Bicicleta na política nacional

Presidenta Dilma Rousseff recebe representantes de Movimentos Urbanos. (Brasília - DF, 25/06/2013) Foto: Roberto Stuckert Filho/PR

Presidenta Dilma Rousseff recebe representantes de Movimentos Urbanos. (Brasília – DF, 25/06/2013)
Foto: Roberto Stuckert Filho/PR

Nesta hora em que todo mundo apresenta pautas de reivindicações – mas poucos apresentam soluções – como poderíamos ajudar na construção de um futuro melhor para as bicicletas no país?

Está mais do que claro que a maior parte das soluções é local. São os governos das cidades que precisam adotar políticas públicas adequadas, cotidianas, pois, afinal, são eles que atuam diretamente na realidade, a micropolítica.

Aos governos estaduais e federal caberiam políticas mais amplas, macropolíticas, criar condições econômicas, políticas, técnicas e gerenciais que permitam ou possibilitem às prefeituras adotarem as medidas práticas necessárias.

Assim, sete boas sugestões para a presidente seriam:

  • desonerar o custo da cadeia produtiva da bicicleta;
  • desonerar a importação;
  • incentivar o cicloturismo – por meio de programas específicos e aprovando a lei que permite o transporte de bicicletas em ônibus (que está arquivada);
  • inserir a mobilidade urbana como matéria obrigatória, ainda que transversal, no currículum do ensino fundamental e médio;
  • fortalecer a Secretaria de Mobilidade Urbana do Ministério da Cidade;
  • Colocar o Programa Bicicleta Brasil como item básico do subeixo Mobilidade Urbana, integrante do eixo Cidade Melhor (a construção de ciclovias e outras estruturas, a oferta de cursos de aperfeiçoamento, etc, tudo pode incentivar economia locais que, no somatório de todo território nacional, teriam significado expressivo para a acelaração do crescimento, mas em bases sustentáveis);
  • colocar no CONTRAN um representante dos pedestres/usuários de ônibus e um representante dos ciclistas.

Leia mais: Dilma recebe movimentos sociais urbanos em reação às manifestações – Folha de S. Paulo

Mais espaço para pedestres

Aos poucos Brasília pode deixar de ser apenas uma “cidade feita para carros”. Embora historicamente a mobilidade seja tratada com alargamento de vias e construção de viadutos, há sinais de que alguma coisa está mudando na cidade.

Estão acontecendo obras de melhorias para os pedestres em pleno Setor Comercial Sul, área crítica sempre citada na mídia pela falta de vagas e carros estacionados sobre calçadas. Nestas obras, que inclui ampliação das calçadas, estão sendo tomadas vagas de carros!

revitalização de calçada no SCS - Brasília
A foto mostra um calçada sendo construída próximo ao Hospital de Base. Foram tomadas pelo menos 10 vagas de carros, num local onde a procura por espaço chega a virar discussão raivosa entre motoristas.

revitalização de calçada - SCS
Esta outra foto mostra uma calçada com cerca de 50 metros, onde antes só havia estacionamento. Foram eliminadas no mínimo 20 vagas para dar mais espaço ao pedestre. E não é só: a calçada terá piso tátil, canteiros e árvores.

Em todo Setor Comercial Sul, calçadas e áreas de pedestres estão sendo revitalizadas, com alargamento, nova concretagem e instalação de piso tátil e rebaixamentos. Estas duas últimas características leva-nos a crer que a CPA está envolvida nestas melhorias.

A Comissão Permanente de Acessibilidade (CPA) é um órgão vinculado a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (Seduma) e tem por finalidade acompanhar o desenvolvimento do Programa de Governo “Acessibilidade: Direito de Todos”.

Cada metro destinado ao pedestre torna a cidade melhor. Ainda falta muito. Uma sucessão de equívocos levou a cidade ao caos, a ponto de um administrador admitir que “a cidade hoje está escondida atrás dos carros”.

Mas sempre é o momento de recomeçar, de refazer, de mudar a direção e pensar no futuro que se faz hoje. A semente da mudança pode estar em uma única pessoa, num único órgão; mas se germinar com vigor, vira árvore e floresta.

Construir, a parte fácil

Brasília foi desenhada na prancheta, fruto da mente criativa de Lúcio Costa e seu “plano piloto”. Mas tão rígida nos planos, a nova capital federal não levou em conta o erro, o tempo e as incertezas. Todas as cidades não planejadas do mundo contém o erro ao longo de muitos anos e Brasília só teve 50 anos de interferências humanas não previstas.

Nem mesmo o mais “planificado planejamento” foi capaz de prever que ao invés de 500.000 a cidade fosse ter 2 milhões e 600 mil habitantes. Cercada de invasões e habitações informais das cidades satélites, Brasília reforça a distância física entre moradia e emprego, entre ricos e pobres. Niemeyer foi gênio da poesia com concreto, mas uma cidade não pode contar apenas com aço, asfalto, cimento e cabos de força.

A nossa capital federal, só é mesmo cidade por suas pessoas que garantem que toda a beleza e inovação arquitetônica dos traços de Niemeyer permaneçam firmes e bem cuidados. As rodovias que ligam a cidade e amplitude do horizonte do planalto central garantem a beleza da cidade construída, mas o desafio é garantir que esse espaço possa ser para as pessoas.

