A mais paulista das ciclovias

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Inaugura-se a mais visível das ciclovias nesse dia 28 de junho de 2015. É a que passa na praça do Ciclista e leva até o Paraíso. Sem parênteses, sem “mas”. É concreto pigmentado assentado e sinalizado para que pessoas possam optar pela bicicleta na mais paulista das avenidas.

7 razões por que a ciclovia da Avenida Paulista é tão especial:

  1. é vitória de quem promove a bicicleta;
  2. é homenagem aos que perderam a vida pedalando;
  3. é o reconhecimento da praça do Ciclista;
  4. é o reconhecimento aos que fazem e fizeram parte da bicicletada;
  5. é um incentivo para quem já pedala e quer pedalar;
  6. é uma pedalada fundamental na via com mais de 1,5 milhão de pedestres;
  7. será um novo cartão postal (com bicicletas passando).

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Como em todas as cidades que buscaram implementar uma política cicloviária, houveram resistências. O discurso em geral passa pelo “sou a favor de bicicletas, mas (…)” e logo a disputa se partidarizou. Mas objetivamente quando o Ministério Público buscou barrar implantação (tão aguardada) de vias para a bicicleta, cerca de 7 mil pessoas ganharam as ruas e aí tudo mudou de figura. Deixou de ser partidários das letras XYZ vs ZYX, tornou-se uma defesa em favor da bicicleta.

Os avanços nas conquistas para quem pedala em São Paulo ainda tem de continuar e precisam seguir na próxima administração, seja qual for a cor do partido do prefeito. Ainda está em disputa a narrativa de a quem pertence a bicicleta, mas cada vez mais ela está com as pessoas e não com o alcaide da vez.

São Paulo ainda não se transformou, mas as pessoas estão mudando. Mudam suas realidades ao pedalarem e mudam seus sonhos de cidade.

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É preciso celebrar a bicicleta – #BrasilnoVelocity

 

Zoológicos de vontades e movimento, as cidades funcionam de acordo com os desejos de seus cidadãos e os estímulos que recebem. A manutenção de comportamentos, ainda que possam ser coletivamente destrutivos é quase um padrão universal.

Buscar maneiras de celebrar a bicicleta e espalhar as alegrias que ela é capaz foi a ideia por trás do seminário “Celebrate cycling and pass it on” http://www.velo-city2015.com/en/event/celebrate-cycling-pass/ (Celebre a bicicleta e passe adiante) que aconteceu durante o primeiro dia de palestras no Velo-City 2015.

A idéia geral do seminário foi apresentar maneiras com que a bicicleta foi promovida como agente de transformação de comportamento. Com iniciativas em escolas, empresas e para o público em geral, foi possível entender alguns padrões.

Bicicleta, agente de transformação

Existem uma série de medidas suaves para promover o uso da bicicleta é em cada cenário elas têm relevância relativa. Mas em geral sempre se inicia a ação com o envolvimento de voluntários engajados que são agentes de transformação dentro de suas comunidades. Seja um professor que sensibiliza seus alunos, estudantes dentro da sala de aula ou funcionários de uma empresa que promovem de maneira mais direta e pessoal o uso da bicicleta.

Como incentivar o uso da bicicleta nas escolas

Dois exemplos de promoção a mobilidade ativa em escolas foram apresentados, o Pondej Chaowarat, pesquisador da Universidade de Mahasarakham (Tailândia) trouxe exemplos de “medidas suaves de incentivo”. O caso tailandês traz uma grande similaridade com o Brasil, tendo a diferença de renda como um aspecto diferenciador fundamental sobre as escolhas e opções de transporte.

Os impactos da renda familiar nas viagens dos alunos até a escola foram uma constatação fundamental. Em geral são as famílias com maior poder aquisitivo que utilizam o “método helicóptero” de transporte de estudantes, tanto pela disponibilidade dos responsáveis em fazer viagens de carro, quanto as distâncias maiores que os mais ricos cruzam para irem estudar. Escolas frequentadas pelos mais pobres em geral estão inseridas dentro das comunidades, o que implica deslocamentos mais curtos. Além disso, os responsáveis tem menos disponibilidade de tempo e dinheiro para transportarem seus filhos, o que implica que eles pedalem e caminhem mais até a sala de aula.

Um vídeo da prefeitura de Frankfurt na Alemanha faz piada com o desafio a ser enfrentado dentro e fora da Europa.

