Bicicleta com cano de descarga

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Poluição atmosférica e sonora em um passeio ciclístico. Foto: André G. Soares

Meu sobrinho teve uma bicicleta que imitava uma moto. Tinha acelerador e tanque de gasolina de plástico (falso, claro), mas não tinha cano de descarga e mesmo que tivesse seria falso também e não emitiria fumaça nenhuma.

Mas tem surgido e, infelizmente se firmado nas grandes cidades uma atividade que faz as bicicletas serem co-responsáveis pela emissão de gases poluentes: os grandes passeios promocionais. Uma seguradora, um supermercado, uma lanchonete e até loja de bicicleta tem organizado passeios em que a ‘infra-estrutura’ inclui carros, motos, caminhões, trio-elétricos e até ônibus numa clara incoerência entre a bicicleta, o veículo convidado e a ser promovido, e um dos seus maiores trunfos que é ser um meio de transporte limpo, de emissões zero.

Uma grande massa de ciclistas ajuda a chamar atenção das pessoas pra bicicleta, mas parece mais uma grande festa pelo aspecto lazer do que o incentivo ao uso das magrelas como transporte no cotidiano. Sim, porque se para usar a bicicleta na rua, como nesses passeios, é preciso fechar o trânsito, colocar um trio elétrico a diesel na frente e um cortejo de carros, motos e ambulâncias atrás e aos lados, é preferível ir a pé! Acho mais honesto.

Sejamos francos, mega eventos com uma enorme massa de bicicletas envoltas por veículos poluentes não ajudam a promover o uso da bicicleta como transporte nem tão pouco a melhorar a aceitação delas nas ruas. Eles se resumem a ações de marketing que se aproveitam da simpatia das bicicletas para promover esta ou aquela empresa como amiga da bicicleta.

Em setembro, por conta da celebração do Dia Mundial sem Carro, as atenções da mídia e da sociedade vão se virar para o veículo a propulsão humana que pode não resolver o problema dos engarrafamentos, mas ajuda a melhorar a mobilidade de muitas pessoas em curtas e médias distâncias. De quebra ocupa pouco espaço, é limpo, silencioso e melhora a saúde do pedalante. Nada a ver ter carros e caminhões num evento para estimular a reflexão em torno da poluição pelo uso exagerado dos meios de transporte motorizados, especialmente os individuais.

Quem pedala com caminhão de som e frota de veículos no apoio está compactuando justamente com o mau uso do veículo motorizado. Isso deveria ser repensado. Como bandeira promotora do transporte saudável e sustentável a bicicleta basta a si mesma. É com a cabeça no lugar e os pés nos pedais que o mundo vai girar na direção da sustentabilidade. Vamos juntos?

Passeios limpos, silenciosos e sustentáveis são possíveis. Veja como fazer nesse ÁLBUM DE FOTOS:

banda de musica movida a pedal

Nossas cidades nós mesmos

O escritório Gehl Architects, em conjunto com o Institute for Transportation and Development Policy – ITDP, acabam de lançar a publicação Our Cities Ourselves: 10 Principles for Transport in Urban Life (Nossas cidades nós mesmos: 10 Princípios para o Transporte na Vida Urbana). O livreto mostra como cidades modernas podem enfrentar os desafios das mudanças climáticas e crescimento da população. E como, neste contexto, o transporte tem um papel decisivo.

(Clique em “menu”e “view fullscreen” para facilitar a leitura)

Os 10 princípios são:

1. Ande a pé: Crie bons ambientes para os pedestres.
2. Propulsão humana: Crie bons ambientes para bicicletas e não motorizados.
3. Vá de ônibus: Forneça transporte público de qualidade com bom custo benefício.
4. Controle de acesso: Permita o acesso de taxis e transporte coletivos limpos em velocidades seguras e em número significativamente reduzido.
5. Entrega de mercadorias: Sirva a cidade da maneira mais limpa e segura.
6. Misture tudo: Integre pessoas e atividades, edifícios e espaços.
7. Preencha os espaços: Construa bairros ao mesmo tempo adensados e atraentes, desenhados de forma a maximizar o transporte coletivo, e voltados para as pessoas.
8. Caia na real: Preserve e valorize o patrimônio natural, cultural e histórico local.
9. Conecte os quarteirões: Proporcione caminhadas diretas, interessantes e produtivas, com edifícios e quarteirões permeáveis e de pequeno tamanho.
10. Faça para durar: Construa para o longo prazo. Cidades sustentáveis atravessam gerações. São memoráveis, maleáveis, feita com materiais de qualidade e bem conservadas.

