Ruas para crianças em Amsterdã

O bairro De Pijp é hoje o exemplo de ambiente agradável para se morar, mas no começo dos anos 1970 a situação era bastante diferente.

Foi através do desejo de crianças em idade escolar que a organização do desenho viário se tranformou para revelar o retrato atual do espaço público de circulação em toda Amsterdã.

Ruas para os carros vs. espaços de lazer

O ano é 1972 e um documentário televisivo holandês conta a história do conflito pelo espaço urbano vivido pelas crianças. Elas moravam em apartamentos pequenos sem espaço para brincar, em casa ou nas ruas, e ameaçadas pela insegurança viária.

Dentro do momento histórico da Holanda, o desejo infantil por brincar e circular em segurança somou-se à revolta contra a morte de crianças no trânsito e também o impulso de diminuir a poluição ambiental. O clima favorável para mudanças foi construído por muitas mãos, mas certamente os desejos infantis por inclusão na cidade tiveram um enorme papel nas mudanças.

Redução de velocidade e de espaço viário
A história de como as ruas do bairro de De Pijp tornaram-se o que são hoje é um somatório de pressões e esforços no redesenho de políticas públicas que beneficiem as pessoas, em especial as crianças.Dentre as primeiras medidas a serem tomadas, está a redução da velocidade para no máximo 30 km/h em todas as ruas residenciais. A criação de novos espaços para circulação e permanência vem logo em seguida. Por fim, para consolidar iniciativas piloto, modifica-se a infraestrutura com fechamento permanente de ruas para a circulação motorizada, construção de pequenos parques e o que mais a comunidade julgar necessário.

Crianças, tal como árvores, crescem e frutificam. Atualmente as ruas arborizadas do De Pijp são presentes maduros do esforço coletivo em prol da cidade.

Saiba mais:

Amsterdam children fighting cars in 1972

– As crianças que trouxeram vida às ruas de Amsterdam

Quem são os ciclistas brasileiros

Foto: Carlos Aranha

Foto: Carlos Aranha

A Transporte Ativo, em parceria com outras 9 organizações em defesa da bicicleta, está realizando um levantamento do perfil dos ciclistas brasileiros. O objetivo é entender o que motivou as pessoas a começarem a pedalar e o que as faz seguir em frente. Com base na pesquisa, será possível  direcionar com maior eficiência os esforços de promoção ao uso da bicicleta

A iniciativa faz parte da “Parceria Nacional pela Mobilidade por Bicicleta” que busca mapear o Brasil que pedala. Serão levantadas idade, renda, motivação para usar a bicicleta, o tempo médio do principal trajeto feito em bicicleta, para onde é esse trajeto, se ela é combinada com outros meios de transporte. Além disso, as organizações parceiras poderão escolher até 4 perguntas específicas para suas cidades.

A quantidade de entrevistados varia de acordo com o tamanho da população, em São Paulo serão 1.784 questionários aplicados por 9 pesquisadores. E em todas as cidades o levantamento será feito nas áreas centrais, intermediárias e periféricas  em pontos que já possuem infraestrutura cicloviária, pontos que ainda não possuem e os chamados “pontos de intermodalidade”, nos quais a bicicleta se relaciona com outros modais de transporte.

Relatos de uma pesquisa de campo em bicicleta

Mais do que dados a serem planilhados, a pesquisa acaba mergulhando em histórias. São ciclistas já idosos que nem ao menos lembram quando pedalaram pela primeira vez ou histórias de neófitos desbravando a cidade com prazer e vento no rosto.

Para enxergar um pouco do que não será tabulado, Marina Harkot, pesquisadora pela Ciclocidade em São Paulo compartilhou duas histórias de pessoas que usam a bicicleta na mais populosa cidade brasileira.

esse é o Julião. ele mora na rua há tanto tempo que já nem lembra mais até que série estudou. faz de tudo um pouco e acha que a melhor coisa da bicicleta é conseguir carregar suas poucas posses de cima pra baixo, pela cidade inteira. pedala desde sempre, não consegue pensar em um período de tempo exato.
quando pedi pra tirar uma foto sua, demorou uns 5 minutos pra se arrumar – tirou o boné, soltou os cabelos e se escondeu atrás dos óculos escuros. pediu para ver a foto, achou que tinha ficado escura e disse que era pra eu “comprar um celular melhorzinho”. foi embora tão sorrateiramente quanto chegou – e nem me deu tempo para agradecer a conversa e dizer o quanto que gente como ele me faz sentir viva.

O triciclo de Lineu, por Marina Harkot

O triciclo de Lineu, por Marina Harkot

o dono desse triciclo é o Lineu. ele tem ataxia cerebelar – uma doença degenerativa – e começou a usar a bicicleta para recuperar massa muscular (disse que hoje em dia tem “até bunda de novo”).
Lineu deixa uma cadeira de rodas “estacionada” no bicicletário da estação Sé e usa o triciclo pra rodar por aí – visita a família na Freguesia do Ó pedalando desde a Barra Funda, em duas horas de caminho.
quando chega na Sé, troca o triciclo pela cadeira de rodas e segue de metrô para a Leste, onde mora. amanhã está de volta aqui pelo centro.

Cada pessoa em bicicleta merece sempre os maiores incentivos. Por vezes ouvir suas histórias já representa um carinhoso agradecimento. Fica o convite para que as pesquisadoras e pesquisadores Brasil afora compartilhem conosco seus relatos e seus personagem.

Por mais pessoas felizes em bicicleta.

Saiba mais:

A “Parceria Nacional pela Mobilidade por Bicicleta” é uma iniciativa da Transporte Ativo, com patrocinio do Banco Itaú e parceria com as organizações Ciclocidade (São Paulo), Mobicidade (Porto Alegre), BH em Ciclo (Belo Horizonte), Rodas da Paz (Brasília), Ameciclo (Recife), Bike Anjo Salvador, Ciclourbano (Aracaju), Pedala Manaus, Mobilidade NiteróiPROURBObservatório das Metrópoles , ITDP Brasil.

Um contador automático de ciclistas

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O levantamento de dados, principalmente o de fluxos de ciclistas é iniciativa preciosa para definir políticas públicas e promover o uso da bicicleta. Em uma parceria com o Banco Itaú, a Transporte Ativo tem seu próprio contador automático e que já está nas ruas.

Copacabana, berço das infraestruturas cariocas para bicicletas

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Pioneira com a Ciclovia da Orla e também com as redes internas de bairros com suas Zonas 30. Primeiras contagens fotográficas, manuais e automáticas da cidade, recebeu os primeiros bike box do Rio e tem a maior frota de bicicletas em serviço do Rio de Janeiro.

Com tantos motivos, a Transporte Ativo iniciou na quinta feira, dia 6 de agosto de 2015, uma série histórica de contagens de ciclistas no bairro, com o objetivo mensurar as mudanças a cada ano a partir de agora. Os dados levantados serão entregues às Secretarias de Transporte, Meio Ambiente, Urbanismo e CET-Rio, permitindo assim uma melhor avaliação da área, para que melhorias e ajustes na infraestrutura cicloviária possam ser efetuadas a cada oportunidade.

Contagem automática Vs. Contagem Manual

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Pelo contador automático passaram 852 ciclistas em 12 horas, uma queda em relação aos totais anteriores. Em 2009 (ainda sem ciclofaixa) foram
1420 ciclistas na esquina das ruas Figueiredo de Magalhães e Nossa Senhora de Copacabana. Destes 1061 na Figueiredo, em dois diferentes quarteirões e o resto seguiu pela Nossa Senhora.

Já em 2013 (com um ano de ciclofaixa) foram 1535 ciclistas no cruzamento sendo 1222 em dois quarteirões da Figueiredo e os demais cruzando pela Nossa Senhora.
Os dois quarteirões citados são: entre Domingos Ferreira e NS Copa e entre NS Copa e Barata Ribeiro (que julgo ser mais movimentado que o anterior)

O total 852 ciclistas contados automaticamente foi coletado em apenas um quarteirão, entre as ruas Domingos Ferreira e Nossa Senhora, além disso, foram computados apenas quem utilizou a ciclofaixa, quem seguiu pela calçada e pelo outro lado da rua, não foi computado ao contrário das contagens manuais.

A diferença portanto é que de maneira automática passamos a contar uma parte do fluxo cicloviário que faz uso de uma infraestrutura. Uma nova técnica requer um novo histórico e assim será, com o contador circulando pela cidade.

O equipamento foi totalmente aprovado, foram 25 minutos pra montagem e 15 pra desmontar. Todo o equipamento cabe em uma maleta e pesa apenas 17kg, mas requer uma bicicleta de carga para ser transportado, dadas suas dimensões.

Saiba mais:

Relatório completo da contagem automática de ciclistas na rua Figueiredo de Magalhães em Copacabana

O que aconteceria se ciclistas respeitassem todas as leis de trânsito

 

“Precisamos entender urgentemente que as leis de trânsito foram redigidas de maneira cuidadosa e criteriosa em busca da segurança de todos. As mesmas regras que se aplicam aos motoristas, aplicam-se aos ciclistas. Certamente nada pode dar errado.”

 

O comentário irônico acima foi escrito pelo perfil satírico de “Bob Gunderson”, mas infelizmente existem pessoas que efetivamente acreditam na letra fria das leis de trânsito como regras canônicas pensadas para resguardar a segurança geral. Doce ilusão.

Todo o arcabouço jurídico que busca organizar a circulação viária foi pensado da mesma maneira que as ruas foram construídas ao longo do século XX, garantir a maior fluidez motorizada possível. Tendo a velocidade como valor sagrado dessa tal de “modernidade”.

Exacerbar o rídiculo de tentar aplicar para as bicicletas leis de trânsito criadas para a circulação de motores foi a excelente iniciativa de um grupo de ciclistas em São Francisco na Califórnia. Por lá, condutores devem parar completamente nos cruzamentos sinalizados com a placa PARE. Em uma infeliz decisão, a autoridade de trânsito local resolveu punir infratores dessa regra que estiverem em bicicleta.

Gastar tempo e recursos humanos preciosos para punir ciclistas é a pior decisão possível. Ainda mais ao se saber que na busca de zerar ocorrências de trânsito com mortos e feridos com sequelas, a famosa visão zero, a cidade californiana tem buscado punir com rigor as 5 infrações que mais impacto negativo tiveram na letalidade viária.

Ciclistas conscientes da própria vulnerabilidade no trânsito sabem adaptar sua conduta para promover a própria segurança. Adaptações legais são portanto uma iniciativa eficiente para realmente garantir que as regras promovam o bem estar geral, sem privilegiar os deslocamentos de carruagens de aço em detrimento das pessoas.

O absurdo carrocentrico fica explícito no vídeo abaixo:

Já a lógica ciclista fica manifesta no “Idaho STOP”, legislação estadual em Idaho que permite aos ciclistas tratarem placas e semáforos dentro da lógica mais simples.

As regras de trânsito precisam de mais atenção às experiências dos usuários e menos engenharia de trânsito. Do contrário pedestres deverão ter habilitação para atravessar a rua, ou pior, semáforos que privilegiam automóveis virão com manual de instrução para quem se movimenta por modos suaves.

Saiba mais:

This Is What Happened When Bicyclists Obeyed Traffic Laws Along The Wiggle Yesterday

New SFPD Park Station Captain’s Bike Crackdown Won’t Make Streets Safer

Full Bike Compliance With the Stop Sign Law: An Effective Spectacle

Quais sementes você planta?

Sem gente que a habite, toda urbe é apenas uma coleção de tijolos empilhados cercada de concreto e asfalto. A cidade pertence a cada um que nela viva e que por ela circule. Ainda que seja possível esquecer desse fato e atribuir ao mandatário da vez ou a outros que tenham poder a propriedade das aldeias densas que chamamos de casa.

Enxergar a cidade como solo vivo para as pessoas é certamente o caminho necessário para se apoderar do espaço ao redor. Ver a massa construída como território cru ainda por ser marcado é um dever que nos cabe.

Arte e agricultura urbana

A artista e muralista Mona Caron deu de presente a São Paulo sua semente, um broto que cresce forte às margens do minhocão. Com latas de tinta uma parede cega tornou-se terra fértil. O papel da arte sempre foi apontar caminhos e inspirar mais pessoas a percorrer jornadas em buscas das imagens que traduzam utopias.

A riqueza da pintura está em resumir visualmente pequenas perfurações já em curso na teia de concreto. O movimento global em prol da agricultura urbana tem sido essa força que traz o verde para dentro dos tons de cinza de nossas aldeias construídas. E cada planta que alimenta é um pequeno movimento em direção a reorganização urbana ao redor de prioridades urgentes, a água, a vida, toda a natureza que foi esquecida e subjugada ao longo dos anos em nome da limpeza hermética da modernidade.

As bandeiras certas para mudar as mentes e as cidades

Vários embates de forças estão em curso. O mais popular nos últimos dias foi entre os que acreditam que todo direito só é pleno quando é para todos e os que crentes em sua boa fé defendem suas visões de mundo com força quase fundamentalista. Na batalha jurídica norte-americana em defesa do casamento igualitário, venceu o entendimento de que era preciso dar garantias sólidas aos casais formados por pessoas do mesmo sexo. A Suprema Corte norte-americana definiu que as uniões civis tem de ser reconhecidas em todo o país e não apenas em alguns estados que aprovaram o casamento entre iguais. Um grande passo rumo a “união mais perfeita”, nas palavras do presidente Barack Obama.

Houve um tempo em que mulheres não tinham direito ao voto e o tom de pele definia pessoas como cidadãs de segunda classe. Os ativistas dos direitos LGBT são hoje o que já foram as sufragete e equivalem-se aos líderes do movimento negro que buscavam igualdade. Visões progressistas quando ganham força e massa crítica tornam-se consensos e seus detratores ficam esquecidos na longa caminhada histórica rumo a uma organização social da humanidade que seja melhor do que a anterior.

Os desafios atuais podem parecer grandes demais, mas o que foi construído por mãos e mentes humanas pode ser rescrito de acordo com o sabor e as pressões do nosso tempo. Sólido é tudo aquilo que é capaz de se desmanchar no ar. O século XX foi o ápice de muitas das forças destrutivas que ainda nos afligem, as cidades são o terreno de um embate que é acima de tudo de visões de mundo, de mentalidades. Pessoas em bicicleta e tantas outras lançam sementes para um futuro mais igualitário, humano e feliz.

Por mais pessoas em mais bicicletas, mais vezes. Pedalemos.

Saiba mais:

Muro cinza 1 X 0 Arte (e a arte de Mona Caron para a bicicletada Paulistana)
The President Speaks on the Supreme Court’s Decision on Marriage Equality
Last Week Tonight with John Oliver: Transgender Rights (HBO)