Tudo que a Bicicleta pode Ser

Uma bicicleta é 4 vezes mais rápida do que caminhar. Pode-se levar muito mais carga com menos esforço. Pacientes podem ser levados aos médicos e médicos irem até seus pacientes. Crianças vão aprender e professores ensinar, pedalando. Trabalhadores chegam aos seus empregos e empresários transportam cargas e expandem seus serviços.

Pela simplicidade e baixo custo a bicicleta é a ferramenta perfeita para a promoção a qualidade de vida nos lugares mais pobres do planeta. Para atender a essa demanda, uma empresa de alimentos canadense concebeu a “Volta” que é também o nome de um rio que deságua no Golfo de Guiné. Rio batizado por comerciantes de ouro portugueses que “compraram” o metal e voltam pelo rio. O nome é perfeito para designar a contrapartida necessária a África. Um continente inteiro que forneceu riquezas aos países ricos num fluxo de mão única.

Uma bicicleta não é capaz de resolver os problemas e desigualdades no mundo. Mas nos lugares mais pobres, uma bicicleta é muito mais do que apenas uma bicicleta.

Assistam ao vídeo da Campanha “Bike Factory”.

As legendas dizem:

– uma caminhonete de entregas
– uma Ambulância
– um caminhão pipa
– um ônibus escolar
– na África uma bicicleta
– é muito mais que apenas
– uma bicicleta

A Revolução Será Pedalada

Uma revolução está a caminho. Cada bicicleta que ganha as ruas, deixa para trás a poeira, a escuridão das garagens. Toda bicicleta que gira e faz do ar estático vento no rosto de quem pedala é o sinal da mudança em curso. Cada caixa de papelão deixada para trás faz eco a liberdade do novo ciclista.

O elo da corrente que puxa a catraca por mais um dente faz o som do mundo que muda. A sineta tocada traz consigo as boas novas em movimento. O pedal empurrado levanta seu oposto e gera o círculo virtuoso da mudança. As rodas que giram levam em cada selim as mulheres e os homens do futuro. A revolução acontece a cada pedalada.

“Seja pela tendência estética ou pela mensagem ambientalista, as bicicletas como meio de transporte trazem consigo um estilo de vida e um discurso que irá mudar a cara da indústria (de bicicleta).”

A constatação acima foi publicada na revista Bicycle Retailer – Transportation Bikes Take Flight at Retail. A matéria mostra que a aceitação das bicicletas para transporte no mercado tem sido cada vez maior. E o aumento de vendas se traduz na criação de uma nova marca pela Specialized, na aquisição da pequena Breezer pela tradicional Fuji ou na Raleigh que deixou de lado as MTB e Speeds e se concentrou nas bicicletas urbanas em 2009.

Mudanças de paradigma demoram para acontecer e são fabricadas aos poucos. Momentos de crise costumam ser também janelas de oportunidade para os que tem mais visão comercial e sabem explorar as possibilidades de um futuro sempre incerto. A indústria mundial de bicicletas cada dia mais tem buscado se antecipar as tendências e jogar de acordo com as novas regras econômicas que estão sendo postas pelas mudanças comportamentais em curso.

Da mesma maneira que durante os anos 1990 as bicicletas todo o terreno revolucionaram o mercado. As bicicletas para transporte representam uma nova tendência comercial e uma revolução comportamental muito maior do que foi o nascimento do esporte Mountain Bike.

– via bikeportland.org

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Cidade que Queremos

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A cidade que os paulistanos querem, é uma cidade na qual elas possam se movimentar, ir e vir sem ficarem presas em meio ao mar de automóveis “estacionados”. É a cidade de São Paulo dos ciclistas apocalípticos de hoje. Afinal de bicicleta nunca se está “preso no trânsito”. No entanto, a percepção de cidade enquanto ciclista ainda é minoritária. A “inveja” que os motoristas sentem de saber que os ciclistas nunca ficam parados no trânsito ainda não é o suficiente para fazer aumentar exponencialmente da noite para o dia o número de ciclistas nas ruas. Mas felizmente eles vem aumentando, e muito.

