Dez anos de ação e informação

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Foram exatos 60 boletins informativos bimestrais da Transporte Ativo ao longo de dez anos. Uma excelente notícia coroa o sexagésimo primeiro, o volume de informações e ações agora justifica a distribuição mensal do nosso comunicado oficial.

Desde o primeiro disparo de emails havia a cada mês a dúvida sobre se haveria uma quantidade suficiente de ações, eventos e notícias na imprensa para divulgar. A cada bimestre o que nascia como espaço em branco era facilmente preenchido com novidades. Alcançar a necessidade de informações mensais pelo excesso de informações nos boletins é portanto uma grande conquista.

Para receber o boletim informativo bimestral da Transporte Ativo, basta entrar em contato.

Nesse link também é possível conferir todos os informativos anteriores e mais.

Pedalemos.

Regras demais diminuem a segurança

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As ruas precisam ser espaços seguros de aprendizagem

Ruas são espaços de uso coletivo, mas a segregação produzida ao longo do século XX, trouxe uma lógica que acaba por forçar comportamentos conflituosos entre os diferentes usuários no trânsito.

A engenharia de tráfego com suas placas, rótulas, alças de acesso, pontes e viadutos acaba trazendo a lógica das rodovias e da circulaçãoem alta velocidade para o coração das cidades, inviabiliza assim o mais fundamental dos aspectos urbanos, a interação humana.

Regras demais destroem o senso de responsabilidade pessoal, desencorajam a negociação e ao buscar diminuir os riscos, na verdade os aumentam.

Precisamos criar um manifesto em favor do vilarejo, do contato entre as pessoas, de cidades com mais portas abertas e menos grades. Com mais vigilância comunitária e menos vigias particulares. Uma lógica urbana em que a responsabilidade seja compartilhada e que zelar pelo outro, seja um dever coletivo.

Por hora, ainda queremos isolar as pessoas dos riscos de uma mobilidade motorizada utilizando plástico bolha. Buscam-se muros altos, blindagens, isolamento contra tudo que está fora. Fora de casa, fora do carro, fora dos manuais de sinalização rodoviária. Ao invés de faixas de pedestre, semáforos, separação entre calçada e leito carroçável, precisamos de olho no olho entre condutores e todos ao redor.

As mais diversas expressões, majoritariamente em inglês, traduzem os conceitos de responsabilidade compartilhada no trânsito. São as “naked streets”, as “complete streets”, o “traffic calming” em geral. É preciso portanto despir as ruas de tantas placas e balizas para torná-las completas e acessíveis a todos, tornando com isso mais seguro e calmo o trânsito.

Exhibition Road em Londres é o exemplo maior de como realizar transformações em prol do futuro urbano mais humano. Trata-se, sem falsa modéstia, da localidade cultural mais acessível no mundo. São parques e museus ligados por um boulevard com fluidez para as pessoas em harmonia com o acesso motorizado.

Há um longo caminho, mas é preciso relembrar o que tornaram nossas cidades maravilhas da humanidade e o que muitas delas estão fazendo para continuarem a ser ninhos de criatividade e inovação em prol do progresso humano.

Leia mais:

 

 

De volta para o futuro de utopias

O futuro está sempre preso a nossa capacidade de imaginação e esta, reside firme no presente. Talvez a maior dificuldade da arte da ficção científica seja vislumbrar um por vir  menos centrado em avanços tecnológicos cercado de distopias.

A mensagem geral é de que a humanidade é um projeto biológico que falhou. Certamente falhamos, principalmente em nossa capacidade de sonhar com utopias. Mas sempre é tempo de desbravar caminhos.

Para imaginar o futuro de São Paulo

Um projeto quer desencavar rios, primeiro de maneira simbólica, para em seguida promover as modificações físicas necessárias. A cidade deve voltar a ser azul, da cor da água de seus mais 300 km de rios espalhados por mais de 4.000 km de extensão.

 

A premissa é simples, é preciso ver para cuidar. Mas antes mesmo de ver, é preciso imaginar e aí entram as utopias. Uma utopia com mais natureza, árvores urbanas, permacultura, criatividade, convivência, espaço público.

Felizmente pequenas ações já podem nos ajudar a definir caminhos e sonhar com paraísos terrenos. A promoção ao uso da bicicleta e o cicloativismo é um desses caminhos, as hortas urbanas e todo uma organização em torno do trabalho que não está centrado no dinheiro, mas na dedicação voluntária pela transformação do entorno. Ao mesmo tempo, até na Fernando de Noronha já está com bicicletas em seu território. Foi o arquipélago brasileiro que inspirou Thomas More a conceber sua ficção “Sobre o melhor estado de uma república e sobre a nova ilha Utopia”, conhecida simplesmente como Utopia.

Valores desastrosos, escolhas equivocadas e mau comportamento são características que podem levar sociedades ao colapso, histórias de fracassos e sucessos ao longo do tempo ajudam a rever o passado com uma noção clara da importância das encruzilhadas de escolhas com as quais nos deparamos diariamente.

Mobilizar a comunidade local para agir em uma praça, redecorar uma esquina ou redesenhar espaços públicos e parte fundamental para que os não-lugares de nosso presente quase distópico tornem-se no futuro a realização de sonhos.

Saiba mais:

Cidade Azul (ajude a financiar no Catarse)
City Repair Project: Portland Gems and Growing Pains
Começa o projeto Bike Noronha, a ilha tem bicicletas públicas com uso grátis

Livros:

Colapso – Jared Diamond
Nowtopia – Chris Carlsson

A caminhada como ferramenta logística

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A caminhada, além de deslocamento ativo também pode ser aplicada como solução de logística urbana. É isso que mostra o estudo de Julio Loureiro da Unigrario, iniciativa premiada no seminário sobre mobilidade a pé Walk21 que acontece entre os dias 20 e 23 de outubro de 2015 em Viena na Áustria.

Mobilidade a pé, solução logística

Diversos usos para a caminhada no planejamento logístico já são utilizados atualmente. Restaurantes, farmácias, lanchonetes, os correios, entrega de documentos em geral, mercados, pet shops e diversos outros negócios já incorporam as entregas a pé para chegar ao consumidor final.

Para multiplicar o impacto positivo, outras maneiras de incorporar o andar na logística de pequenas e grandes empresas podem estar presentes. O uso de caminhões como depósitos móveis é certamente uma dessas soluções. Estacionados em áreas seguras e livres das cada vez mais comuns de restrições à circulação motorizada, veículos de carga podem ter nos entregadores com carrinhos de mão o apoio necessário para acessar toda uma área urbana através de diversas viagens curtas.

Nos anos 1990 a “Expresso Harmonia” já fazia esse tipo de serviço na entrega à domícilio de milhares de catálogos médicos de uma companhia de seguro de saúde.

A cada manhã o veículo de entrega, ou depósito móvel, estacionava em um ponto da cidade e de lá uma equipe de tamanho variável se encontrava e saia para cumprir um roteiro previamente definido. Cada entregador a pé era capaz de fazer 80 entregas por dia e um único caminhão tinha capacidade para até 1.200 catálogos. Equipes com no máximo 21 pessoas eram capazes de fazer 30.000 entregas por semana em toda a cidade.
Um exemplo de logística a pé no centro do Rio de Janeiro

O método de entrega que utiliza caminhões como depósitos móveis e entregadores a pé é justamente o estudo de caso levado para o Walk21 em Viena.

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Toda a operação começa com um caminhão de 5 toneladas que sai do depósito central somente com o motorista e estaciona no centro do Rio de Janeiro, uma rotina que acontece de segunda à sexta-feira. Logo cedo, seis outros funcionários juntam-se ao motorista no esforço de realizar as entregas.

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Feita a separação, que dura cerca de uma hora, as entregas começam a serem feitas. São de 60-75 pedidos por dia, com um máximo de 120 por caminhão em um único dia.

Cada carrinho de entrega leva uma carga de cerca de 1,3m3, que pode pesar de 60 até 100kg, a depender da densidade do material transportado. É possível ainda incorporar logística reversa, geralmente utilizada para a substituição de produtos com defeito.

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O mapeamento é feito com base na acessibilidade, restrições de entrega por lojas e prédios, tudo de forma a maximizar a quantidade de entregas concluídas com sucesso, minimizando a necessidade de viagens em vão.

Toda a tabulação das rotas é feita com base no aprendizado coletivo dos próprios entregadores. Eles mesmos organizam uma tabela com as notas fiscais e a quantidade de volumes transportados. As pessoas envolvidas e a localização do caminhão são sempre as mesmas, o que facilita todo o trabalho, mas também impõe dificuldades circunstanciais. Diferenças sazonais na quantidade de entregas e eventuais expansões na área de entrega são problemas comuns.

Logísitica eficiente e de baixo impacto

 

Toda a eficência do sistema de entrega por meio de caminhões e pessoas a pé ainda está baseada no aprendizado das ruas e um conhecimento coletivo não sistematizado. Mesmo assim o índice de entregas não realizadas é baixo.

Serviços informatizados possibilitam que rotas sejam traçadas da melhor maneira possível, contribuindo para um aumento na produtividade e compilando dados sobre períodos críticos, produtividade por entrega e cobertura territorial.

Saiba mais:

Agradecimento aos destemidos pedestres e ciclistas

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Aos caminhantes, bicicleteiros, usuários da sola do sapato e das duas rodas com pedais:

Obrigado pela saudável desobediência civil. Com vocês o trânsito da cidade é mais humano e respeitoso, pois a qualquer instante uma pessoa que está atrás do volante poderá ser surpreendida por outra atravessando a rua, ou pedalando entre os carros, o que demanda uma atenção redobrada no volante.

Obrigado por não esperar 3 ou 4 insanos minutos para fazer a travessia de uma avenida, bizarramente condicionada a dar mais tempo e fluidez às máquinas do que às pessoas.

Obrigado aos ciclistas por seguirem pela contra mão ao invés de aumentar seu caminho em centenas de metros por conta da convenção motorizada das ruas de fluxo unidirecional.

Nossos agradecimentos também aos que desbravam novas rotas pedalando na calçada de grandes avenidas ou onde o trânsito motorizado é muito opressivo. São vocês que irão reorientar a dinâmica do espaço viário em favor dos fluxos humanos.

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Essa é uma carta escrita à quatro mãos e que tem mais informações, dados e explicações no post:
Carta aberta aos destemidos pedestres e ciclistas.