Cada superquadra é um pouco uma célula urbana quase autosuficiente, com comércio e moradia. No entanto a mesma amplitude que fascina o visitante é a que desincentiva a caminhada e a presença das pessoas nas ruas. A compartimentalização nunca fez bem as cidades, como diagnosticou Jane Jacobs.

Mesmo as vias expressas que funcionam como rodovias não foram capazes de abrigar o fluxo sempre crescente de veículos motorizados particulares e a cidade que nasceu sem semáforos hoje já convive com o malfafado congestionamento motorizado. Sinal do triunfo da mobilidade individual sobre o transporte coletivo, grande falha da capital federal.

Apesar de tudo, Brasília é o reflexo de um Brasil do passado que mirou longe rumo ao futuro. Não foi erro crasso, nem retumbante sucesso. Foi apenas um rascunho que virou maquete que ergueu-se em meio a poeira do cerrado para ser o símbolo de um Brasil que queria ir além do litoral atlântico, onde ainda vive a maioria absoluta dos brasileiros. Acabou sendo apenas uma cidade brasileira diferente e igual a todas as outras e marcadamente fruto de um tempo histórico em que o homem acreditava-se maestro do mundo.

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O trânsito é um sistema complexo, que não se resume a conceitos bidimensionais simples como tempo de deslocamento, fluxo de veículos (quantidade/tempo) e espaço para vagas.

É preciso considerar questões subjetivas como atratividade, conforto, beleza, principalmente quando se fala em calçadas e espaço para pedestres.

Andar a pé vai muito além do tempo gasto no percurso, pois caminhar é o encontro mais direto entre as pessoas e o espaço público, entre nós e a cidade que nos abriga e condiciona nossa existência.

Para o pedestre, o tempo gasto num trajeto geralmente não muda, caminhar não causa engarrafamento. As distâncias geralmente não se encurtam, pois, embora digam que o pedestre tem um trajeto “errante”, na verdade ele escolhe o caminho mais curto e aprazível dentro das possibilidades. Ao contrário dos carros em canaletas pré-estabelecidas, o andar do pedestre é um sistema complexo feito de decisões simples tomadas a cada segundo.

Por isto, é fundamental que políticas de trânsito considerem questões que não são medidas com réguas ou relógio. Além de levar de um lugar a outro, calçadas precisam ser agradáveis e convidativas. Queremos andar num lugar bonito.

Infelizmente, isto tem sido rotineiramente negligenciado nas políticas urbanas brasileiras. A culpa não é só dos motoristas que usam a calçada como estacionamento. O poder publico cuida mal das calçadas, que são mal construídas e mal conservadas, quando existem. A iniciativa privada por vezes usa as calçadas como espaço privado, mas por tradição não considera que também deveria cuidar delas. Se todos fizessemos nossa parte, a cidade seria melhor.

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Com bicicletas em ônibus

Em muitos países do mundo, destacando Europa e Estados Unidos, o cicloturismo é uma atividade consolidada há muitas décadas. Aqui no Brasil, seguindo a tendência mundial, o cicloturismo tem conquistado cada vez mais adeptos e se populariza de forma cada vez mais rápida. A Estrada Real e o Circuito Vale Europeu, ambos com apoio do Governo Federal e dos governos de Minas Gerais e Santa Catarina, respectivamente, e da iniciativa privada, mostram que o cicloturismo no Brasil encontra-se em estágio de amadurecimento.

Pesquisa realizada pelo Clube de Cicloturismo em 2008 mostra que 40% dos cicloturistas utiliza o ônibus como transporte complementar durante suas viagens de bicicleta. Para o cicloturismo avançar ainda mais em nosso pais, com valorização e respeito ao turista de bicicleta, alguns entraves precisam ser eliminados, e o transporte da bicicleta em ônibus é um destes empecilhos.

A legislação brasileira é confusa no que diz respeito ao transporte de bicicletas em ônibus intermunicipais e interestaduais. Há um entendimento de que a bicicleta não se enquadra na definição de bagagem pessoal, só podendo ser embarcada nos ônibus como encomenda. Mas o embarque como encomenda somente pode ser realizado se “devidamente acompanhado de documentação fiscal”. Esta exigência choca-se com o Código de Trânsito, que não obriga o ciclista a andar com a nota fiscal de sua bicicleta.

O resultado deste emaranhado jurídico é que, na prática, cada empresa de transporte decide arbitrariamente o que fazer. O problema é tão grave que são conhecidos casos de ciclistas que foram proibidos de embarcar para viajar, pois a empresa de ônibus não aceitou o embarque da bicicleta nem como objeto pessoal nem como encomenda (por não haver nota fiscal).

Para solucionar o problema, o Clube de Cicloturismo do Brasil, em parceria com a Transporte Ativo, ajudou a elaborar o Projeto de Lei 6824/2010, que foi apresentado no início deste ano pelo Deputado Federal Rodrigo Rollemberg (PSB-DF). O projeto já está sendo analisado na Câmara dos Deputados pelas Comissões de Viação e Transportes e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Para ver o Projeto de Lei na íntegra e acompanhar seu andamento, acesse a página da Câmara dos Deputados.