Na metodologia do “Stars Project”, centrada em escolas, primeiro forma-se um grupo de alunos embaixadores, que se reúne regularmente. Eles fazem uma pesquisa origem destino dentro da comunidade escolar e complexidade é variável, desde alunos que levantam as mãos na sala, até entrevistas mais completas. Concluído o levantamento, os alunos pensam em ações para encorajar os colegas a pedalarem.

Desde tapete vermelho para alunos que pedalam até café da manhã para ciclistas, cada escola inventa sua solução, grandes e pequenos incentivos são fundamentais.

Saiba mais sobre o Stars Project e sua metodologia.

Um desafio para que ciclistas pedalem mais

Desde 2012, realiza-se anualmente o Desafio Ciclístico Europeu (European Cycling Challenge). Durante o mês de maio, cidadãos de cidades européias são incentivados a pedalarem cada vez mais em uma disputa para decidir onde mais se pedala no continente. Elodie Vanpoulle apresentou um panorama direto da cidade de Lille, na França.

Por meio do incentivo para a formação de times, incentiva-se o maior número de pessoas a pedalarem e caminharem mais ao trabalho. A competição é entre cidades européias, mas a participação de pequenos grupos que disputam entre si, traz para a realidade local o desafio continental.

Com o propósito claro de dar vida a um jogo divertido, o Desafio traz como benefício para as cidades que tem bastante participantes um “mapa de calor” dos caminhos mais utilizados pelos ciclistas em seus deslocamentos. Todos os traçados são sobrepostos nas ruas da cidade e as ruas por onde transitaram o maior número de ciclistas durante o mês da ação aparecem mais “aquecidas”.

Durante os primeiros anos, foi utilizado o aplicativo Endomondo, mas atualmente utiliza-se o Cycling 365, desenhado especificamente para o Desafio Ciclístico Europeu e que pode ser utilizado por qualquer pessoa para visualizar seus trajetos.

Planejamento personalizado de viagens

Através do contato direto e o incentivo pessoal uma política de planejamento personalizado de viagens busca fazer com que as que pessoas que já estão propensas a mudarem de comportamento passem a utilizar a bicicleta.

Alex Quayle da “PTP-Cycle – Personalised Travel Planning for Cycling” trouxe exemplos de planejamento de viagens, um tipo de iniciativa que almeja com que distintos públicos modifiquem para melhor seus deslocamentos nas cidades. Na cidade de Antuérpia na Bélgica, uma nova linha de veículos leves sobre trilhos, o popular bonde, foi o impulso oficial para que fosse feito um esforço junto às empresas que funcionavam na área de influência da nova linha.

O trabalho, além de ser segmentado junto às empresas, também levou em consideração as restrições viárias que impactariam o local durante os dois anos de obras e promoveu a bicicleta como a alternativa perfeita.

Dentro de um esforço de marketing, foram distribuídos panfletos explicando as intervenções e oferencendo o planejamento de viagens como uma alternativa. Brindes, mapas, estações de reparo de bicicletas e principalmente um guia de mobilidade adaptado a cada empresa.

Produzido o material, também era necessário treinar um grupo de agentes aptos a seguir a conversa pessoalmente junto ao público que iria efetivamente ser incentivado a mudar suas escolhas de mobilidade. Além de entregar o material promocional produzido, os agentes tinham como missão identificar os “campeões do planejamento de viagens”, isso é, funcionários aptos a espalhar a mensagem dentro das suas organizações.

Como o projeto ainda está em andamento, a fase de avaliação ainda não foi concluída. Mas cada empresa participante tem sua divisão modal avaliada antes e depois da implementação para que o impacto possa ser comparado. Na primeira empresa avaliada, com 462 funcionários, o uso da bicicleta subiu 17%, de 15% para 18% das viagens dos funcionários.

Saiba mais sobre o trabalho da PTP-Cycle.

Bicicletas e ciclovias, da sala de aula para a rua

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Reunião entre técnicos da prefeitura e estudantes, promovida pela TA  – foto de 2011.

O esforço para trazer mais bicicletas para as ruas das Laranjeiras e Cosme Velho começou na sala de aula, com estudantes que fizeram o planejamento cicloviário da região para um trabalho acadêmico da escola.

Alunos de 15 e 16 anos, do 1º e 2º ano do Ensino Médio do Liceu Franco-Brasileiro, resolveram ir além da insatisfação com o trânsito e buscar uma solução. No fim de 2010, o grupo Franco Droid, formado na turma de Robótica do colégio, criou um projeto de ciclovia para a região de Catete, Largo do Machado, Laranjeiras e Flamengo.