Original em inglês em: Cycling Embassy of Denmark

O livreto faz parte de um programa mais extenso do ITDP. Até 11 de setembro, em Nova Iorque, está acontecendo a exibição Our Cities Ourselves. Foram convidados 10 arquitetos para mostrarem sua visão de como serão 10 das mais fascinantes cidades do mundo, em 2030. Estas cidades já mostraram algum destaque no transporte sustentável e provaram ter liderança para abraçar as mudanças que estão por vir.
Uma destas cidades é o Rio de Janeiro. Confira na página ourcitiesourselves.org

Linhas de desejo e representatividade

Rios sempre foram obstáculos naturais. Em São Paulo são a grande barreira para os meios de transporte ativos. Os rios Pinheiros e Tietê formam uma linha real que separa o centro expandido da capital do resto da mancha urbana metropolitana.

Alças de acesso que permitem velocidades altas para os motorizados e a ausência de faixas de pedestres acabam por desencorajar viagens a pé e de bicicleta nas pontes. Em algumas delas caminhar e pedalar é até proibido.

Como forma de reforçar o desejo de pedalar em segurança sobre o rio Pinheiros, ciclistas pintaram uma ciclofaixa na ponte Cidade Universitária. O fluxo de pedestres é enorme por conta da USP de um lado e da estação de trem do outro lado do rio. Some-se a isso a grande oferta de empregos de um lado e moradias do outro.

O “cicloativismo apocalíptico” exemplificado na sinalização não-oficial carrega consigo o desejo ancestral de traçar o caminho mais curto e seguir por ele. Nas palavras do filósofo Gaston Bachelard, é a linha de desejo, ou trilha social. Foi desse modo humano de viajar que se fizeram caminhos na mata, que viraram trilhas, estradas. Por onde passaram boiadas, trilhos e estradas.

Caminhos em qualquer cidade, ou espaço humano habitado, serão sempre os mais curtos e fáceis. Durante as últimas décadas esse caminho era pensado para a utilização de veículos motorizados. A demanda e ineficiência em deslocar pessoas provaram a falência desse modelo. Para mitigar o colapso, resta investir em alternativas que encoragem o uso de meios de transporte inteligentes para as inúmeras demandas humanas por ir e vir.

Leia mais:
atos de amor e coragem (pedaline)
23 de maio (apocalipse motorizado)
Desire path (wikipedia)
Subconscious Democracy and Desire (Copenhagenize)

Relacionados:
Pontes Paulistanas
Fluxos de Água e de Vida
Breve Fábula sobre Caminhos
A Importância dos Apocalípticos
Integrar-se à Cidade
Vias Humanas

Mais espaço para a circulação

A Companhia de Engenharia de Tráfego em São Paulo restringiu o estacionamento de automóveis no bairro de Moema em São Paulo. De um lado de diversas vias não é mais permitido estacionar, e no lado oposto o estacionamento passa a ser pago, em sistema rotativo. Houveram protestos, mas os cálculos comprovam que a rotatividade é boa e que os impactos na circulação viária tende a melhorar.

Mas um ciclista mostrou o antes e depois para quem pedala. Menos conflitos e mais espaço para a bicicleta.

O que alguns veem como perda, para outros são ganhos. Ao final, a tendência é que mesmo os que se sentiram prejudicados, sintam que os benefícios foram maiores.

Veja a postagem original no blog do Ecologia Urbana.