalemos. As cidades ainda não mudaram, mas cada vez mais pessoas em mais bicicletas mais vezes irão realizar utopias.

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Ocupando o símbolo de São Paulo

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A mais paulista das ciclovias

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Inaugura-se a mais visível das ciclovias nesse dia 28 de junho de 2015. É a que passa na praça do Ciclista e leva até o Paraíso. Sem parênteses, sem “mas”. É concreto pigmentado assentado e sinalizado para que pessoas possam optar pela bicicleta na mais paulista das avenidas.

7 razões por que a ciclovia da Avenida Paulista é tão especial:

  1. é vitória de quem promove a bicicleta;
  2. é homenagem aos que perderam a vida pedalando;
  3. é o reconhecimento da praça do Ciclista;
  4. é o reconhecimento aos que fazem e fizeram parte da bicicletada;
  5. é um incentivo para quem já pedala e quer pedalar;
  6. é uma pedalada fundamental na via com mais de 1,5 milhão de pedestres;
  7. será um novo cartão postal (com bicicletas passando).

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Como em todas as cidades que buscaram implementar uma política cicloviária, houveram resistências. O discurso em geral passa pelo “sou a favor de bicicletas, mas (…)” e logo a disputa se partidarizou. Mas objetivamente quando o Ministério Público buscou barrar implantação (tão aguardada) de vias para a bicicleta, cerca de 7 mil pessoas ganharam as ruas e aí tudo mudou de figura. Deixou de ser partidários das letras XYZ vs ZYX, tornou-se uma defesa em favor da bicicleta.

Os avanços nas conquistas para quem pedala em São Paulo ainda tem de continuar e precisam seguir na próxima administração, seja qual for a cor do partido do prefeito. Ainda está em disputa a narrativa de a quem pertence a bicicleta, mas cada vez mais ela está com as pessoas e não com o alcaide da vez.

São Paulo ainda não se transformou, mas as pessoas estão mudando. Mudam suas realidades ao pedalarem e mudam seus sonhos de cidade.

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Sobre cidades, combates e aprendizado – Bikes vs Carros

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Todo aprendizado é coletivo, mais de que uma transmissão de conhecimento, aprendemos por meio das trocas sociais. Em geral a mediação é feita por professores, mas também é possível ensinar por meio de imagens em movimento. Há riqueza de informações nos filmes, ainda assim, o conhecimento só se alastra nas interações humanas.

Promover o debate que transforma as cidades é a ambição do documentário Bikes vs. Carros do diretor sueco Frederik Gertten. Filmado ao redor do mundo e com São Paulo como cidade de destaque, o documentário pedala por novos e antigos caminhos.

O título denuncia o conflito de planejamento urbano em curso mundo afora. Ao explicitar a rivalidade entre dois veículos de transporte individual, o título do filme traz uma abordagem negativa em relação as dinâmicas urbanas. Acaba remetendo ao protesto e denuncismo. Felizmente, a história e seus personagens são mais leves e com uma postura em geral menos belicosa.

Em pouco mais de uma hora de projeção, é possível ter uma panorama geral de como as cidades ao longo do século XX se tornaram espaços de circulação automotiva e como atualmente essa situação está mudando. Os ciclistas são personagens fundamentais desse redesenho urbano pela reflexão que a bicicleta propicia aos ciclista, mas principalmente pela comunidade que se forma para garantir melhores condições para quem pedala em ambientes urbanos hostis.

Para o diretor, São Paulo é a cidade que ainda tem escolhas, Los Angeles é a urbe refém do rodoviarismo e Copenhague o paraíso das bicicletas. Através dessas 3 realidades é que se constrói o eixo narrativo do filme. Primeiro o problema da (i)mobilidade urbana que atualmente parece um problema sem solução, as imagens e personagens levam o espectador à beira do desespero. Mas assim como em uma aventura em desenho animado, após a mais difícil das situações há o renascimento da esperança que atinge o ápice na conclusão da história.

Cidades são obras inconclusas e ao retratar um panorama de como elas se organizam e reorganizam, Bikes Vs. Carros mostra o papel fundamental de indivíduos e grupos engajados socialmente que pedalam rumo a inatingível utopia urbana. Ao olhar para frente e seguir pedalando, cada pessoa em bicicleta é força motriz que primeiro sonha, mas que a cada evolução do pedal, realiza mudanças fundamentais. Uma ciclofaixa na rua e as cidades não estão mais no mesmo lugar.

O filme Bikes vs Carros estreou em 18 de junho de 2015 nos cinemas do Rio de Janeiro de São Paulo. A estréia em outras capitais brasileiras será no dia 25/06. Acompanhe o calendário de exibições na Maria Farinha Filmes (distribuidora no Brasil). Saiba como organizar uma exibição pública do filme na plataforma VIDEOCAMP.

