
Por Juliana DeCastro
Desde 2013, a Transporte Ativo (TA) promove uma série de workshops com um objetivo claro: fortalecer o ecossistema de organizações pró-bicicleta no Brasil. Essa jornada de troca de conhecimento e capacitação é um pilar do trabalho da TA, permitindo aprendizado, capacitação e construções de rede para a promoção da mobilidade ativa. A partir de 2015, iniciam-se os workshop dedicados a Pesquisa Perfil do Ciclista, e para que esse ciclo de aprimoramento continue girando, é essencial buscar referências e validar nosso trabalho no cenário internacional, dialogando com quem está na vanguarda da pesquisa e da ação em ciclomobilidade.
É nesse espírito de troca que, entre os dias 10 e 12 de setembro, estivemos em Amsterdam para participar do Cycling Research Board Annual Meeting (CRBAM) 2025. Mais do que uma simples conferência, o CRBAM é um ponto de encontro da comunidade global de pesquisadores, ativistas e planejadores, organizado pelo renomado Urban Cycling Institute. No melhor palco: Amsterdam, a cidade que respira bicicleta, além de um laboratório perfeito para aprofundar nossas discussões, reconhecermos que não há ausência de conflitos, seja com o incremento da frota de e-bikes, especialmente entre os jovens, com suas Fatbikes “turbinadas” (NLTimes, 2025) que suscitou um debate acalorado no último dia do evento no painel sobre gênero e mobilidade, especialmente quando há um discussão intergeracional sobre comportamentos ou problemas a serem solucionados, mas aprender a fazer escolhas e implementar políticas públicas que busquem beneficiar a coletividade – saiba mais sobre as políticas de mobilidade de Amsterdam aqui.
A programação do evento refletiu sua diversidade, com workshops, painéis e atividades práticas propostas ao ar livre para estimular não apenas a visão, mas a vivência. Confira a programação completa e seus palestrantes.
Programação Resumida – CRBAM, 2025

O CRBAM é, antes de tudo, um espaço para o encontro e a construção de pontes. O evento se destaca por sua atmosfera íntima e colaborativa, guiada pelos princípios “CAMPING” (Criativo, Acessível, Mutável, Prazeroso, Inspirador, Nutritivo e Inovador). A proposta é ir além das apresentações formais, incentivando o debate, a co-criação e ações que realmente impulsionam a mudança. Foi exatamente nesse ambiente que tivemos a oportunidade de posicionar o Brasil e a nossa Pesquisa Perfil do Ciclista no debate global. A foto abaixo é um símbolo que registra um misto de profunda alegria pelos dias de trocas e aprendizados vivenciados por todos os participantes, mas também iniciava-se uma potencial articulação para a realização de uma edição especial do CRBAM 2030 no Brasil, quem sabe?! A próxima edição em 2026 será na cidade de Ghent, a mesma que recebeu o Velo-City 2024 e que vem trabalhando forte para ser uma cidade cada vez mais segura, inclusiva e vibrante com a implementação de uma série de políticas públicas que fomentam a mobilidade sustentável que vem se destacando na Europa (Plano Circulatório de Ghent). Dedos cruzados para essa ideia amadurecer. Afinal, já tivemos uma edição do Velo-city 2018 em terras cariocas…
Interações Transporte Ativo com equipe organizadora do CRBAM 2025 – Crédito Foto: Urban Cycling Institute
Nossa participação no CRBAM não é um fato isolado. Ela se soma a outros fóruns internacionais, como o PATH Symposium 2025, onde também compartilhamos a metodologia e os impactos do Perfil do Ciclista. Desta vez, nossa proposta aprovada foi um workshop de 90 minutos intitulado “Building a Census of Cycling Mobility: Methodology and Impact of the Brazilian Cyclist Profile Research”.
Durante a apresentação da TA sobre a trajetória de uma década da Pesquisa Perfil do Ciclista no CRBAM 2025 – Fotos: Urban Cycling Institute
Seguindo o formato de workshop, nosso objetivo era apresentar além dos dados, como descrevemos em nossa proposta, “promover um diálogo colaborativo”. Discutimos como uma metodologia de ciência cidadã, de baixo custo e alto impacto, pode ajudar a suprir a lacuna de dados sobre mobilidade por bicicleta, uma realidade além do Brasil, mas também em muitas cidades do Sul Global. Apresentamos casos concretos de como a pesquisa influenciou políticas públicas, como o Plano Cicloviário Carioca e o Mapa da Mulher Carioca, e abrimos o debate para que os participantes pensassem em como adaptar o modelo às suas próprias realidades.
O evento ainda oportuniza espaço na programação para vivências nas “Ruas de Amsterdam Outdoor Adventure”. Assim como na conferência EuroVelo 2018, a experiência em campo foi um dos pontos altos. A atividade nos desafiou a analisar a cidade com um olhar curioso de pesquisador de fora, ora como local. Nossa missão nos levou a um dos seus inúmeros cruzamentos vibrantes e complexos no bairro de Amsterdam: a intersecção da Javastraat com a Molukkenstraat e a Javaplein. A intenção era nos levar a reflexões sobre o que ainda pode ser aprimorado, considerando a multimodalidade e o compartilhamento da via pública.

O ponto de análise: o vibrante cruzamento da Javastraat/Molukkenstratt/Javaplein. Explore o local no Google Maps.
Diferente de uma ciclovia segregada, ali vivenciamos uma aula de coexistência. Aquele espaço, compartilhado por um volume altíssimo de ciclistas, pedestres, carros e VLTs (bondes elétricos), funciona com uma fluidez impressionante. Observamos como o desenho urbano, com o uso de pavimentos diferenciados (os klinkers), a ausência de sinalização semafórica excessiva e a priorização do contato visual, acalma o tráfego e induz um comportamento de cuidado mútuo. É a prova de que segurança viária pode ser alcançada não apenas com segregação, mas com um design inteligente que modera velocidades e promove a responsabilidade coletiva.

Encontros, Redes de Afeto e Aprendizado – Acervo pessoal
Voltar para casa após uma imersão como essa é como fechar um ciclo e, imediatamente, iniciar outro. A participação no CRBAM nos encheu de novas referências e reforçou a relevância internacional do que estamos construindo no Brasil. Todo esse conhecimento será agora decantado e compartilhado nos próximos Workshops de Promoção da Mobilidade por Bicicleta que realizaremos no país. Ele irá alimentar a próxima edição da Pesquisa Perfil do Ciclista, nos ajudando a refinar perguntas, aprimorar a metodologia e ampliar nosso impacto. A experiência em Amsterdam nos mostrou que, embora os desafios sejam grandes, estamos no caminho certo. O círculo virtuoso de pesquisar, aplicar, compartilhar e aprender continua a girar, nos impulsionando a seguir na transformação das cidades brasileiras em lugares mais justos, sustentáveis e, claro, mais cicláveis. O trabalho continua, e agora, com a bagagem ainda mais cheia.
Realização da Pesquisa Perfil Ciclista conta com patrocínio do Banco Itaú e a viagem foram realizadas com verba do Prêmio Bicicleta Brasil 2024.


