Para que o discurso da promoção ao uso da bicicleta e dos transportes sustentáveis seja aceito como “senso comum” ainda há muito trabalho a ser feito. A cidade de Los Angeles é o maior exemplo do mundo de como num universo de recursos abundantes a mobilidade urbana não se resolve com mais investimentos no sistema viário. A cada ano a cidade californiana é sempre a campeã norte-americana de congestionamentos. Ao mesmo tempo Nova Iorque, tem a menor taxa de automóveis por habitante, um sistema de transporte de massa bem estruturado e para resolver os problemas de congestionamento motorizado tem promovido cada vez mais a bicicleta e a qualidade dos espaços públicos.

A cidade almejada pelos ciclistas precisa ser a cidade almejada pela população em geral. A pressão pela acessibilidade tornou nossas calçadas mais amigáveis para os pedestres. Da mesma forma, a promoção ao uso da bicicleta é capaz de promover a “acessibilidade” de nossas ruas, tornando-as aptas a outros fluxos e até mesmo outros usos. Precisa mudar a cidade, mudar a percepção de que cidade queremos.

Por hora investimentos no viário ainda são vistos como um “mau necessário“. No entanto, o político que tiver a coragem de ousar e trabalhar em prol de uma nova mobilidade, irá certamente receber um retorno político maior pelo ineditismo. Afinal em cima de cada bicicleta, vai um voto, se for uma criança, são dois votos. Pensando assim, uma cidade em que todos possam pedalar com conforto e segurança é uma cidade com mais eleitores felizes.

Mas não basta apenas pensar nas bicicletas. Seoul foi capaz de provar que um viaduto a menos é capaz de eleger um presidente. Os benefícios sociais e financeiros do investimento em qualidade de vida serão os que garantirão competitividade as cidades. E por consequência, viabilidade política para seus líderes democraticamente eleitos.

Planejar uma Cidade Global

O Brasil tem duas metrópoles globais. Rio de Janeiro e São Paulo são cidades cuja influência e importância vão além das fronteiras brasileiras e até mesmo Latino Americanas. No ranking urbano global (GaWC), São Paulo está entre as mais importantes dada a relevância dos negócios aqui conduzidos o que a coloca na condição de um importante nó na rede mundial das cidades. O Rio de Janeiro vem logo atrás.

Manter-se bem colocado no GaWC requer uma série de medidas e principalmente a visão dos seus administradores para que facilitem um ambiente favorável aos negócios sem inviabilizar a qualidade de vida da população desses grandes centros. As duas cidades no topo do ranking são unanimidades históricas que mantiveram desde o século XIX sua importância mundial. Londres e Nova Iorque, principalmente a primeira, inventaram o conceito de cidade global, mas para manterem seu papel de destaque, souberam se atualizar e acompanhar a marcha da história.

O progresso industrial do passado que fez explodir o tamanho das cidades deu lugar a uma nova abordagem do que é importante para que a metrópole não fique para trás no competitivo ambiente de negócios globalizados. Para não perderem competividade e principalmente produtividade, Londres e Nova Iorque tem dado muita ênfase ao transporte sustentável e ao espaço público. A qualidade de vida da população e a capacidade de “fazer mais negócios em menos tempo” são duas medidas que tem que ser encaradas de frente para que a cidade não perca importância econômica e política diante das demais cidades ao redor do globo.

São Paulo e Rio de Janeiro tem muito o que aprender com as duas mais importantes metrópoles mundiais. Em Londres e Nova Iorque o uso da bicicleta só faz crescer por meio de uma série de iniciativas da administração local. A mobilidade urbana cada vez mais irá diferenciar as cidades que ficarão presas no passado e as que irão seguir rumo ao futuro.

O Rio de Janeiro até hoje não se recuperou totalmente da perda política da transferência da capital federal para Brasília e do êxodo empresarial para São Paulo. Os atuais administradores de ambas as metrópoles precisam encarar a mobilidade com a devida seriedade e também como uma importante maneira de promover a sustentabilidade urbana. Precisam deixar de lado a velha mobilidade centrada no uso do transporte individual motorizado e dar prioridade absoluta para o transporte público e os descolamentos de pedestres e ciclistas. A palavra “progresso” mudou de sentido e esse novo significado está intimamente relacionado com a sustentabilidade ambiental.

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No Blog: Velha Mobilidade.
Confira na Wikipédia o conceito de Cidade Global.

O Valor de Andar a Pé

O ato de caminhar é a mais primordial forma de deslocamento do ser humano. Foi com os pés que dominamos o mundo e hoje no zoológico urbano em que a maioria da nossa espécie vive, caminhando descobrimos nossos arredores mais imediatos. Indo e vindo, movidos pelas próprias forças andamos até a padaria, a um restaurante na esquina ou ao cabeleireiro.

Caminhar é um ato que carrega consigo uma alta simbologia, a passos lentos e ritmados somos capazes de percorrer grandes distâncias. No entanto em nossas cidades o pedestre e a “caminhabilidade” tem perdido espaço para formas motorizadas de deslocamento. Ainda que as viagens a pé sejam as campeãs dos deslocamentos, mesmo em São Paulo ou no Rio de Janeiro.

Quatro pontos fundamentais acabam pondo de lado o grande valor de andar a pé. Como aponta o documento em inglês: “O Valor Econômico de Andar a Pé” de Todd Litman.

  • Primeiro, é difícil medir a “caminhabilidade”, para contar o fluxo motorizado câmeras e computadores são usados. Já o fluxo de pedestres é errático, é difuso. Levando-se em conta os atrativos de uma determinada região para que mais pessoas caminhem nela, a medição torna-se ainda mais complexa. De qualquer maneira, muito pode ser feito em prol dos pedestres.
  • Um segundo fator ajuda a deixar de lado o valor das caminhadas, o baixo status social dessa ação tão primordial. O que se convencionou definir como “progresso” está associado ao fluxo motorizado, as grandes obras. Felizmente exemplos como o de Bogotá e Seoul nos fazem lembrar que qualidade de vida também rende dividendos políticos.
  • Outro fator contrário a valorização do pedestrianismo é o baixo custo. Quem caminha não precisa se abastecer em postos de gasolina, nunca visita uma oficina mecânica para consertar o motor, nem troca pneus furados. Portanto caminhar não gera dividendos imediatos, nem faz a “roda da economia girar”. Mas essa visão é bastante míope, já que a obesidade e a poluição atmosférica causam enormes prejuízos a toda população. O pedestre portanto tem grande valor na redução de custos sociais associados a mobilidade urbana.
  • Por fim, a última barreira política a ser enfrentada é a crença de que o fluxo de pedestres “se resolve sozinho”. Certamente uma percepção errada e que felizmente tem perdido espaço entre planejadores urbanos. O pedestre é capaz de desbravar caminhos em quaisquer condições, seja em uma calçada esburacada ou em uma trilha de terra a beira de uma estrada asfaltada. Mas as consequências de deixar os atrativos para os caminhantes são graves, comunidades sem calçadas de qualidade tendem a ter mais viagens motorizadas e sofrem mais com os efeitos negativos do uso excessivo dos motores.

Dirigir ou ser passageiro é um ato transitório, todo o ser humano é pedestre. Planejar para quem caminha é portanto mais do que priorizar os mais de 30% da população cujo principal meio de transporte são os próprio pés, trata-se de pensar a cidade em função da figura mais importante no ambiente urbano, as pessoas.

Mais:
– Baixe o PDF “O Valor Econômico de Andar a Pé” de Todd Litman no site da TA.
– Saiba o índice de caminhabilidade de qualquer endereço nas 40 maiores cidades norteamericanas.