O Campeonato Carioca de Cargueiras

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Inspirada nas Svajerløb dinamarquesas, será realizada em maio de 2014 a primeira corrida de entregadores em bicicleta da América Latina. O Campeonato Carioca de Cargueiras.

Desde já está lançada a pergunta, quem será o Rei do Rio?

A pedalada vai ser viking. Afinal foi em 1942 que os malemolentes entregadores dinamarqueses tiveram o seu primeiro campeonato. Um evento que valorizou os que faziam fluir a cidade e que aconteceu até a popularização das vans de entrega nos anos 1960.

A idéia da corrida reapareceu em Copenhague em 2009 e, claro, foi sucesso e diversão nas ruas.

Copacabana tem uma massa invisível de ciclistas, os heróis do proletariado. São os responsáveis por mais de 11.000 entregas diárias feitas em bicicletas e triciclos. Todos eles estão em uma situação parecida aos que pedalavam em Copenhague nos anos 1940.

Mais de 70 anos depois da primeira Svajerløb, valorizar as pessoas que utilizam a bicicleta, essa invenção com mais de 125 de bons serviços prestados, é um passo em busca de inclusão social, e também um evento irado.

No Rio de Janeiro vão haver prêmios para os entregadores mais bem colocados, mas a vitória será de todos esses heróis invisíveis que transportam de tudo pelas ruas.

 

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Será que somos ciclistas?

Uma pergunta fundamental precisa ser feita regularmente, quem são afinal os “ciclistas”. Em geral a resposta é bastante direta, são seres quase especiais que por diversos motivos pedalam. Pode ser a definição do triatleta, do entregador da farmácia, de quem se deslocam até o trabalho, ou um pai ou mãe que aproveita a rapidez da bicicleta para deixar o filho na escola.

Ainda assim, o uso do termo costuma também designar a “tribo” dos ciclistas. Aqueles que tem paixão pelo esporte, necessidade pelo transporte ou utilizam a bicicleta como ferramenta profissional. E aí que reside um pequeno grande problema. Os “nichos” que buscam definir e compartimentalizar a existência humana e todas as suas atividades de maneira a afastar justamente o fator humano.

Vale experimentar definições mais claras. Pessoas a pé, pessoas de carro, pessoas de ônibus, pessoas em motocicletas, pessoas de patins, pessoas de skate e pessoas de bicicleta. Em todas essas últimas expressões o mais importante são justamente os seres humanos que optaram por um ou outro meio de transporte. Esse fato pode ser melhor exemplificado em uma releitura de estatísticas na mortalidade no trânsito.

Para cada número que fala de “pedestres” mortos em atropelamentos, certamente é mais grave a morte de “pessoas a pé” no trânsito. As maiores vítimas, frágeis por estarem a pé e por serem pessoas como todos nós. O mesmo se aplica aos “motociclistas”, “motoristas”, “ciclistas” etc. Para cada definição dessa natureza, é possível entender que “não faço parte desse grupo” e esquecer que cada número é uma vida.

Pela simplicidade e empatia que gera, é que temos especial apreço pelo nosso slogan: “por mais pessoas em mais bicicletas mais vezes”. Pouca diferença faz qual o nicho, subgrupo ou cultura pertence aquele que pedala, mas será sempre um ser humano que optou pela bicicleta. Ao priorizar as pessoas, daremos uma pedalada certeira em direção a uma humanização dos espaços em que essas pessoas vivem e circulam.

Dentro dessa lógica, querer aumentar o número de “ciclistas” pode parecer contra intuitivo para quem está de fora e até a defesa da vontade de um pequeno nicho de ativistas em detrimento da vontade da maioria. A definição do senso comum para “ciclista” costuma ser restritiva e para o “ciclista urbano” vir acompanhada de elogios distanciados. Comentários em geral elogiosos ao “ciclista” pela “coragem” em pedalar, seguida de uma desculpa genérica na linha de “não é para mim”. Ser uma pessoa que pedala portanto é uma quebra do senso comum que busca devolver a quem acredita na bicicleta como uma “nave especial nas ruas” uma resposta simples e inclusiva. Afinal, é preciso apenas tomar uma opção em pedalar para ser uma “pessoa em bicicleta”.

Certamente promover o uso da bicicleta passa menos por máquinas sem alma e mais por carne, osso e mentes que conduzem objetos sem vida.

