Transporte Ativo no FMB6 CDMX.

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Durante o mês abril tivemos a oportunidade de estar na Cidade do México (CDMX) para além de participar do Sexto Fórum Mundial da Bicicleta, quinto para nós, participar de diversas atividades incluindo visitas técnicas e oficinas e ampliando nossa rede de contatos na América Latina.

Durante a programação do Fórum apresentamos a pesquisa Perfil do Ciclista 2015 sob o título “Producción de conocimiento para la promoción de la movilidad por bicicleta en Brasil: Investigación Nacional y formación de la Red de investigadores”, onde abordamos o processo de planejamento, execução e resultados da pesquisa além da rede de colaboração formada a partir de sua execução, também apresentamos a Convocatória 2017 que comtemplará além de cidades brasileiras, cidades de toda a América Latina.

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Ainda na programação do Fórum apresentamos o “Perfil do Usuário de Bicicletas Públicas no Brasil” e participamos do Painel sobre a Bicicleta nos Meios de Comunicação, com uma apresentação sob o título “Terminología y Semántica en la promoción del uso de la bicicleta”, abordamos a importância da escolha dos termos na horar de abordar e promover o uso da bicicleta como meio de transporte nas cidades.

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Pudemos ainda visitar o centro de operações da EcoBici, sistema de bicicletas públicas da cidade, a Direção de Cultura, Desenho e Infraestrutura Ciclista e a Câmara dos Deputados (federais) onde tivemos a oportunidade de compartilhar experiências com o Presidente da Comissão Especial de Mobilidade.

Um pouco de antropologia das estradas

Bicicleta na estrada - Foto: Projeto Transite

Bicicleta na estrada – Foto: Projeto Transite

O trânsito é excelente fonte de boas pesquisas para entender um povo. Há no comportamento de condutores, passageiros e pedestres um retrato fiel da natureza dos comportamentos sociais de uma cidade e um país. Infelizmente esse fenômeno, talvez por demais fluído, seja pouco estudado.

É possível conhecer uma etnografia das estradas através dos impactos de sua construção, reforma ou ampliação, mas está por ser feito um estudo sobre os comportamentos dos usuários desses espaços e a maneira com que se apropriam dos caminhos. Um observador atento pode, no entanto, reparar em algumas pistas sobre como se dão as interações e como se mede a hierarquia de forças.

Fosse um fenômeno pouco comum, a “tomada da faixa da esquerda” em rodovias talvez passasse desapercebida, mas trata-se de um comportamento consistente com uma certa ética de comportamento do condutor brasileiro. O “desejo de potência” é tão forte que se manifesta pela defesa aguerrida do direito de não ser ultrapassado, ou de querer ultrapassar a todos. Tal comportamento tem menos a ver com o tamanho do motor da máquina e mais com um certo desejo de quem a guia.

Máquina e gente fundem-se, a identidade humana fica transferida para as quatro rodas movida à motor. Chega a ser quase inadmissível abrir mão da pista de ultrapassagem, sinal de fraqueza ou de admissão da própria impotência. Na corrida das vaidades dos que pagaram à vista ou parcelado o direito de uso da rodovia através de um automóvel sobrevive apenas o sonho de exercer o pleno potencial do produto adquirido.

Com a inevitável frustração que a realidade propicia à todos, condutores tornam-se ainda mais agressivos e buscam a velocidade a qualquer preço mirando um certo nirvana inalcançável promovida na publicidade. Nos congestionamentos nas rodovias esse escape pode ser extravasado no acostamento ou em ultrapassagens pela direita. Seja qual for a conduta escolhida, o risco acelera na mesma medida e ajuda a evaporar o bom senso e atropelar as quase sempre desconhecidas normas de trânsito.