Além de apresentar o trabalho na Noruega, o resultado foi apresentado à prefeitura. Na sequência, a comunidade se mobilizou para aferir o fluxo de ciclistas e com apoio popular e um plano esboçado, era hora do poder público agir.

Aos poucos o resultado do que começou nos bancos escolares começa a aparecer.

Tal como o óleo da corrente da bicicleta, a sociedade civil contribuiu para que o movimento seguisse mais macio. Por hora são as ruas que serão retomadas para as pessoas, mas nada impede imaginar e planejar para que também os rios possam correr livres e limpos pelos espaços que lhes foram suprimidos.

O rio Carioca desce do maciço da Tijuca até a praia do Flamengo serpeteando pelo Cosme Velho e as Laranjeiras. As águas hoje poluídas que deram nome à população do Rio de Janeiro estão em grande parte submersas, mas a fluidez hidrográfica ainda pode se sentir nas curvas do asfalto que passam por cima da canalização.

Ainda falta um longo caminho para devolver à cidade a beleza de seu mais famoso curso d´água, mas ao menos o sinuoso aclive que liga o mar à montanha já começa a contar com uma malha cicloviária para permitir que flua mais gente pelas ruas.

Saiba mais:

Proposta para criação de infraestrutura cicloviária no Cosme Velho e Laranjeiras
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#VaiTerCiclovia, mas as ruas continuam em disputa

Cena de uma cidade com mais bicicletas nas ruas.

Cena de uma cidade com mais bicicletas nas ruas.

São Paulo sempre se mostrou locomotiva, mas é a cidade da hegemonia do motor dependente do asfalto. Aqui os trilhos estão aquém do necessário e as ruas e avenidas, 17 mil quilômetros de mobilidade perdida. A promessa, finalmente em curso, de realizar 400 mil metros de oportunidades ciclísticas sofreu um grande ataque jurídico. O planejamento cicloviário paulistano, compromisso de campanha do atual prefeito eleito e de seu adversário derrotado foi questionado na justiça.

Por mais que as críticas e os erros sejam apontados por quem pedalava, passou a pedalar ou quer pedalar, os ciclistas do Brasil e do mundo juntaram-se em uma bicicletada mundial para defender que acima de tudo, ciclovias e ciclofaixas são uma necessidade para o presente e futuro da cidade e que nenhum retrocesso pode ser tolerado na implementação de uma malha cicloviária à altura da maior megalópole da América do Sul.

A conquista por uma praça do Ciclista na cidade de São Paulo foi trabalho de poucos, mas que rendeu frutos. Um espaço perdido, que quase flutua sobre um buraco na avenida Paulista foi primeiro nomeado informalmente, depois oficializado para finalmente ser ponto de aglomeração para protestos das mais variadas frentes. Do espaço onde nasceu o cicloativismo paulistano em 29 de junho de 2002, partiu a histórica e massiva pedalada de 27 de março de 2015. E foi nesse dia que a massa crítica mostrou-se reação em cadeia. O núcleo duro, congregação informal de corações, mentes e almas pulsantes em favor da bicicleta estava presente. Amigos, velhos conhecidos, grupo de cerca de 300 pessoas que manteve e fez crescer ali, na avenida Paulista com a Consolação, uma força local e nacional, orgânica e horizontal em favor de uma paulicéia menos desvairada e mais humanizada.

Protesto com propósito claro, reivindicação coesa e revolta reativa contra as forças do retrocesso, a bicicletada de março de 2015 foi talvez a mais efetiva da história das bicicletadas. Desde 2013 mais propensos à ouvir a voz das ruas, os líderes formais constituídos atenderam à reinvindicação das ruas e enquanto ocorria a pedalada, a ação civil pública pela paralisação das obras do planejamento cicloviário paulistano foi suspensa.

Alegria, festa. Foi esse o tom depois que pipocou aos poucos a notícia de que a expansão da rede mínima de infraestrutura cicloviária em São Paulo iria continuar rumo aos 400km e além. Passaram a ser então 300 amigos, 2.000, 3.000, 5.000 ou até 7.000 pessoas em bicicleta e à pé comemorando que uma cidade mais humana continuaria a ser desenhada.