– Esse texto foi inspirado na leitura do artigo: Can Saying “People on Bikes” Instead of “Cyclists” Make Biking Safer?

PechaKucha sobre bicicletas

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Apresentações rápidas, informais e diretas sobre um tema. Esse é o conceito do PechaKucha, um evento para discutir como redesenhar mentes e atitudes.

Todos estão convidados para trocar idéias, bater papo e terminar tudo com uma cerveja, suco ou mate bem gelado em mais um evento paralelo ao projeto Ciclo Rotas Centro.

Vai ser no Studio-X Rio nessa sexta 22 de novembro de 2013.

Quem estiver por lá, vai ter também sorteio de uma bicicleta Durban.

Confirme presença e saiba mais.

Bicicleta, a melhor máquina

Eficiente ao extremo, a bicicleta é incomparável a qualquer outra criação industrial humana. Mesmo fruto da criatividade do século XIX, as magrelas movidas a pedal são máquinas perfeitas para o século XXI.

Talvez aspas de Umberto Eco em Apocalípticos e Integrados possam ajudar a explicar a redescoberta da bicicleta:

A questão não é como retornar a um estado pré-industrial, mas perguntarmos a nós mesmos em que circunstâncias a relação do homem com o ciclo produtivo subordina o homem ao sistema e, inversamente, como devemos elaborar uma nova imagem do homem em relação ao sistema que o condiciona: uma imagem não de humanidade livre da máquina, mas livre em relação à máquina.

Ser uma máquina em função da humanidade e não instrumento que subjuga nossa humanidade é a maior riqueza da bicicleta. Ela nos permite a conciliação necessária entre o “progresso” (seja qual for a noção de progresso) e as nossas necessidades animais mais simples no que se refere aos deslocamentos.

Uma outra interpretação de Umberto Eco traz a figura dos ciclistas apocalípticos e integrados. Mas aí é outra história.

Pequenas e grandes perversões urbanas

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Viver em cidades, especialmente em grandes cidades, expõe as pessoas a desafios constantes. Muita gente junta é algo inviável para o nosso limitado cérebro primata lidar com facilidade.

Dentro dos espaços possíveis para os citadinos, existe o espaço das perversões. Sem entrar profundamente em conceitos psicanalíticos, nossas cidades hoje vivem a loucura de estruturas perversas que inviabilizam a sanidade mental da população.

A fuga mais comum, e exatamente por isso mais perversa, é a busca por soluções individuais para problemas coletivos. A velha premissa de comprar (à vista ou parcelado) o conforto da (i)mobilidade individual motorizada.

Quando ampliada para a sociedade como um todo, essa perversão retroalimenta cidades que produzem dinheiro e riqueza, mas asfixiam a presença humana. Certamente São Paulo é o melhor exemplo brasileiro desse comportamento.

Felizmente existe espaço para um desvio de comportamento de outra natureza. O prazer, quase sádico, do ciclista em se esgueirar por meio do mar de carros travados no congestionamento.

Aos poucos esse prazer (tende) a se tornar um desejo por mudança na estrutura das cidades. Readequando, principalmente o fluxo, para as reais necessidades humanas.

Para que o ciclo-sadismo não tome conta de quem pedala, é sempre bom variar o meio de transporte. Propor-se ônibus e trens com seus itinerários fixos e paradas delimitadas. Ou até a lenta e reflexiva caminhada, lentamente apreciando os dramas e alegrias da realidade urbana.

Recentemente no entanto uma nova atitude tem se aberto aos cidadãos, experimentar as cidades em bicicletas compartilhadas. Pontos fixos para pegar e deixar as bicicletas, trajetos livres e por fim uma caminhada em terreno conhecido até a porta de casa, do escritório ou de qualquer destino que não esteja em frente a uma estação de bicicleta pública.

Essa perversão certamente está presente na campanha em relógios nas ruas de São Paulo que convida os motoristas presos em seus carros a experimentarem uma outra cidade possível hoje. A cidade em que um serviço de mobilidade abra portas para outra mobilidades possíveis. Longe do conforto perversivo da (i)mobilidade individual e mais ligada à independência e o conforto de ter nos deslocamentos um serviço.

A campanha de marketing em prol das bicicletas do Itaú (que patrocina esse blog e outros projetos da Transporte Ativo):