Bicicletas para a saúde

O Governo de Alagoas anunciou a entrega de 5.300 bicicletas para as ações no Programa Saúde da Família nos 102 municípios do estado.

5.300 bicicletas para a saúde

A intenção é garantir melhor meio de transporte dos agentes comunitários de saúde. A demanda surgiu entre os próprios agentes que, durante o Fórum Viva Vida, falaram das dificuldades que encontravam para atender as famílias e realizar as visitas periódicas necessárias, pois muitas pessoas a serem visitadas residem em localidades distantes.

O objetivo do governo, com esta iniciativa, é ampliar a cobertura à assistência as gestantes, crianças e idosos, contribuindo para redução dos índices de mortalidade infantil e melhoria da qualidade do atendimento à população
Myrna Pimentel, diretora de Atenção Básica

Quando falamos em bicicletas e sustentabilidade, não pensamos apenas no meio ambiente. Sustentabilidade é um conceito necessário em condições de escassez de recursos ou, de outra forma, é usar os recursos disponíveis com eficácia, efetividade, sabedoria.

Em locais tão díspares como Londres, na Inglaterra; Kaberamaido, Uganda; ou vilarejos longínquos no Nepal, a bicicleta dá sua fundamental contribuição para o sistema de saúde.

when looking at ways of providing patient care in the city it was clear that bicycles were the most effective way to get to the parts of the city normal ambulances couldn’t reach
Wayne Badcock, St John Bicycle Ambulance Service

É mais do que sabido que usar a bicicleta é ótima escolha para melhorar as condições pessoais de saúde. Combate doenças, contribui para diminuir o peso, aumenta a força e a condição física. Reveja aqui.

Mais do que tratar doentes, um sistema de saúde eficiente passa antes por medidas de prevenção bem feitas. Ao fornecer agilidade aos agentes comunitários, mais pessoas podem ser atendidas em menos tempo, ampliando o leque de atuação dessas medidas preventivas de saúde. Da mesmíssima forma, se as cidades tomassem medidas preventivas no trânsito, nossas ruas não precisariam ser levadas para a UTI dos engarrafamentos.

A bicicleta está aí, disponível para ser adotada em soluções inteligentes como esta adotada pelo governo alagoano.

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Bate-papo sobre bicicleta

Zé Lobo no elevado Paulo de Frontin

Entrevista com Zé Lobo veiculada hoje no site “O Eco” resume um pouca a história da TA e traz um bom panorama sobre as bicicletas no Brasil e no mundo.

Em 2003 nasceu no Brasil uma organização com o objetivo de estimular o uso de bikes, triciclos, patins, skates, patinete e até os deslocamentos a pé. Só que a Transporte Ativo, como é chamada, não é mais um grupo de esportistas que promove encontros periódicos para o desenvolvimento da prática. Ela dá suporte a governos locais na implementação de infra-estrutura e leis que facilitem o uso de tais meios de transporte, além de desenvolver ações de conscientização e educação.

Fora a quantidade crescente de pessoas que procuram a organização em busca de orientações de como trocar de vez o carro pela bicicleta, a Transporte Ativo acumula outras importantes vitórias. Por sua indicação, a prefeitura do Rio mudou a velocidade máxima permitida nas ruas internas de Copacabana – facilitando a vida de ciclistas. Agora, os carros podem rodar a, no máximo, 30 km/h. Também conquistou novas faixas de uso compartilhado, trouxe para o Brasil o conceito de “Vaga Viva” – quando uma vaga de carro é transformada em ambiente de convívio, chamando a atenção para o individualismo dos automóveis – e é responsável pelo desafio intermodal, uma competição entre vários meios de transporte para ver qual é o mais eficiente para o deslocamento em certas distâncias. Hoje, a Transporte Ativo tem a anuência e o suporte da organização holandesa I-CE, que desenvolve o Bicycle Partnership Program, e o reconhecimento dos governos locais e de outros países.

Confira a entrevista.

A reinvenção do mundo, pedalando

O jornalista Arthur Dapieve escreveu uma resenha sobre o livro “Diários de Bicicleta” que foi publicada no jornal O Globo em 11 de dezembro de 2009. Mais do que bicicletas, o livro de Byrne fala sobre cidades, pessoas, culturas. Tudo pela perspectiva de quem, por acaso, utiliza a bicicleta como seu principal meio de transporte terrestre.

O Leonardo pop

Byrne reinventa o mundo pedalando

David Byrne chegou à capa da “Time” na edição datada de 27 de outubro de 1986. Ele já não era nenhum novato _ os Talking Heads haviam sido formados onze anos antes _ mas a revista reconhecia mais que isso. Segundo ela, Byrne era um homem da Renascença no rock, um Leonardo Da Vinci no CBGB’s por conta de seus múltiplos talentos: música, claro, artes plásticas, espetáculos de dança e, este o gancho, um filme, “Histórias reais”.

O diretor e co-roteirista viria dos Estados Unidos apresentar a sua obra no então FestRio, semanas depois. “Histórias reais” era uma alegoria travestida de documentário. Ou vice-versa. O personagem de Byrne visitava a fictícia cidade de Virgil, Texas, como se tivesse acabado de chegar de Marte. Lá, ele se inteirava de estranhos tipos humanos e de bizarras formas de organização social. Seu olhar era cândido, irônico, brilhante.

Bem, reencontrei o homem da Renascença no melhor livro que li em 2009, “Bicycle diaries”, blague de um velho latinófilo com “Diários de bicicleta”, de Che Guevara, levado ao cinema por Walter Salles. A capa dura vermelha da editora Viking protege o pedalar e o pensamento de Byrne por Berlim, Istambul, Buenos Aires, Manila, Sydney, Londres e um punhado de cidades americanas, em especial São Francisco e Nova York, onde este escocês sossegou depois de passar a infância em Hamilton, Canadá, e a adolescência
em Baltimore.