Foram os excessos da engenharia que sonhava ser capaz de equacionar a insolúvel mobilidade das carruagens motorizadas que levaram nossas cidades ao limite. A falência de Detroit, capital da motorcracia norte-americana, e os congestionamentos paulistanos diários provam que só com ações e idéias do século XXI será possível desfazer os estragos do passado.

São Paulo está pintando vias para as bicicletas com base em planos que estavam presos no papel e muita gente descobriu a bicicleta através desses novos espaços de circulação nas ruas. Foi a liberdade e o direito à cidade que levou a maior massa de pessoas em bicicleta a pedalar pela Paulista e ficou claro que quem experimenta ser livre, não volta ao cárcere passivamente.

Cada dia mais será socialmente inaceitável defender o privilégio de uma cidade em prol da mobilidade individual motorizada, mas as ruas, antes de um espaço físico, são espaço simbólico de dialógo e disputa de poder. Pela força dos números e alegria da pedalada, houve uma vitória. Ficou claro à quem acompanhou que a bicicleta não é programa de governo, com filiação partidária. Trata-se de uma construção global e coletiva, com uma organização dispersa e em rede.

Por conta dos amigos que formaram a massa crítica de ciclistas, do esforço apaixonado de quem acredita na bicicleta como ferramenta de transformação e da maturidade humana capaz de buscar novas soluções urbanas é que #VaiTerCiclovia. Numa malha cada vez mais extensa, com cada vez mais pessoas em mais bicicletas mais vezes. Com calma, fica o desafio de não se emocionar com o registro sensível de José Renato Bergo:

Bicicleta: entre o sonho e a disputa jurídica

Tinta que sinaliza a pista, placas de alerta para quem está à pé ou motorizado, tachões que chamam a atenção de motoristas é essa a grande revolução em curso na cidade de São Paulo para quem pedala e principalmente para quem sempre sonhou em pedalar.

Anos de projetos de gaveta e de imaginação cicloviária finalmente ganharam as ruas, para êxtase e deslumbramento dos ciclistas. O número redondo de 400km até 2015 trouxe consigo a pressão por quantidade e muitas vezes a qualidade necessária acabou ficando de lado. Críticas foram e continuam sendo feitas, mas depois de tantas promessas não cumpridas, qualquer retrocesso na política cicloviária atualmente em curso é inadmissível por quem defende uma cidade para pessoas.

Com pouco mais de 200 km de infraestrutura cicloviária implementada em São Paulo nos últimos 2 anos, a cidade pedala firme para uma malha mínima que garanta segurança para quem utiliza ou quer utilizar a bicicleta.

O resultado prático é que as mudanças simples nas ruas passaram a convidar mais pessoas a se deslocarem em bicicleta. Em uma cidade com tanta demanda por viagens e com os meios de transporte público e privados tão sobrecarregados, alternativas são urgentes.

Briga na justiça contra as ciclovias paulistanas

Em uma disputa que está longe de atender ao interesse da população ou zelar pelo bem público, duas notícias vindas do judiciário entristecem e mobilizam quem sempre pressionou o poder público por mais ciclovias e ciclofaixas.

Primeiro a estapafurdia decisão de uma juíza que buscou remover uma ciclofaixa em frente a uma escola particular por considerar a estrutura uma “tragédia anunciada”. Agora uma ação civil pública no Ministério Público Estadual de São Paulo que busca impedir a continuação das obras da ciclovia na avenida Paulista e exigir diversos estudos e comprovações cabíveis em obras de impacto equivalente a um novo viaduto ou via expressa.

Os trâmites judiciais tendem a ser lentos, uma resposta para quando se esgota o diálogo, ou no caso paulistano, um instrumento de pressão político-partidária. Em geral o mérito se baseia em julgamentos e análises feitas “através do parabrisa”. Trazem apenas a visão de quem conduz carruagens motorizadas e deixa de lado a vida que circula à pé ou de bicicleta pela cidade afora.

Entre a pressão por qualidade e sonho de uma cidade ciclável

Com a tinta no asfalto e uma rede cicloviária em expansão, inicialmente veio a alegria. O sonho da ciclofaixa na porta, a satisfação da pedalada tranquila em pontes. Mas logo se seguiram críticas justas e necessárias à qualidade técnica do planejamento e da implementação.

As forças de oposição talvez devessem investir mais no sonho de uma cidade possível para as pessoas. Tal postura seria extremamente construtiva e aliada ao interesse público. Além disso, liberaria os ciclistas de serem reativos e forçados a defender um sistema cicloviário que sai do papel imperfeito e com enorme espaço para melhoria.

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