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Bicicletas e ciclovias, da sala de aula para a rua

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Reunião entre técnicos da prefeitura e estudantes, promovida pela TA  – foto de 2011.

O esforço para trazer mais bicicletas para as ruas das Laranjeiras e Cosme Velho começou na sala de aula, com estudantes que fizeram o planejamento cicloviário da região para um trabalho acadêmico da escola.

Alunos de 15 e 16 anos, do 1º e 2º ano do Ensino Médio do Liceu Franco-Brasileiro, resolveram ir além da insatisfação com o trânsito e buscar uma solução. No fim de 2010, o grupo Franco Droid, formado na turma de Robótica do colégio, criou um projeto de ciclovia para a região de Catete, Largo do Machado, Laranjeiras e Flamengo.

Além de apresentar o trabalho na Noruega, o resultado foi apresentado à prefeitura. Na sequência, a comunidade se mobilizou para aferir o fluxo de ciclistas e com apoio popular e um plano esboçado, era hora do poder público agir.

Aos poucos o resultado do que começou nos bancos escolares começa a aparecer.

Tal como o óleo da corrente da bicicleta, a sociedade civil contribuiu para que o movimento seguisse mais macio. Por hora são as ruas que serão retomadas para as pessoas, mas nada impede imaginar e planejar para que também os rios possam correr livres e limpos pelos espaços que lhes foram suprimidos.

O rio Carioca desce do maciço da Tijuca até a praia do Flamengo serpeteando pelo Cosme Velho e as Laranjeiras. As águas hoje poluídas que deram nome à população do Rio de Janeiro estão em grande parte submersas, mas a fluidez hidrográfica ainda pode se sentir nas curvas do asfalto que passam por cima da canalização.

Ainda falta um longo caminho para devolver à cidade a beleza de seu mais famoso curso d´água, mas ao menos o sinuoso aclive que liga o mar à montanha já começa a contar com uma malha cicloviária para permitir que flua mais gente pelas ruas.

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Vaga viva, do ativismo à política pública

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Parklet em sorveteria paulistana

 

A prefeitura do Rio de Janeiro anunciou em 13 de abril de 2015 a criação da “Parada Carioca”. Trata-se basicamente de um programa que concede uma licença renovável de instalação para uma vaga viva permanente.

Instalar no espaço público de estacionamento nas vias um espaço de convivência é uma idéia que nasceu na Califórnia como intervenção artística, chegou no Brasil em 2006, se espalhou pelo país e agora ganha contornos definitivos. São Paulo já autorizou a criação de “parklets” (nome original em inglês), Fortaleza também tem iniciativa similar e agora é a vez dos cariocas de poderem requalificar o espaço público adjacente às calçadas.

História das vagas vivas

Era preciso acordar cedo, reservar um espaço, trazer móveis, grama artificial, armar um bicicletário. Era necessário também obter uma autorização junto à prefeitura e também fazer uma política de boa vizinhança junto ao guardador de carro responsável pela área. Tudo isso para apenas um dia em que no lugar de dois ou três carros estacionados haveria um pequeno espaço de convivência.

A comparação para quem frequentava a área era sempre marcante. Ao invés de um espaço intransponível com veículos grudados uns aos outros, sem espaço para atravessar a rua, havia a possibilidade de fluxo livre e pausa para descansar.

Crianças, bicicletas e cães

Crianças, bicicletas e cães

Desafios futuros para o uso do espaço público

Quando uma iniciativa artesanal, feita por pessoas apaixonadas por uma causa vira política pública surgem alguns desafios. A criatividade torna-se mais necessária para provocar reflexão e mudança de comportamento. Além disso, o espaço para o estacionamento em via pública ainda segue em disputa. Já é cada dia mais fácil visualizar uma cidade com mais locais para pessoas, o desafio passa a ser o de reconquistar de maneira permanente espaços urbanos adequados ao fluxo, descanso e interação humanos.

Duas novas disputas estão postas. Quem instala um vaga viva permanente (ou parklet, ou parada carioca) em frente ao seu estabelecimento comercial ganha um diferencial de atração e induz uma mudança na comunidade ao redor. O ativismo com isso deixa de ser necessário no aspecto imediato, mas torna-se ainda mais urgente para catalizar mudanças permanentes.

Um manual para ocupar o espaço público

Para as cidades que ainda não tem a regulamentação para vagas vivas permanentes, é possível consultar o manual de como fazer uma vaga viva (PDF), trabalho conjunto da Transporte Ativo com o blog Quintal. Trata-se de uma adaptação para o Brasil do original em inglês.

Sigamos em frente por mais pessoas, em mais e melhores espaços públicos, mais vezes.

Saiba mais:

– Vagas vivas cariocas para lembrar… 2007, 2008 e 2012

Prefeitura do Rio cria programa Paradas Cariocas – site da prefeitura

– Espaços públicos como políticas públicas – Quintal