Os usuários mais frágeis nas rodovias

A lógica rodoviarista de expansão dos povoamentos ao redor das estradas traz também para além dos comportamentos de condutores, elementos externos às rodovias. Mais invisíveis do que dentro das cidades, pedestres e ciclistas praticamente tornam-se apenas borrões na paisagem. O tratamento dado a quem deveria ser protegido vai da tolerância ao uso dos acostamentos, até placas de proibição sem que sejam dadas condições de circulação. Passam ainda pelos alertas de pontos de travessia, feitos por conta e risco dos pedestres. Além é claro das sempre longínquas passarelas.

Justamente no tratamento concedido por quem construiu e por quem opera as rodovias fica clara mais uma vez a conduta social aceitável quanto aos elementos mais vulneráveis. Comportamento que se replica de diversas maneiras, sempre tendo nos elementos mais frágeis um certo “estorvo social”. Sejam os ciclistas e pedestres das comunidades cortadas por rodovias, cicloturistas, peregrinos ou atletas em treinamento. São tratados como problema ou pior, vítimas a serem responsabilizadas em caso de irresponsabilidade ou imprudência dos condutores de motorizados.

Desafio civilizatório das estradas

Com cidades repletas de vias expressas, condutas de trânsito urbano são transplantadas para viagens de longa duração, o egoísmo de ser o primeiro até o próximo semáforo se multiplica por centenas de quilômetros e a ética, ou falta dela, que contaminou as condutas nos espaços de circulação urbana se agiganta nas rodovias.

Nas cidades é possível e desejável falar em humanização dos espaços de circulação, com ruas e avenidas capazes de se adequarem ao compartilhamento entre diferentes meios de locomoção. Já nas estradas o desafio vai além da inserção e adequação aos mais vulneráveis, passa por rever condutas ainda mais amplas da sociedade que construiu e ampliou estradas e rodovias para que fosse possível desfrutar da velocidade movida à combustão e pavimentada com muito asfalto.

Humanizar cidades tem portanto um papel respeitável no combate a agressividade e mortalidade das estradas. Mas o desafio vai além, passa principalmente pela separação entre pessoa e veículo. É preciso deixar claro que os sonhos e potências promovidas pela publicidade automobilística são metas impossíveis de felicidade individualista, que se traduzem em riscos e irresponsabilidade cotidianas.

Por fim, a promoção da civilidade como valor e o respeito às minorias como preceito democrático fundamental são aprendizados futuros possíveis através de um estudo do que representam as condutas dentro e ao redor das rodovias e estradas brasileiras.

Outras leituras:

Uma rede latinoamericana em prol da bicicleta

Ciclovia na calçada em Bogotá

Ciclovia na calçada em Bogotá

Em julho a Transporte Ativo foi convidada a participar do “Seminario Desarollo Sostenible e Integral de la Movilidad – Miradas a Europa e América Latina” em Bogotá, para falar sobre promoção da mobilidade por bicicleta no Rio de Janeiro, juntamente com outras cidades e países da América Latina.

Este encontro foi resultado de um projeto enviado em 2012 para o BID que tem como objetivo fortalecer o uso da bicicleta na América Latina. Recentemente o BID aceitou a proposta e aconteceu então o primeiro encontro para tratar do tema em Bogotá. A ideia central é que se forme uma rede entre as cidades de Bogotá, Ciudad do México, Rio de Janeiro e Rosário.

Seminário em Bogotá

Seminário em Bogotá

Nosso papel durante a estada em Bogotá foi de mostrar a realidade e a evolução carioca na promoção ao uso da bicicleta. A curiosidade e inspiração sobre o que tem acontecido no Rio de Janeiro deixaram a certeza de que a cidade tem um potencial enorme para difundir boas e más experiências.

Apresentação sobre as bicicletas no Rio de Janeiro

Apresentação sobre as bicicletas no Rio de Janeiro

Muitos foram os questionamentos com relação a participação da sociedade no planejamento dos espaços para ciclistas cariocas. Chilenos e Bogotanos, vivem um momento de dúvidas com relação as melhores soluções de infraestrutura voltadas a bicicleta a serem adotadas para suas realidades. As vias segregadas nas calçadas já estão obsoletas em Bogotá, e os cruzamentos e padrões de planejamento a serem adotados são pauta atual no Ministério da Vivenda e Urbanismo chileno. O que mais uma vez nos mostra que o Rio está realmente a frente em diversos aspectos e pode contribuir em muito para a promoção da mobilidade por bicicleta na América Latina.