Aos 57 anos, Byrne pedala habitualmente por toda Nova York. Ele conta que já teve de se desviar de Paris Hilton, que atravessava a rua com o sinal vermelho para pedestres, o seu cãozinho na coleira e a expressão “eu sou Paris Hilton, você não me reconhece?” na cara. Em viagem, ele carrega uma bicicleta dobrável, o que lhe permite sentir o clima com mais liberdade do que se estivesse de carro e mais abrangência do que se andasse a pé.

O escritor inglês Will Self gosta de fazer quase o mesmo caminhando, às vezes até do aeroporto ao centro de uma cidade. Em “Psychogeography”, de 2007, ele diz que aderiu a longas caminhadas “como um meio de dissolver a matrix mecanizada que comprime o espaço-tempo e desconecta o humano da geografia física”. No capítulo dedicado ao Rio, Self ganha o apelido de Hitler na vizinhança suspeita de seu hotel por carregar o pocket de “Ascensão e queda do Terceiro Reich”, de William L. Shirer, com uma suástica na capa.

O estilo de Byrne é diferente do de Self. Não apenas no meio de transporte. Se o inglês é gongórico-misantrópico, como sempre, o nova-iorquino é cristalino-humanista. Pode-se ler “Bicycle diaries” como uma sequência de posts num blog. Claro, um blog bem escrito e não-ególatra, cujos tags seriam ciclismo, urbanismo, artes plásticas, arquitetura, música, história, sociologia, psicologia, antropologia. O homem da Renascença, lembre-se.

Byrne articula esses posts não apenas por cidades _ algumas visitadas mais de uma vez no decorrer dos anos_ mas também por assunto. Cada capítulo constitui um pequeno ensaio, com um tema central. O de Istambul, por exemplo, trata das tensões entre Ocidente, representado por um festival de rock proibido, e Oriente na cultura turca. O de Sydney trata das hostilidades da natureza australiana com o ser humano, como se uma dissesse ao outro “você não é bem-vindo aqui”, e do colonizador europeu com os nativos aborígenes.

Ele descreve como o sapo-cururu, introduzido na Austrália para combater insetos nas lavouras, tornou-se ele mesmo uma praga, e uma praga cuja pele secreta um veneno que, em pequenas doses, causa delírios e, em grande doses, pode matar. Alguns cães ficaram viciados em lamber sapos-cururus. “Pessoas também morreram por causa deles”, escreve Byrne. “Porque, como nos cães, uma lambida num sapo-cururu pode estimular alucinações que duram cerca de uma hora, e alguns caras não são tão espertos quanto cães.”

São essas pequenas iluminações, centenas delas, às vezes zen-budistas, que tornam “Bicycle diaries” tão bom. Byrne é um três-em-um: viajante não-etnocêntrico, observador inteligente e escritor habilidoso. Pegue-se o post do aviso na porta giratória da catedral de St. Paul, em Londres: “Esta não é outra senão a casa de Deus. Este é o portão do Paraíso.” Byrne se espanta com tamanha solenidade numa mera porta giratória e conjectura: “Acho que diz isso de trás pra frente quando você está dentro.”

Na pesquisa para o estranho projeto de um filme que relacione Imelda Marcos e cultura discotèque, Byrne vai parar em Manila. Pedalando pela orla da cidade, ele se espanta com a quantidade de karaokês e toma conhecimento de que alguns filipinos reclamam para o país a invenção dessa modalidade de diversão. Aí vem a sacada: “Há até um canal de karaokê na TV. Infinitos vídeos baratos e cafonas com música tocando e letras rolando. Você pode ficar em casa e cantar junto com a sua televisão. É como algum tipo radical de obra de arte conceitual _ mas, diferentemente de arte conceitual, é superpopular.”

“Bicycle diaries” termina com uma série de desenhos sugeridos por Byrne para novos bicicletários em Nova York. O homem da Renascença, lembre-se.

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“Diários de bicicleta” acabou de sair no Brasil, pelo selo Amarilys, da editora Manole, com prefácio de Tom Zé. A versão brasileira, amarela, está tão bonita quanto a americana, mas sobre a tradução que apenas folheei qualquer comentário seria precipitado.

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Portenhos e suas Bicicletas

Buenos Aires tem características que facilitam enormemente o uso intenso da bicicleta por seus cidadãos, sem importar idade, classe social ou qualquer condição prévia. Naturalmente sem que nada, ou quase nada tenha sido feito em termos de infraestrutura, os ciclistas ganham as ruas em um número cada dia maior. E claro o indicador de que muitas mulheres já pedalam ajudam a mostrar que não se trata de uma minoria de corajosos e desbravadoras homens jovens e destemidos.

Infelizmente as novas Bicisendas, recentemente implementadas, conseguiram desagradar a motoristas e ciclistas. Um indício claro de que as cidades brasileiras não estão sozinhas na necessidade de construir um novo vocabulário urbano que traga a bicicleta para o papel de protagonista nas cidades.

Desagradar motoristas penalizados por não terem mais onde estacionar motoristas é fácil. Mas quando os ciclistas optam por não utilizar uma nova infraestrutura, é sinal de que o planejamento deve ser refeito. Ao invés de buscar traçar rotas isoladas (as ciclovias) longe de grandes avenidas, seria mais racional incentivar o trânsito compartilhado e deixar as pistas segregadas para as grandes avenidas. Vias que levam o termo “grande” a um novo horizonte.

Confira abaixo uma matéria do jornal La Nacion sobre as novas bicisendas: