445 anos de belezas naturais

Pedra da Gávea, através dos raios

Cidade desde sempre rica em belezas naturais que aos poucos descobre como facilitar a vida dos que usam o melhor meio de transporte já inventado desde antes da Cidade Maravilhosa ser uma cidade. Parabéns Rio de Janeiro por mais esse aniversário de sua fundação e que muitas bicicletas continuem povoando suas ruas, avenidas, ciclovias e ciclofaixas.

E porque não, o Samba do Avião:

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Uma homenagem

A bicicleta Branca de Brasília

Pedro Davidson estudava biologia e pedalava por Brasília. Foi morto por um motorista em excesso de velocidade, que havia ingerido álcool, trafegou em local proibido e não prestou socorro. No julgamento em primeira instância o júri aceitou a acusação de homicídio com dolo eventual. O motorista foi condenado a cumprir pena de 6 anos em regime semi-aberto.

A jurisprudência de crimes de trânsito no Brasil ainda é complicada e prevalece o entendimento de dolo eventual. A tese é polêmica e também um entrave para que motoristas que tiram vidas sejam punidos com mais rigor.

Nesse contexto é importante a união da comunidade ciclística de Brasília em torno do caso de Pedro. Através da perspectiva daqueles que utilizam a bicicleta no trânsito será possível espalhar a noção de que do lado de fora dos veículos motorizados as vidas são muito frágeis e qualquer risco é grande demais. Por hora esse discurso ainda não ecoou nos tribunais.

Mas é chegado o tempo da bicicleta e com mais ciclistas nas ruas, mais motoristas serão também ciclistas e mais bicicletas serão vistas. Nas palavras de Bob Dylan:

“(…)
Porque a roda ainda gira
e não há como saber para quem
Ela está apontando.
Porque o perdedor agora
Será mais tarde vencedor
Porque os tempos estão a mudar.

(…)

A antiga estrada
Rapidamente envelhece”.

Enquanto se constroem as novas, que Brasília não tenha mais nenhuma bicicleta branca.

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A reinvenção do mundo, pedalando

O jornalista Arthur Dapieve escreveu uma resenha sobre o livro “Diários de Bicicleta” que foi publicada no jornal O Globo em 11 de dezembro de 2009. Mais do que bicicletas, o livro de Byrne fala sobre cidades, pessoas, culturas. Tudo pela perspectiva de quem, por acaso, utiliza a bicicleta como seu principal meio de transporte terrestre.

O Leonardo pop

Byrne reinventa o mundo pedalando

David Byrne chegou à capa da “Time” na edição datada de 27 de outubro de 1986. Ele já não era nenhum novato _ os Talking Heads haviam sido formados onze anos antes _ mas a revista reconhecia mais que isso. Segundo ela, Byrne era um homem da Renascença no rock, um Leonardo Da Vinci no CBGB’s por conta de seus múltiplos talentos: música, claro, artes plásticas, espetáculos de dança e, este o gancho, um filme, “Histórias reais”.

O diretor e co-roteirista viria dos Estados Unidos apresentar a sua obra no então FestRio, semanas depois. “Histórias reais” era uma alegoria travestida de documentário. Ou vice-versa. O personagem de Byrne visitava a fictícia cidade de Virgil, Texas, como se tivesse acabado de chegar de Marte. Lá, ele se inteirava de estranhos tipos humanos e de bizarras formas de organização social. Seu olhar era cândido, irônico, brilhante.

Bem, reencontrei o homem da Renascença no melhor livro que li em 2009, “Bicycle diaries”, blague de um velho latinófilo com “Diários de bicicleta”, de Che Guevara, levado ao cinema por Walter Salles. A capa dura vermelha da editora Viking protege o pedalar e o pensamento de Byrne por Berlim, Istambul, Buenos Aires, Manila, Sydney, Londres e um punhado de cidades americanas, em especial São Francisco e Nova York, onde este escocês sossegou depois de passar a infância em Hamilton, Canadá, e a adolescência
em Baltimore.

Aos 57 anos, Byrne pedala habitualmente por toda Nova York. Ele conta que já teve de se desviar de Paris Hilton, que atravessava a rua com o sinal vermelho para pedestres, o seu cãozinho na coleira e a expressão “eu sou Paris Hilton, você não me reconhece?” na cara. Em viagem, ele carrega uma bicicleta dobrável, o que lhe permite sentir o clima com mais liberdade do que se estivesse de carro e mais abrangência do que se andasse a pé.

O escritor inglês Will Self gosta de fazer quase o mesmo caminhando, às vezes até do aeroporto ao centro de uma cidade. Em “Psychogeography”, de 2007, ele diz que aderiu a longas caminhadas “como um meio de dissolver a matrix mecanizada que comprime o espaço-tempo e desconecta o humano da geografia física”. No capítulo dedicado ao Rio, Self ganha o apelido de Hitler na vizinhança suspeita de seu hotel por carregar o pocket de “Ascensão e queda do Terceiro Reich”, de William L. Shirer, com uma suástica na capa.

O estilo de Byrne é diferente do de Self. Não apenas no meio de transporte. Se o inglês é gongórico-misantrópico, como sempre, o nova-iorquino é cristalino-humanista. Pode-se ler “Bicycle diaries” como uma sequência de posts num blog. Claro, um blog bem escrito e não-ególatra, cujos tags seriam ciclismo, urbanismo, artes plásticas, arquitetura, música, história, sociologia, psicologia, antropologia. O homem da Renascença, lembre-se.

Byrne articula esses posts não apenas por cidades _ algumas visitadas mais de uma vez no decorrer dos anos_ mas também por assunto. Cada capítulo constitui um pequeno ensaio, com um tema central. O de Istambul, por exemplo, trata das tensões entre Ocidente, representado por um festival de rock proibido, e Oriente na cultura turca. O de Sydney trata das hostilidades da natureza australiana com o ser humano, como se uma dissesse ao outro “você não é bem-vindo aqui”, e do colonizador europeu com os nativos aborígenes.

Ele descreve como o sapo-cururu, introduzido na Austrália para combater insetos nas lavouras, tornou-se ele mesmo uma praga, e uma praga cuja pele secreta um veneno que, em pequenas doses, causa delírios e, em grande doses, pode matar. Alguns cães ficaram viciados em lamber sapos-cururus. “Pessoas também morreram por causa deles”, escreve Byrne. “Porque, como nos cães, uma lambida num sapo-cururu pode estimular alucinações que duram cerca de uma hora, e alguns caras não são tão espertos quanto cães.”

São essas pequenas iluminações, centenas delas, às vezes zen-budistas, que tornam “Bicycle diaries” tão bom. Byrne é um três-em-um: viajante não-etnocêntrico, observador inteligente e escritor habilidoso. Pegue-se o post do aviso na porta giratória da catedral de St. Paul, em Londres: “Esta não é outra senão a casa de Deus. Este é o portão do Paraíso.” Byrne se espanta com tamanha solenidade numa mera porta giratória e conjectura: “Acho que diz isso de trás pra frente quando você está dentro.”

Na pesquisa para o estranho projeto de um filme que relacione Imelda Marcos e cultura discotèque, Byrne vai parar em Manila. Pedalando pela orla da cidade, ele se espanta com a quantidade de karaokês e toma conhecimento de que alguns filipinos reclamam para o país a invenção dessa modalidade de diversão. Aí vem a sacada: “Há até um canal de karaokê na TV. Infinitos vídeos baratos e cafonas com música tocando e letras rolando. Você pode ficar em casa e cantar junto com a sua televisão. É como algum tipo radical de obra de arte conceitual _ mas, diferentemente de arte conceitual, é superpopular.”

“Bicycle diaries” termina com uma série de desenhos sugeridos por Byrne para novos bicicletários em Nova York. O homem da Renascença, lembre-se.

*************

“Diários de bicicleta” acabou de sair no Brasil, pelo selo Amarilys, da editora Manole, com prefácio de Tom Zé. A versão brasileira, amarela, está tão bonita quanto a americana, mas sobre a tradução que apenas folheei qualquer comentário seria precipitado.

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Aventuras sem freios

A bicicleta como veículo lúdico e hobby divide-se em incontáveis “tribos”. Variam os diâmetros de roda, dimensões e geometria do quadro, materiais, relações de marcha, etc. Em comum, sempre, as duas rodas, os pedais e a possibilidade de usar a bicicleta como lazer e meio de transporte.

Em vídeo, duas tribos:

Fixeiros que vão de Tóquio a Osaka

No inverno canadense, galera do BMX monta rampa na sala de um apartamento.

A busca por adrenalina também pode ser saciada pela bicicleta e é isso que a maioria das “tribos ciclísticas” fazem. Mas bicicleta não pode ser atividade “de menino” em que os riscos vão além do necessário e grupos se formam e transformam-se em tribos.

Essa divisão dos ciclistas em tribos é ao mesmo natural e tem grandes desvantagens. Seres humanos sempre se filiam a grupos de interesse comum, mas quando a bicicleta fica circunscrita somente a “nichos” ou “tribos”, a mobilidade por bicicleta tende a ser prejudicada.

Nas sociedades mais amigas do ciclista (e da boa mobilidade urbana em geral) pedalar é um pouco como escovar os dentes. Está introjetado nas pessoas, ninguém compara modelos de escova com os amigos ou costuma sair mais com usuários de determinado creme dental.

Mas nem só de pedaladas cotidianas vivem os ciclistas. É sempre bom que também existam as tribos e que rapazes loucos embarquem em aventuras sem freios. Nas estradas do Japão ou em um apartamento no Canadá.

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Teaser “Tokio to Osaka” via facebook.

Pequena Notável

Dahon Classic III

A Dahon Classic III dessa foto foi vista na Freecycle, bicicletaria paulistana referência para dobráveis. A pequena bicicleta tem história e estava na loja para voltar a rodar. Em viagem ao exterior a dona trouxe uma, há mais de 20 atrás.

Bicicletas antigas tem um valor fundamental que não se paga em dinheiro, tem história para seus donos. Não merecem a poeira das garagens. Apesar de objetos inanimados, também precisam de vida para sobreviver. Afinal uma bicicleta quando não é pedalada definha aos poucos. São os pneus que murcham, a poeira que se acumula, o óleo que seca, aos poucos a ferrugem se espalha e a vida se esvai.

Felizmente bicicletas costumam ser perfeitamente ressucitáveis, basta uma revisão geral na bicicletaria mais próxima e seguir com pedaladas regulares.

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