Além dos aspectos mais gerais, as bicicletas públicas também mereceram destaque. Principalmente por seu poder de alcance e mudança nas cidades e na percepção das pessoas sobre a bicicleta como meio de transporte.

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Outro destaque positivo foi a experiência da cidade de Rosário, na Argentina. Por lá, muito tem sido feito para promover a mobilidade por bicicleta. Soluções simples, que cabem no orçamento do município. Iniciativas que partem de uma iniciativa governamental, contam com a participação da sociedade civil e são reforçadas como prioridade coletiva via votações do orçamento participativo local.

Trabalhar através de um olhar o na escala latino-americana é maravilhoso. É possível ver muitas semelhanças e acima de tudo, sentir as pessoas fervilhando e curiosas com o que está por vir.

Para ler mais:

– Eldiario.es – Lo imposible sucede cada día en todas partes

Hacer de un lunes un sábado

– “Cobrar por usar bicicletas es ir en contra del mundo”: Pedro Bravo

El uso de la bicicleta puede transformar ciudades

Ocho fórmulas para mejorar la movilidad en Bogotá

Velo-city 2014 – Adelaide, alguns destaques

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Com raízes européias, a chegada do Velo-city na Austrália demonstra mais uma vez a expansão global dessa que é a maior conferência mundial de promoção ao uso da bicicleta. Expansão que começou em 2010 para levar para o resto do mudo os ideiais da Federação Européia de Ciclismo, organismo pioneiro no incentivo a cidades mais cicláveis.

Para 2014 o mote é celebrar o que há de maravilhoso em pedalar. Serão 3 temas chave que serão analisados com maior profundidade através de 4 lentes.

Temas do Velo-city Global Adelaide 2014

Montagem do palco, histórias que merecem comemoração e celebrações por vir.

A montagem do palco trata dos valores que as paisagens urbanas precisam refletir, e os elementos necessários no planejamento, desenho e administração do espaço público para que as bicicletas sejam onipresente e mais pessoas possam pedalar mais vezes para mais lugares.

A última frase é certamente inspiração direta do nosso lema de “por mais pessoas em mais bicicletas mais vezes.

Seguindo para as histórias que merecem celebração. Trata-se de motivar pessoas, governos, comunidades e empresas para apoiar o uso da bicicleta. Como atender as micro e macro demandas por cidades mais pedaláveis. E mais do que isso, como envolver todos os interessados e suas comunidades na construção dessas cidades.

Por fim as celebrações por vir. Aqui é que se fala das transformações culturais necessárias, como faze-las e como aproveitar os processos dinâmicos de transformação em favor da bicicleta. O desafio é descobrir como uma cultura ciclistica pode gerar cidades criativas capazes de promover e abraçar a experimentação, adaptação, a livre expressão e transformação econômica.

As quatro “lentes” para aprofundar os pontos chave são: os fatos; as lideranças; políticas públicas, estratégias, planejamento e parcerias; e criatividade e inovação.

Claro que dentre os destaque do evento, dois nós interessam e nos honram imensamente. A indicação como lideranças no “Cycling Lumaries Awards” na categoria de lideranças globais e mais ainda o destaque dado a logística em bicicleta na cidade do Rio de Janeiro.

A Transporte Ativo ficou entre os quatro finalistas da categoria Leadership International.

A visibilidade global da Transporte Ativo é um trabalho conjunto de mais de dez anos e certamente o reconhecimento se deve em grande parte a visibilidade que a cultura ciclistica do Rio de Janeiro tem ganho no mundo através dos levantamentos e parcerias.

Cidades amigas da bicicleta são construções coletivas e temos muitos palcos a serem montados, muitas histórias a serem celebradas e certamente muitas celebrações ainda estão por vir!

Pedalemos então!